Há uma crise de confiança na relação entre o presidente Lula e os governadores que têm a pretensão de disputar a sucessão presidencial em 2026. Por trás das desconfianças está a disputa de espaço político e as ambições eleitorais de cada um, a começar por Lula, que é candidato à reeleição. O Propag, que deveria ter sido um momento de distensão, pelo atendimento de uma das mais antigas demandas dos governadores, virou motivo de discórdia.
O veto de Lula a um dos incisos da lei ganhou mais destaque do que a sanção de um programa ousado, que reduz significativamente o estoque da dívida dos Estados, a começar pelo Rio Grande do Sul. Porque há ruído na comunicação e, em vez de trocar um telefonema para esclarecer, os governadores já partem para o ataque nas redes sociais. A relação piorou no momento em que deveria melhorar. Lula diz que os governadores são ingratos, que deveriam lhe agradecer em vez de ficar criticando, porque criou (com aprovação do Congresso) o melhor programa de renegociação de dívidas da história.
Comparado ao regime de recuperação fiscal (RRF), o Propag é mesmo um programa de pai para filho — até por isso está sendo criticado por quem teme que comprometa o ajuste fiscal. Uma interpretação equivocada levou o governador Eduardo Leite a afirmar que o Rio Grande do Sul teria de desembolsar R$ 5 bilhões para aderir ao programa. O secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, garante que essa interpretação é equivocada e que enquanto vigorar a suspensão do pagamento da dívida, por causa da enchente, não haverá esse desembolso.
Nesta quarta-feira (22), em ato no Palácio do Planalto para assinatura do contrato de concessão da BR-381, que fica em Minas Gerais, Lula voltou a provocar o governador Romeu Zema, do Novo:
— Para falar a palavra obrigado tem que ter grandeza, as pessoas têm que ter grandeza, têm que ter caráter, humildade. Para agradecer uma coisa que é feita, esse acordo das dívidas de Minas Gerais, dos Estados como um todo, o governador de Minas Gerais deveria vir aqui e me trazer um prêmio, me trazer um troféu do primeiro presidente da República que ele tem conhecimento que nunca vetou absolutamente nada de nenhum governador, de nenhum prefeito por ser contra ou por ser oposição.
E prosseguiu:
— O que nós fizemos para os Estados que não pagavam dívida talvez só Jesus Cristo fizesse se ele concorresse à Presidência da República desse país.
Lula disse que a primeira coisa que fez quando ganhou as eleições foi chamar os 27 governadores no Palácio do Planalto e pedir que listassem as obras importantes para seus Estados:
O que nós fizemos para os Estados que não pagavam dívida talvez só Jesus Cristo fizesse se ele concorresse à Presidência da República
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
— Foi por isso que nós produzimos o PAC, o investimento de R$ 1,7 trilhão em obras que os governadores colocaram no PAC. Não foi uma obra inventada pelo Lula, não foi uma obra inventada pelo chefe da Casa Civil (Rui Costa) ou pelo Renan (Filho, ministro dos Transportes), não, é uma obra que eles disseram "as principais obras que nós pensamos são essas, essas e essas", e nós então colocamos no PAC. Pelo menos isso deveria agradecer, pelo menos isso. Mas ele fez uma crítica profundamente desnecessária.
O recado era para Zema, mas poderia ter sido para Eduardo Leite ou Tarcísio Gomes de Freitas, já que os três são pré-candidatos à Presidência.
Leite disse que quer um documento por escrito para ter certeza de que ali adiante o Estado não será cobrado por coisas que hoje o governo garante que estão fora de cogitação. A justificativa é de que em outros momentos o governo não cumpriu o prometido e isso abalou a confiança.