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A estreia de Oppenheimer (2023) nos cinemas convida a revisitar a carreira de Christopher Nolan, que completa 53 anos no próximo dia 30. Com 12 filmes já lançados desde 1998, o diretor inglês soma US$ 5,17 bilhões arrecadados nas bilheterias e cinco indicações ao Oscar — como coautor do roteiro original de Amnésia (2000), escrito com seu irmão, Jonathan Nolan, como roteirista e coprodutor, ao lado de sua esposa, Emma Thomas, de A Origem (2010), e novamente como um dos produtores e também como diretor de Dunkirk (2017). E é tão cultuado quanto criticado.
Uns vibram com sua capacidade de conjugar ação e reflexão, a exploração, em diferentes gêneros (policial, ficção científica, suspense, aventura de super-herói, guerra), de suas obsessões temáticas — como a construção e a manipulação do tempo, a natureza maleável da memória e da identidade, a rivalidade, a ambiguidade moral e o conflito entre percepção e realidade — e seu estilo narrativo, marcado por histórias não lineares que frequentemente espelham o próprio ofício cinematográfico. Ele também é prestigiado por, na era das câmeras digitais, continuar filmando em película, em nome de uma qualidade de imagem melhor e de um formato de tela maior, e por preferir efeitos práticos em vez de recorrer à computação gráfica.
Outros criticam seu pendor em ser explicativo em excesso, com diálogos muito expositivos, e o parco desenvolvimento emocional de personagens (especialmente as femininas): em geral, parecem apenas ferramentas do roteiro, sem uma vida interior. Há quem também o veja como um diretor arrogante: em 2020, ele bateu pé com a Warner, querendo que o estúdio mantivesse a data prevista para o lançamento mundial de Tenet, 17 de julho — dia em que os Estados Unidos acabariam registrando um recorde de 65,1 mil casos novos de covid-19.
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Como as aspas no título da coluna indicam, Nolan é um dos meus cineastas preferidos: sempre há prazer em assistir a seus filmes, mesmo quando não passam tão perto do alvo. E acho que muitos fãs compartilham dessa opinião. Portanto, um ranking de suas obras vai inevitavelmente deixar na parte de baixo algumas consideradas excelentes. Convenhamos que é o tipo de problema que a maioria do diretores gostaria de ter.
Os 12 filmes de Nolan, do "pior" ao melhor
12) Insônia (2002)
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É o único filme em que Christopher Nolan não trabalhou no roteiro _ trata-se de uma adaptação, pela estadunidense Hillary Seitz, do homônimo policial norueguês de 1997 escrito por Erik Skjoldbjærg (também diretor) e Nikolaj Frobenius. Não à toa, carece de algumas marcas do cineasta, como a narrativa fragmentada e as analogias ao próprio trabalho. Mas novamente temos personagens lidando com as questões da construção da memória e da percepção da realidade.
O cenário foi transposto da Escandinávia para o igualmente branco e gelado Ártico. Will Dormer (Al Pacino, em ótima atuação) e Hap Eckhart (Martin Donovan), dois policiais de Los Angeles acusados de desvio de conduta, viajam até Nightmute, no Alasca, onde o assassinato brutal de uma adolescente desnorteia Ellie Burr (Hilary Swank), a inexperiente delegada local. Na terra onde brilha o sol da meia-noite, agrava-se a dificuldade de Dormer em dormir. Seu cansaço, físico e psicológico, é acentuado pelas ações do principal suspeito, um escritor encarnado por Robin Williams, em mais um papel no qual buscava se desvencilhar da comicidade sempre associada a ele. Apesar dos desempenhos do elenco, Insônia (Insomnia) fica em último lugar no ranking por ser o mais convencional e o mais previsível filme de Nolan. (Indisponível no streaming)
11) Tenet (2020)
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O filme começa com os músicos de uma orquestra se preparando para um concerto diante de uma plateia lotada na Ópera Nacional da Ucrânia, em Kiev. Logo explode a ação — aqui, temperada pela tensa trilha sonora composta pelo sueco Ludwig Göransson, que quase sempre fará tudo em Tenet parecer mais interessante do que realmente é. Terroristas invadem o palco e atiram em alguns instrumentistas, mas o ataque é apenas uma distração para um sequestro. Nesse meio tempo, surge o personagem de John David Washington, agente de um batalhão que, aparentemente, tem como objetivo central somente resgatar o alvo dos sequestradores. Dá-se um enrosco não muito compreensível e, por fim, o protagonista anônimo acaba capturado e torturado, mas sobrevive para servir a uma causa maior: "Estamos tentando evitar a Terceira Guerra Mundial", diz a ele uma cientista interpretada pela francesa Clémence Poésy. A ameaça é uma tecnologia que tem alterado a entropia dos objetos, fazendo com que a munição das armas, por exemplo, seja reversa. Não é que a bala vá para trás, não é que o tiro saia pela culatra. É mais como um disparo feito no futuro que agora está chegando ao presente (ou o passado). Ou, para conseguir visualizar: a bala se descrava de um vidro e volta para a pistola (quase como um déjà vu de Amnésia — leia mais abaixo). Essa cientista mostra ao protagonista um enorme arquivo com peças mecânicas que voltaram de algum lugar no tempo. São os restos de uma guerra futura. É ela quem também aconselha Washington e o público sobre o que vem pela frente: "Não tente compreender. Sinta".
Sempre acusado por seus detratores de ser expositivo demais, desta vez Nolan parece admitir que Tenet é muito confuso com suas citações sobre física quântica e radiação, cidades secretas russas que não aparecem nos mapas e os portos livres dos aeroportos, contra-ataques bitemporais e algoritmos apocalípticos. Um calcanhar de Aquiles de Nolan torna-se um elefante no meio da sala: o parco desenvolvimento de personagens. Os diálogos pontuados por conceitos científicos, algumas tiradas espirituosas ou a milésima explanação sobre o paradoxo do avô das viagens no tempo impedem momentos de introspecção ou de exibição do lado emocional do protagonista e de Neil. Fundamentais na conquista do Oscar de efeitos visuais, as sequências de ação conseguem fascinar, tanto os combates corpo a corpo quanto os duelos automobilísticos, mas chega um momento em que até elas passam a ser confusas: como reconhecer os personagens se todos estão de capacete? Quem eles estão combatendo, quem os está atacando? No fim, o que eram mesmo os artefatos que estavam buscando? Para que serviriam exatamente? (Amazon Prime Video, HBO Max e para alugar em Apple TV, Google Play e YouTube)
10) Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge (2012)
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Oito anos se passaram desde os acontecimentos de O Cavaleiro das Trevas (2008). Batman (Christian Bale), após assumir a culpa pela morte de Harvey Dent — mantendo incólume a imagem do promotor público que, transformado em Duas-Caras, havia cometido atrocidades em Gotham City —, está aposentado, e seu alter ego, Bruce Wayne, virou um bilionário recluso. Não dá bola a Miranda Tate (Marion Cotillard), investidora em um projeto de energia limpa, e não percebe que falta dinheiro para ajudar um orfanato, como se queixa o policial John Blake (Joseph Gordon-Levitt). Seu sacrifício, porém, concedeu à cidade tempos de paz, erguidos sob a Lei Dent, que aprisiona bandidos sem julgamento nem direito a condicional. Mas Bruce ouve dos lábios rubros de Selina Kyle (Anne Hathaway), a Mulher-Gato: "Uma tempestade está chegando". Essa tempestade vem em forma humana (ou quase). É Bane (Tom Hardy, apavorante com seus rosto encoberto por uma máscara e sua voz distorcida), terrorista surge aos olhos do espectador na acachapante cena de abertura, a bordo de um avião da CIA.
Não escondo que chorei — e três vezes — quando assisti ao encerramento da trilogia do Batman, que rendeu a maior bilheteria na carreira de Nolan (US$ 1,1 bilhão). Mas o tempo de lá para cá realçou os vários problemas de Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge (The Dark Knight Rises), que vão desde erros bobos de continuidade até as muitas decisões do roteiro que desafiam a mínima lógica (como todos os policiais de Gotham caírem em uma armadilha), passando pelas mortes indignas, rápidas demais ou simplesmente ridículas, de dois dos personagens principais. (HBO Max e para alugar em Amazon Prime Video, Apple TV e Google Play)
9) Seguinte (Following, 1998)
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O primeiro longa-metragem de Nolan foi feito enquanto ele tinha outro emprego e com apenas 6 mil libras — ele próprio operou a câmera, usando estoques de filmes 16mm em preto e branco e aproveitando a iluminação disponível nos cenários. O caráter amador transparece, mas também saltam aos olhos elementos que pautariam a trajetória do diretor, a começar pela frase de abertura do protagonista anônimo (como o de Tenet): "O que se segue é a minha explicação".
Em uma narrativa não linear, que intercala quatro tempos distintos, acompanhamos em Seguinte (Following) a trajetória de um aspirante a escritor (Jeremy Theobald, que depois faria pontas em Batman Begins e Tenet). Tal qual um cineasta que segue seus personagens, ele faz o mesmo com pessoas aleatórias nas ruas de Londres, à procura de inspiração. Acaba deparando com o ladrão Cobb (a profissão e o nome de Leonardo DiCaprio em A Origem), tipo vivido por Alex Haw que invade casas de estranhos, rouba pequenos objetos íntimos e muda coisas de lugar, para que as vítimas percebam o crime e passem a sentir falta do que perderam (é quase como um truque de mágica, que está no centro da trama de O Grande Truque). Como de hábito na filmografia do diretor, haverá uma reviravolta que muda nosso entendimento da história. O inesperado é um lance premonitório: o apartamento do protagonista tem na porta o logotipo do Batman, sete anos antes de Nolan dar início a sua trilogia do Homem-Morcego. (Indisponível no streaming)
8) Interestelar (2014)
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"A poeira é um elemento recorrente em Interestelar", escreveu em ZH o jornalista Marcelo Perrone quando entrou em cartaz nos cinemas esta ficção científica que faturou US$ 773,4 milhões nas bilheterias e o Oscar de efeitos visuais (além de ter competido nas categorias de design de produção, com Nathan Crowley e Gary Fettis, mixagem de som, edição de som e música original, por Hans Zimmer). "Ilustra no filme a desintegração progressiva e inexorável da humanidade em um futuro próximo. Quem sobreviver à fome não escapará do sufocamento, posto que Terra entrou em colapso pelo esgotamento de suas reservas naturais e de oxigênio. Christopher Nolan também parece fazer uso da poeira para embaralhar aos olhos do espectador a percepção de que sua ambiciosa realização é mais complexa e profunda do que, descascada a pretensão do diretor, mostra ser."
Interestelar investe na vertente de 2001: Uma Odisseia no Espaço (2001), de Stanley Kubrick, e Solaris (1972), de Andrei Tarkovski: a viagem rumo ao universo desconhecido e seu efeito psicológico e existencial sobre o explorador. Em atuação magnetizante e nuançada, Matthew McConaughey interpreta Cooper, engenheiro espacial e ex-piloto da Nasa que agora toca a vida como fazendeiro em um lugarejo açoitado por tempestades de areia. Ele voltará à ativa atendendo à convocação do cientista (Michael Caine) encarregado de um programa secreto da agência espacial dos EUA, que corre contra o relógio para encontrar um planeta habitável. A missão, além do grande risco e do longo tempo, exige de Cooper deixar os dois filhos, Tom (Timothée Chalamet quando jovem, Casey Affleck na fase adulta) e a pequena Murph (Mackenzie Foy e depois Jessica Chastain). Se por um lado há momentos de alto impacto dramático e de alta imaginação visual, por outro há diálogos muito açucarados e uma virada na trama cuja maior consequência é aumentar a duração do filme. (Amazon Prime Video, HBO Max e para alugar em Apple TV, Google Play e YouTube)
7) Batman Begins (2005)
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Os efeitos do 11 de Setembro, em 2001, ainda se faziam sentir na produção de Hollywood quando Nolan começou a gestar o filme que abriu a bilionária trilogia protagonizada por Christian Bale (curiosamente, a arrecadação desse primeiro título, US$ 373,6 milhões, não prenunciava o sucesso estrondoso de bilheteria). Havia uma tendência à sobriedade, em consonância com um "imaginário cinza de fim de mundo" — como definiu o crítico Marcelo Hessel, do site Omelete — após os atentados ao World Trade Center, em Nova York, e ao Pentágono, em Washington. Isso ajuda a explicar o êxito da franquia Jason Bourne, que teve início em 2002 e mostrou um 007 desglamorizado, vivendo aventuras marcadas pelo realismo cru, e do seriado 24 Horas, que foi lançado em 2001 e bebeu da cultura do medo implementada pelo governo de George W. Bush. Os EUA precisavam de um herói, e um herói que fosse plausível e que lidasse com ameaças reais.
Escrito por Nolan com o roteirista David S. Goyer, Batman Begins oferece um herói de carne e osso e tem como tema principal o poder e o propósito do medo — não à toa, um dos vilões é o Espantalho (Cillian Murphy), que desenvolveu um gás capaz de fazer as vítimas alucinarem sobre seus piores temores. O cineasta extirpou as cores, as piadas (mas não necessariamente o senso de humor), Robin e os elementos bizarros ou cartunescos dos filmes anteriores do personagem, assinados por Joel Schumacher. Seu objetivo era ser o mais realista possível, permitindo-se a violência, a dor, a amargura. O primeiro passo era se preocupar em responder a uma série de perguntas: por que a roupa de morcego? Por que a obsessão pela justiça? Como ele treinou? Como consegue seu equipamento? Por que ele não mata? Como seria um Batmóvel na vida real? Quem é Bruce Wayne? Com um jogo de luz sépia e sombras do diretor de fotografia Wally Pfister, indicado ao Oscar, Batman Begins retrata a transformação de um menino amedrontado em Homem-Morcego. (HBO Max e para aluguel em Amazon Prime Video, Apple TV, Google Play e YouTube)
6) Oppenheimer (2023)
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Ambição é o que não falta a Nolan e ao protagonista deste épico com três horas de duração (a maior na carreira do diretor), orçamento de US$ 100 milhões e mais de 70 atores no elenco que reconstitui a turbulenta trajetória do físico estadunidense considerado o pai da bomba atômica: J. Robert Oppenheimer (1906-1967), brilhantemente interpretado pelo irlandês Cillian Murphy, em sua sexta colaboração com o cineasta, depois da trilogia do Batman (2005-2012), de A Origem (2010) e de Dunkirk (2017).
Apesar de ser uma cinebiografia ambientada no passado (com três tempos narrativos, como de costume na filmografia do diretor), Oppenheimer tem a ambição de falar da humanidade como um todo e de dilemas muito contemporâneos. Por um lado, seu protagonista nos lembra como somos complexos e contraditórios: Oppenheimer é egocêntrico, mas também é atormentado por dúvidas e inseguranças (será que a bomba vai trazer a paz — mesmo que pelo medo — que ele imagina?); é um cientista, mas também é um sujeito passional (o que vai render a primeira cena de sexo em um filme de Nolan); é um gênio, mas também é ingênuo ("Como esse homem que viu tanta coisa pôde ser tão cego?", afirma um personagem). Por outro lado, o cineasta disse esperar que seu filme sirva de alerta para as empresas de tecnologia: "Quando falo com os principais pesquisadores no campo da inteligência artificial (IA), eles dizem que estão em seu momento Oppenheimer. Eles estão olhando para a história para tentar responder: 'Quais são as responsabilidades dos cientistas que desenvolvem novas tecnologias que podem ter consequências não intencionais?'." (Em cartaz nos cinemas)
5) Dunkirk (2017)
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Assim escreveu Roger Lerina na época da estreia nos cinemas: "A escala grandiosa do episódio histórico que emoldura a trama não asfixia as tragédias individuais de seus personagens. Ao contrário: o espetacular e o íntimo combinam-se na tela com harmonia e eloquência raras, sensibilizando corações e mentes com a dignidade de um comovente réquiem de guerra".
Com US$ 525,2 milhões arrecadados, Dunkirk é uma das maiores bilheterias do gênero. No Oscar, conquistou os troféus de edição (Lee Smith), mixagem de som e edição de som e disputou outras cinco categorias: melhor filme, direção, fotografia (Hoyte Van Hoytema), design de produção (Nathan Crowley e Gary Fettis) e música original (Hans Zimmer). Está ambientado na Segunda Guerra Mundial, durante a Batalha de Dunquerque, entre maio e junho de 1940, quando cerca de 400 mil soldados aliados ficaram encurralados pelas tropas alemãs no nordeste da França entre a terra e o mar. Na iminência de serem massacrados, britânicos e franceses torcem por um resgate marítimo da Inglaterra — que, se vier e conseguir escapar do bloqueio inimigo, pode não ser suficiente para salvar todos.
Nolan intercala três núcleos dramáticos: por terra, o acaso reúne dois jovens combatentes (Fionn Whitehead e Aneurin Barnard, aos quais vai se juntar o cantor Harry Styles, em sua estreia como ator) na briga pela sobrevivência; por água, um veterano marinheiro (Mark Rylance) parte da costa inglesa com o filho e um ajudante, atendendo à conclamação para que barcos civis auxiliem na evacuação dos homens do outro lado do canal; por ar, um piloto inglês (Tom Hardy) lidera um grupo de caças que tenta evitar os ataques dos aviões alemães a embarcações e tropas. Engenhosamente, há três arcos temporais distintos — respectivamente, uma semana, um dia e uma hora —, que gradativamente vão convergindo para um clímax simultâneo. (HBO Max e para alugar em Amazon Prime Video e Apple TV)
4) Batman: O Cavaleiro das Trevas (2008)
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Sucesso de público (fez US$ 1 bilhão nas bilheterias) e ganhador dos Oscar de ator coadjuvante (postumamente concedido a Heath Ledger, ofuscante no papel do vilão Coringa) e edição de som, Batman: O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight) estabeleceu um novo paradigma para os filmes de super-herói. Entre combates corporais e perseguições automobilísticas, entre exibições de bat-utilidades e explosões de prédios, discutem-se temas perenes (o que é um herói e o que separa o Bem do Mal, por exemplo) e dilemas modernos (como os riscos de combater o crime com extremismo).
A trama escrita por Nolan, seu irmão, Jonathan Nolan, e David S. Goyer tem início com um assalto a banco por uma quadrilha mascarada, orquestrado pelo Coringa, que vai deixar fulos da vida os mafiosos de Gotham City. Esse roubo mirabolante é uma das homenagens do cineasta ao policial Fogo Contra Fogo (1995), de Michael Mann. Entre as outras, estão a escalação do ator Willian Fichtner, a fotografia fria e azulada assinada por Wally Pfister (indicada ao Oscar, assim como a edição de Lee Smith, a direção de arte de Nathan Crowley e Peter Lando, a maquiagem, a mixagem de som e os efeitos visuais), o peso da cidade e o caráter obsessivo dos personagens.
A principal é a cena do interrogatório, que referencia o encontro dos personagens de Al Pacino (o detetive Vincent Hanna) e Robert De Niro (o ladrão Neil McCauley) no restaurante, tanto no enquadramento e na edição do diálogo (plano e contraplano, plano e contraplano) quanto no teor da conversa — lá também policial e bandido se reconhecem como duas caras da mesma moeda ("Você me completa!", diz o Coringa para o Batman). Dito isso, não é por mera pirotecnia que, quando o Homem-Morcego suspende o Palhaço do Crime de ponta-cabeça, Nolan movimente a câmera de modo a igualar a posição dos dois interlocutores. Um não é mais o inverso do outro, mas seu espelho. (HBO Max e para aluguel em Amazon Prime Video, Apple TV, Google Play e YouTube)
3) Amnésia (2000)
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Na cena de abertura do filme indicado aos Oscar de roteiro original (assinado por Christopher Nolan e seu irmão, Jonathan Nolan) e de melhor edição (Dody Dorn), uma mão sacode uma foto Polaroid, mas, em vez de aparecer a imagem, ela vai desaparecendo. Em seguida, a foto é sugada para dentro da máquina; de um corpo estendido no chão, o sangue reflui; e a bala retrocede da cabeça do morto para o revólver empunhado pelo fotógrafo. O homem que vai matar é o ex-agente de seguros Leonard Shelby (Guy Pearce). O homem que vai morrer é Teddy (Joe Pantoliano), que se diz amigo de Leonard, mas guarda segredos.
Teddy pode ser o culpado pelo estupro e assassinato da esposa de Leonard, tempos atrás. Na noite da tragédia, Leonard foi golpeado na cabeça, virando vítima de uma rara desordem cerebral: é incapaz de formar recordações novas. Desconfiado de todos e traído pela própria memória, Leonard só sobrevive graças às fotos em Polaroid que tira das pessoas e dos lugares, às notas que escreve à mão nessas imagens e em papéis e às tatuagens que faz pelo corpo, o arquivo vivo da morte da mulher. E Leonard só vive para vingá-la. "Como posso lembrar de esquecer você?", ele se pergunta. "Como cicatrizar se eu não sinto o tempo?"
A mágica de Amnésia (Memento) é misturar o tema — a condição fabril e flexível da memória — à estrutura. Após cada cena, Nolan mostra o que ocorreu ligeiramente antes. As surpresas para o público vicejam não no futuro, mas no passado: a trama é contada do fim para o começo. A sensação é de que estamos recuperando as lembranças aos poucos. (Looke e para aluguel em Apple TV, Google Play e YouTube)
2) O Grande Truque (2006)
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Escrito pelos irmãos Christopher e Jonathan Nolan a partir de um romance de Christopher Priest, O Grande Truque (The Prestige) se passa em Londres, na virada para o século 20, tempo no qual os espetáculos de mágica ocupavam o espaço que em breve seria do cinema, com seu convite à ilusão. Dois jovens buscam o estrelato: Robert Angier (Hugh Jackman) e Alfred Borden (Christian Bale). Angier faz jus à cartola, com seus modos sofisticados, e é um mestre do entretenimento. Borden é genial e mais habilidoso, porém não vende seu coelho muito bem. Após um acidente de trabalho, os dois transformam-se em terríveis rivais, dispostos a descobrir segredos alheios ou mesmo sabotar apresentações — e ainda haverá a disputa por uma assistente de palco (Scarlett Johansson). Nolan espelha essa inimizade na contenda histórica entre os inventores Thomas Edison e Nikola Tesla (interpretado pelo cantor David Bowie).
Na abertura do filme que concorreu aos Oscar de fotografia (Wally Pfister) e direção de arte Nathan Crowley e Julie Ochipinti), o personagem de Michael Caine, um engenheiro de gaiolas para pombos e tanques de água, diz o seguinte: "Todo grande truque de mágica consiste em três partes ou atos. A primeira parte é chamada de A Promessa. O mágico mostra algo comum: um baralho, um pássaro ou um homem. Ele mostra a você este objeto. Talvez ele peça para você inspecioná-lo para ver se é realmente real, inalterado, normal. Mas é claro... provavelmente não é. O segundo ato é chamado de A Virada. O mágico pega algo comum e o faz fazer algo extraordinário. Agora você está procurando o segredo... mas não o encontrará, porque é claro que você não está realmente procurando. Você realmente não quer saber. Você quer ser enganado. Mas você não irá bater palmas ainda. Porque fazer algo desaparecer não é suficiente: você tem que trazê-lo de volta. É por isso que todo truque de mágica tem um terceiro ato, a parte mais difícil, a parte que chamamos de O Truque".
Esse monólogo é ilustrado por cenas que atiçam a curiosidade, como a de vários chapéus espalhados em uma floresta, e antecipam situações terríveis e revelações chocantes — mas a todo instante estaremos nos iludindo, nos confundindo e nos surpreendendo, porque, a exemplo do que diz o personagem de Caine, talvez não estivéssemos prestando atenção, talvez não quiséssemos realmente saber. Eis uma bela metáfora para o cinema em si, onde somos cúmplices dos enganadores. (HBO Max e para alugar em Google Play e YouTube)
1) A Origem (2010)
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Vencedor de quatro Oscar (melhor fotografia, por Wally Pfister, efeitos visuais, edição de som e mixagem de som) e indicado a outras quatro estatuetas (incluindo melhor filme e roteiro original, do próprio Nolan), A Origem (Inception) conquistou, simultaneamente, bolsos e cabeças — um fato raro. Arrecadou US$ 828,3 milhões abordando temas que são um prato cheio para psicanalistas: a interpretação dos sonhos. Os arquivos secretos nos escaninhos da mente. As projeções que fazemos de quem nos cerca e de nós mesmos. Os pontos de fuga em um mundo interior. A engenharia da identidade. A tênue fronteira entre memória e imaginação. Os mecanismos de defesa do inconsciente. A culpa que atormenta a consciência. A realidade como uma construção mental.
Na trama, Leonardo DiCaprio é Dom Cobb, um ladrão de sonhos, um Extrator. É capaz de penetrar na mente das pessoas enquanto elas estão dormindo para roubar segredos industriais. Mas ele acaba recrutado para o oposto: uma inserção (a inception do título original), ou seja, plantar uma ideia na cabeça do herdeiro de uma megacorporação, Robert Fischer (Cillian Murphy). Esse universo onírico não é nada pacífico: há tiroteios, perseguições e explosões. Projeções tomam a forma de capangas armados, e um trem desgovernado simboliza o perigo do inconsciente.
Feito com muitos dos colaboradores mais frequentes de Christopher Nolan, incluindo o diretor de fotografia Wally Pfister (sete filmes com ele), o editor Lee Smith (sete), o compositor Hans Zimmer (seis) e os atores Michael Caine (oito) e Cillian Murphy (seis), A Origem sintetiza obsessões temáticas e estilísticas, como o quanto de nossas lembranças são fabricações, o lado sombrio de cada um, o poder da ilusão e da teatralidade, a manipulação do tempo narrativo e o espelhamento do fazer cinema. Seu enredo é basicamente o mesmo que envolve a produção de um filme: precisa-se de uma equipe para construir um sonho e alcançar corações e mentes. O personagem Dom Cobb é o diretor — e DiCaprio tem um tipo físico semelhante ao de Nolan e aparece com os cabelos dourados armados no mesmo topete do cineasta britânico. Arthur, o seu braço-direito, desempenha funções que, no mundo do cinema, equivalem às do diretor de fotografia e do montador, o sujeito que dá ritmo aos filmes — é ele quem cuida do enquadramento e da sincronia dos sonhos. Ariadne, a nova arquiteta, é quem projeta os cenários e decora o estúdio do inconsciente. Yusuf, o químico, pode ser visto como o cara dos efeitos especiais: depende de sua mágica para que os espectadores possam sonhar. Saito é o produtor, o homem que entra com a grana e, por isso, se sente no direito de também entrar em cena. E Eames é exatamente o ator, que encarna um papel para "traduzir a razão (o roteiro, digamos assim) em conceitos emocionais", para cativar a audiência e inserir em sua cabeça/seu coração uma ideia/um sentimento. (Disponível para alugar em Amazon Prime Video, Apple TV, Google Play e YouTube)