A escalada da guerra comercial deflagrada pelo presidente norte-americano, Donald Trump, joga a economia global em um terreno pantanoso de incertezas. O republicano reafirmou nas últimas horas a aposta na estratégia perigosa de elevar tarifas de importação para recuperar a indústria local e diminuir o déficit no balanço entre exportações e compras no Exterior. Mas os danos das medidas não serão sentidos apenas nos países que estão na mira das barreiras da Casa Branca. Alcançarão também os EUA, na forma de impulso inflacionário e de um PIB mais fraco.
O Brasil, ao contrário, deve fortalecer seus laços comerciais com outras nações e blocos
Trump confirmou que entrou nesta terça-feira em vigor o tarifaço de 25% para as importações do Canadá e do México. Impôs ainda tarifa adicional de 10% sobre as compras da China, que já estavam desde o dia 4 de fevereiro sobretaxadas em 10%. Mas o presidente norte-americano parece ainda não estar satisfeito. No fim de semana, sem detalhar o que pretende, acenou com mais taxas sobre produtos agrícolas e carros comprados de qualquer mercado. Também já direcionou ameaças sobre a Europa.
Atingidos, os vizinhos e Pequim reagiram. O Canadá informou que também cobrará mais 25% das exportações norte-americanas. O México prepara o anúncio da retaliação para domingo. A China mirou os embarques agrícolas dos EUA. Carne de frango, trigo, milho e algodão passam a ter tarifas extras de 15%. Soja, frutas, laticínios e carnes suína e bovina terão taxa suplementar de 10%.
Na estratégia imaginada por Trump, os fornecedores norte-americanos passarão a suprir o que era comprado no Exterior, gerando mais emprego e renda no país. Mas não há como a manufatura doméstica responder na velocidade pretendida. Empresas instaladas nos EUA dependentes de peças, sistemas e insumos de outros países sentirão a quebra da cadeia de fornecimento, e o resultado será alta nos preços para o próprio consumidor local. É uma desorganização que tem grande potencial de enfraquecer o PIB.
O protecionismo, por ser uma artificialidade, resulta, a médio e longo prazo, em uma acomodação dos setores favorecidos. Estes passam a ter menos incentivos para inovar e buscar produtividade. Além de ser um tiro no pé da competitividade, colide com o histórico dos EUA de defesa do livre-comércio.
O país pode se beneficiar pontualmente do revide chinês. Se Pequim frear as compras agrícolas dos EUA, terá de adquirir mais do Brasil. Mas é ganho localizado. Caso a China venda menos manufaturados para os Estados Unidos, buscará outros destinos, como o mercado brasileiro, pressionando a indústria nacional. Uma economia norte-americana claudicante também acaba por afetar toda a atividade global. A inflação mais forte por lá significa ainda menor espaço para o banco central norte-americano voltar a cortar o juro. Isso acrescenta empecilhos a um afrouxamento monetário no Brasil. No cotejo entre oportunidades e ameaças, os riscos são maiores. Mas ainda resta esperar para se certificar de que a guerra comercial é mesmo para valer ou é blefe de quem quer negociar e cantar vitória para seu público interno. O país, ao contrário, deve fortalecer seus laços comerciais com outras nações e blocos, a começar pela insistência no acordo entre o Mercosul e a União Europeia.