
Outro dia, num intervalo do Sala de Redação, Diogo Olivier me fez uma carinhosa reprimenda ao dizer que eu andava falando muito sobre minha idade e brincando demais quanto a estar velho. Meu bom amigo talvez estivesse preocupado que eu vivesse uma fase de autocomiseração pela passagem do tempo, mas tratei logo de tranquilizá-lo.
Toda vez que reforço meus 60 anos, é de caso pensado, uma espécie de afirmação daquilo que, ao fim e ao cabo, constitui meu patrimônio imaterial. Não me refiro à nada palpável tal apartamento ou carro, mas sim ao conhecimento e à suposta sabedoria que fui somando nos meus atualizados 39 anos de carreira.
teressa que tão longa carreira conte muito mais acertos do que erros de avaliação. Fala alto é o erro justamente por ser mais raro.
No ano passado, por exemplo, errei ao avaliar Fernando como um volante que dava bico para cima. Dei azar no jogo inteiro dele que vi na Europa, quando a necessidade fez com que espanasse a bola para longe de sua área.
Eu deveria tê-lo elogiado por ele ter entendido que o contexto pedia o balão e não o refinamento. Dei por regra o que era exceção, errei.
O fato de estar há tanto tempo na estrada me dá a humildade de reconhecer o erro, coisa que já fiz ao microfone, sem que isso soe como derrota para o comentarista. Noutro nível muito mais decisivo e remunerado em três ou mais dígitos, se vê mundo afora erro de avaliação de treinadores reconhecidos no mundo todo.
O que dizer do melhor deles, Guardiola, a deixar escapar sob seus olhos o talentoso Palmer, formado na base do City e sem chance alguma com o treinador espanhol? Hoje, o meia é referência no Chelsea e na seleção inglesa.
O que dizer de Cláudio Coutinho a levar Chicão e não Falcão para a Copa de 1978? Ou de Telê Santana a não chamar Leão para goleiro da seleção encantada de 1982? Pouco antes da Copa de 70, o espetacular João Saldanha questionava Pelé e dizia que o Atleta do Século estava ficando cego, imagine.
Voltando ao mundo dos mortais, outro querido amigo meu, Leonardo Oliveira, disse numa tarde qualquer de Sala de Redação que Renê era Nílton Santos perto de Bernabei. Hoje, ele mesmo ri do equívoco e elogia o lateral argentino com a naturalidade dos talentosos.
Referência colorada
Todo início deste texto me leva agora ao centro da coluna: Fernando. O volante, que fará 38 anos em julho, tem sido a maior referência defensiva do Inter. Ao mesmo tempo, a certeza de um primeiro passe de qualidade na construção.
Não menos importante, uma liderança positiva a orientar os mais jovens no espaço sagrado do vestiário. O suadíssimo empate na Fonte Nova teve o volante-zagueiro como melhor jogador em campo.
Era seu primeiro jogo de Libertadores na vitoriosa carreira solidificada na Europa. O time de Roger Machado teve duas estreias fora de casa muito duras em menos de uma semana. No Brasileirão, o Flamengo. Na Libertadores, o Bahia.
Em ambos os jogos, com pouco tempo de distância entre um e outro, Fernando foi impecável. Joga no atalho, solução encontrada só por quem conhece a si mesmo para entender que as pernas não aceitam mais longas corridas campo afora.
Não sei se o volante joga domingo (6) contra o Cruzeiro no Beira-Rio. Ficando fora, será pura fisiologia do corpo. Sua contribuição, porém, acontece também fora dos gramados.
O Inter que resistiu e superou a dificuldade dos últimos dois jogos tem que voltar a ficar parecido com sua melhor versão, aquela que ataca tanto quanto defende. Ou mais.
Na próxima quinta-feira (10), joga no Beira-Rio contra o Atlético Nacional, que encantou na estreia em Medellín contra o Nacional uruguaio. Nesta partida, tenho certeza, Fernando estará.
A confiança que Roger Machado tem no jogador é nível estratosfera. O time todo, na verdade, confia na presença tranquilizadora do cara que, definitivamente, não dá bico para cima. Só se for preciso.
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