
O mercado financeiro estava contente com a vitória de Donald Trump. Havia um viés de incerteza, mas até uma palavra foi criada – "Trumptrade" – para definir os supostos benefícios do novo governo para Wall Street, a rua que simboliza o universo das bolsas de valores e das empresas que a orbitam.
Corta para abril de 2025: Wall Street perdeu US$ 6,6 trilhões – sim, "tri", aquela grandeza que só aparece em PIBs de países ou em valor de mercado de big techs – em apenas dois dias, quinta e sexta-feiras. Para manter a comparação, é como se o mercado tivesse perdido um Reino Unido e uma França (sobra um troquinho de US$ 300 bilhões).
E deve perder mais nesta segunda-feira (7) que tem humor condicionado pela maior queda da bolsa de Hong Kong em 28 anos. Mesmo os primeiros adeptos começam a reagir. Jamie Dimon, presidente do JP Morgan, maior banco dos EUA, afirma que o "as recentes tarifas vão provavelmente elevar a inflação e estão fazendo com que muitos considerem uma grande probabilidade de recessão" em sua carta anual aos clientes (confira aqui) enviada nesta segunda-feira (7). Também achou "bom lembrar" da "estagflação dos anos 1970".
Estagflação, é bom lembrar, é a situação em que a economia murcha e a inflação dispara. Dimon é uma espécie de "decano" de Wall Street, um dos executivos que saiu vencedor na devastação causada pela crise de 2008, quando centenas de bancos americanos quebraram. O JP vale hoje cerca de US$ 4 trilhões – mais do que o PIB do Reino Unido. Com a experiência, a trajetória e a responsabilidade que tem, o presidente do JP Morgan não usa palavras por acaso.
E se Dimon não quis estimar o risco de recessão, outro gigante de Wall Street vem fazendo essa conta. A Goldman Sachs, outra "vencedora" da crise de 2008, elevou nesta semana a probabilidade de os EUA entrarem em recessão de 35% para 45%. Foi a segunda elevação em sete dias, partindo de 20%. Em uma semana, a hipótese de recessão foi duplicada.
O estrago que Trump provoca na economia americana, sem contar as demais, já não pode ser varrido para baixo dos tapetes de Wall Street. A reação vem ganhando força, para tentar convencer o presidente dos EUA a acionar um "stop loss" – decisão que, muitas vezes, absorve perdas com ações, mas encerra a negociação com o papel em crise.
Atualização: uma das manifestações mais duras veio do bilionário e investidor Bill Ackman, fundador da Pershing Square e aliado de Trump. Alertou que, se o presidente dos EUA, o país vai mergulhar em "inverno nuclear econômico autoinflingido". Em publicação no X (ex-Twitter), disse que, com as novas tarifas, "os investimentos das empresas ficarão sob impasse e os consumidores fecharão suas carteiras." E ainda que os EUA prejudicarão "gravemente nossa reputação com o resto do mundo, algo que levará anos e, potencialmentem décadas, para ser reconstruído".
Os impactos possíveis
Antes do anúncio oficial, bancos, universidades e órgãos de financiamento de exportações fizeram projeções sobre o impacto do tarifaço de Trump. Cada um adotou um cenário diferente para o aumento das alíquotas. A coluna está mantendo, no final dos textos sobre o tarifaço de Trump, os principais pontos, mas adverte: o anúncio, concordam os especialistas, foi pior do que o esperado e tornou os cenários traçados benignos frente ao potencial de prejuízos.
1. Goldman Sachs, uma das maiores instituições financeiras dos EUA, com aumento de 15 pontos percentuais neste ano: aumento na probabilidade de recessão de 20% para 35%, alta no índice de inflação mais observado pelo Fed de 3,5% (a meta lá é de 2% ao ano).
2. Laboratório de Orçamento da Universidade de Yale, com elevação de 13% na tarifa efetiva dos EUA: aumento de preços entre 1,7% e 2,1%, redução entre 0,6 e 1 ponto percentual no PIB e perdas de US$ 1 mil a US$ 1,3 mil para as famílias americanas.
3. Instituto das Economias em Desenvolvimento, ligado à Organização de Comércio Exterior do Japão (Jetro, na sigla em inglês), com tarifas de 25% dos EUA: queda de 0,6% no Produto Interno Bruto (PIB) mundial em 2027 (perda de US$ 763 bilhões), puxado por tombo de 2,7% no PIB americano de 2027 e forte impacto nos lucros de empresas americanas que dependem de componentes chineses.
4. Universidade Aston (Reino Unido), com tarifas de 25% sobre todas as importações, seguidas de retaliações na mesma alíquota: perda de US$ 1,4 trilhão na economia mundial e drástica elevação de preços nos EUA. Teria efeitos semelhantes ao da guerra comercial de 1930 que aprofundou a Grande Depressão.