O embate entre Elon Musk e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes lança luzes sobre a passagem do americano Michael Shellenberger por Porto Alegre, na semana passada. O jornalista e ativista veio à Capital para participar de um painel sobre sustentabilidade durante do Fórum da Liberdade, na sexta-feira (5) pela manhã. Mas foi uma fala, durante um evento paralelo, o Talks, que acabou ganhando repercussão. Ele apresentou um estudo que embasou as acusações de Musk segundo as quais e-mails de funcionários do X (antigo Twitter) comprovariam a versão de que não haveria liberdade de expressão no Brasil e de que estaria em curso a implantação de uma ditadura orquestrada pelo Supremo, com a conivência do presidente Lula.
Shellenberger usa o conjunto de documentos internos da rede social, intitulado "Twitter Files Brazil", para reforçar a tese. O trabalho foi feito em parceria com David Ágape, que afirma ser jornalista investigativo, e Eli Vieira, que se apresenta como jornalista e biólogo.
A divulgação dos dados por Shellenberger são anteriores às declarações de Musk. O jornalista publicou os e-mails da plataforma, que compreende período entre 2020 e 2022 (anterior à venda para Musk), em 3 de abril, mesmo dia em que chegou a Porto Alegre. Segundo a denúncia, Moraes teria pedido que o X interviesse em publicações de integrantes do Congresso e solicitado acesso a detalhes pessoais de usuários — o que violaria as diretrizes da plataforma.
— O Brasil está envolvido em um caso de ampla repressão da liberdade de expressão pelo ministro do STF Alexandre de Moraes — afirmou Shellenberger na ocasião.
Musk, dono do X, começou a tuitar em sua rede, repercutindo as informações de Shellenberger e endossando sua versão, no domingo (7).
Na sexta-feira, o americano participou do Talks, painel dentro do Fórum em que tratou sobre liberdade de imprensa e que teve a participação do deputado federal Marcel Van Hattem (Novo-RS), que diz ter sido chamado na última hora para participar do diálogo. Mais cedo, Shellenberger participou de um painel sobre sustentabilidade, no palco principal do Fórum, contudo ele não comentou os dados do "Twitter Files".
Shellenberger e Van Hattem se conheceram pessoalmente em dezembro, em Londres, quando o gaúcho esteve no Alliance for Responsible Citizenship (ARC). Na ocasião, estava sendo negociada a vinda do americano ao Fórum. O deputado nega ter participado da articulação sobre sua vinda.
— Ele é famoso pela questão climática. Foi convidado pelo Fórum, e, nesse meio tempo, fez esse trabalho, que eu nem conhecia. Não sabia que estavam fazendo os Twitter Files Brazil — afirmou Van Hattem À coluna.
As despesas da viagem de Shellenberger foram pagas pela organização do evento, o Instituto de Estudos Empresariais (IEE). Shellenberg fala português e morou no Brasil há cerca de 30 anos.
No sábado à noite Shellenberger e Van Hattem voltaram a se encontrar a partir da repercussão do post de Musk. O gaúcho colocou o jornalista em contato com o deputado federal Filipe Barros (Partido Liberal-PR). Os dois conversaram por telefone, e o americano foi convidado a ficar mais alguns dias no Brasil.
— A passagem que o Fórum tinha comprado para ele, para voltar no domingo (7), ele acabou deixando para trás e decidiu ficar no Brasil. E aí a gente começou a organizar imprensa, participação em podcast — conta Van Hattem, que brinca estar atuando como assessor de imprensa informal do americano.
No domingo (7), como o voo para Brasília seria à tarde, Shellenberger e Van Hattem foram até o Cais Embarcadero. O americano teria gostado muito do local, da paisagem, da combinação de café com a proximidade do Guaíba. Depois, eles deixaram as malas no escritório do deputado, na Avenida Carlos Gomes, e de lá, caminharam até o Parque Moinhos de Vento.
— Foi legal, porque várias pessoas nos reconheceram, pediram foto e tal. Desde que chegou ao Brasil, ele recebeu mais de 90 mil novos seguidores no X — conta.
No caminho até o Parcão, os dois encontraram o deputado federal Luciano Zucco (PL-RS). Os três conversaram. No final da tarde, Shellenberger e Van Hattem embarcaram para a capital federal. Os dois gravaram um vídeo publicado nas redes do parlamentar em que Van Hattem agradece o apoio "por tudo o que tem feito pelo país no combate à censura". O americano repete que a "liberdade de expressão está sob ataque" e que a situação no Brasil seria pior do que em outros países.
Van Hattem diz que não conhece Elon Musk. Schellenberg costuma dizer que tem uma "relação profissional" com o dono do X. O deputado pretende, em parceria com outros parlamentares, protocolar na semana que vem um Projeto de Lei inspirado na primeira emenda dos EUA para a proteção da liberdade de expressão no Brasil. Shellenberger, que seguia em Brasília até esta terça-feira (9), deve auxiliar na redação.