É reprovável a atitude do Congresso de travar a votação do pacote fiscal enviado pelo governo e de atrasar a reforma tributária como forma de retaliar o Planalto devido ao estabelecimento de regras mais duras pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para a liberação de emendas. Este deveria ser o momento de o parlamento colocar os temas relevantes para o país acima dos interesses imediatos de deputados e senadores.
Dar andamento à reformulação do sistema de impostos não é uma conveniência do governo, mas uma pauta prioritária para a economia brasileira, da qual o próprio Congresso foi protagonista. Na segunda-feira, mesmo diante de um calendário exíguo, não houve quórum para o senador Eduardo Braga (MDB-AM) ler na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa o seu parecer sobre o principal projeto de lei de regulamentação da reforma. A sessão esvaziada foi uma represália devido ao impasse em torno do pagamento das emendas. A leitura ocorreu ontem e a votação na CCJ deve ser hoje.
Existe ainda o risco de as medidas do contenção de gastos não serem votadas até o início do recesso, dia 22 de dezembro, e ficarem para 2025. Assim como o próprio orçamento para o próximo ano. O conjunto de proposições enviado pelo governo ao Congresso pode ser insuficiente para o ajuste fiscal necessário. Mas a crise de confiança, a deterioração das expectativas e a piora dos indicadores do mercado financeiro se agravarão ainda mais se o pacote não for a plenário neste ano.
Esperava-se do Legislativo uma postura responsável, de aperfeiçoar os textos enviados. Mas o que se nota é que parcela significativa de deputados e senadores pensa em primeiríssimo lugar na continuidade da liberação desmedida e opaca de dinheiro público para distribuir a sua base em obras e projetos paroquiais.
A situação se complica ainda mais diante da desarticulação do governo no Congresso. Não é nada republicano que a saída imaginada pelo Planalto para acalmar os congressistas, ávidos por mais recursos, seja a publicação de uma portaria que buscaria interpretar a decisão do STF para obter a liberação de R$ 3 bilhões em emendas Pix ainda neste ano. Ao que parece, há uma dose de desespero na tentativa de contornar a decisão da Corte e dissipar o clima ruim no parlamento.
Para relembrar, no início do mês, o ministro Flávio Dino liberou o pagamento das emendas, como as de comissão e Pix, desde que atendidas regras constitucionais de transparência e rastreabilidade. O plenário da Corte confirmou a decisão do ministro, que determinou critérios como a indicação do parlamentar “padrinho” da emenda e a identificação do órgão destinatário dos recursos. Em relação às emendas Pix, a orientação foi de que a liberação do dinheiros só possa ser feita com a apresentação de um plano de trabalho prévio que mostre a conveniência dos repasses, entre outras condicionantes necessárias para dar a devida translucidez à operação realizada com dinheiro do contribuinte.
Não há razão moralmente justificável para o Congresso resistir em aceitar princípios básicos que deveriam nortear o trato com os recursos públicos. Ainda há tempo para parar com a chantagem e colocar as necessidades do país à frente dos próprios interesses.