Donald Trump foi eleito. Ele recebeu 75,5 milhões de votos. Não parece. A maior parte das análises e dos comentários despreza os motivos e fica apenas com a consequência. Para compreender o que acontece hoje nos Estados Unidos e no mundo, é preciso analisar a jornada, não apenas o ponto de chegada, simbolizada em um nome.
Trump representa muitas coisas. O cansaço com o politicamente correto, a falência do discurso da globalização e da liberalização dos costumes, o medo do terrorismo e a revolta contra a perda do poder de consumo gerada pela inflação, entre outros aspectos. Mas quase todos, senão todos, têm algo em comum: nasceram de um “não”, de uma contrariedade. Representam o antagonismo e o rechaço, não a esperança e o futuro.
Aqui no Brasil tem sido igual. Lula é um não-Bolsonaro. Bolsonaro é um não-Lula.
De fato, o mundo não precisa de presidentes populistas que se aproveitam do vácuo de confiança para abocanhar o poder. O mundo precisa de novas histórias para acreditar. No passado não muito distante, as tínhamos: a democracia prometia salvar a humanidade e o planeta. Não salvou. A globalização acabaria com as desigualdades. De fato, as acentuou. A liberalização dos costumes traria paz e harmonia social. Nunca tivemos tantas tensões, geradas não pelo mérito destas causas, mas pelo “como” elas vêm sendo tratadas: com sectarismo e dedos em riste.
Ainda sobre Trump e seus eleitores, duas certezas: do ponto de vista ambiental, temos muitos motivos para nos preocuparmos. Por outro lado, nunca a paz no Oriente Médio, que importa para todos, esteve tão próxima. Trump fala uma língua que os bandidos entendem.
Certa feita, o discípulo perguntou ao seu mestre budista: “O que é Deus?”. E o mestre respondeu: “Se você já comeu, vá lavar seus pratos”.
Viver a vida é dar um passo de cada vez. Assim, quem sabe, chegaremos ao divino.
Trump não me empolga e nem me deprime. O que virá depois dele, sim. É isto que estamos construindo a partir de agora. Lavar os pratos, sem quebrá-los.