
O jornalista Vitor Netto colabora com o colunista Rodrigo Lopes, titular deste espaço.
Uma das vozes mais atuantes da Igreja Católica brasileira nas redes sociais e em iniciativas filantrópicas, o pároco da Paróquia São Miguel Arcanjo, no bairro da Mooca, em São Paulo, Júlio Lancellotti, concedeu entrevista exclusiva à coluna para falar sobre o papa Francisco e as expectativas para o próximo pontificado.
Que legado Francisco deixa?
O legado ainda vai durar muito tempo, porque é uma verdadeira floresta. Ninguém consegue derrubar uma floresta de repente. E é uma floresta de misericórdia, de compaixão, solidariedade e empatia. São muitos os valores. Os depoimentos que estamos ouvindo, até dos moradores de rua que estão nas imediações do Vaticano, são de que ele era um pai. E que ele os visitava: as pessoas transgênero, as pessoas detentas. O papa Francisco traz uma novidade tão grande, que, para entendê-la, vai levar tempo. Assim como levou tempo para entendermos a mensagem de Jesus.
O que exatamente?
Porque nós estamos muito envenenados pelo individualismo, pela meritocracia. Para nós, é difícil entender a gratuidade, o amor sem esperar retorno. Um amor que seja compassivo e que não tenha meritocracia. "Não amo porque você merece, mas porque você precisa".
Quais as diferenças entre o papa Francisco e anteriores, como Bento XVI e João Paulo II?
Eles continuaram fiéis à tradição milenar da igreja. O papa Francisco não rompe. Ele inova. Aquilo que diz São Maximiliano Kolbe: "O amor é criativo". Então, Francisco não só manteve a tradição, como voltou à mais genuína tradição da Igreja, que é o amor fraterno, proposto pelo próprio Senhor Jesus. Ele se aproximou tanto de Jesus, que, olhando para ele, se via a prática do Nazareno.
O que esperar do próximo papa?
Vamos esperar que o próximo papa surja do discernimento dos eminentes senhores cardeais, que vão discernir, à luz do Espírito Santo, que Francisco não era um papa da Igreja Católica, era um papa para o mundo, que dialogava com o mundo. Não podemos retroceder. Precisamos continuar a caminhar nessa senda. Não na senda de Francisco, mas na de Jesus, que é a que o Francisco caminhou.
O senhor acredita que o próximo papa seguirá sendo progressista como o papado de Francisco?
A questão não é ser progressista ou não. É ser fiel a Jesus, ao Evangelho. Foi isso que o papa Francisco foi. Uma Igreja não autorreferencial, não voltada para si, não voltada para o luxo, para a autoridade, para a imposição, mas falando com todos, se abrindo para todos. Essa frase tão importante do Papa: "Tutti, tutti, tutti". Quer dizer: "todos, todos, todos". Ninguém fora. Uma Igreja sem portas e aberta, em missão no mundo. Uma casa de campanha durante a guerra, onde todos os feridos serão acolhidos, e ninguém, rejeitado.