
O conclave para a escolha do papa que vai suceder Francisco não começa antes de 5 de maio, mas ainda vai se realizar sob o eco das multidões que se formaram para a despedida. Depois do sepultamento na igreja Santa Maria Maggiore, previsto para sábado, ainda falta o "novendiale", período de nove dias em que são realizadas missas para homenagear e orar pela alma do pontífice.
A mobilização popular reforça o legado e o exemplo do papa que considerava a Igreja Católica como lugar de "tutti, tutti, tutti". E também condiciona as escolhas do colégio cardinalício, cuja composição foi modificada de forma drástica por Francisco, sem significar que a maioria dos nomeados por ele se alinhe a suas ideias.
Os números impressionam, é verdade: foram indicados pelo mais recente papa 110 dos 135 cardeais votantes. Restam 22 indicados por Bento XVI; e cinco, por João Paulo II. A diversidade que Francisco buscou não foi a do posicionamento teológico ou ideológico, mas geográfica. Hoje, a maioria é de não europeus, mas europeus são a maioria. Parece, mas não é difícil entender: a maior parte dos "eleitores" é da Europa, mas a soma dos demais supera essa delegação.
Embora exista debate legítimo sobre efeito líquido do pontificado de Francisco, há uma certeza: nunca se falou tanto sobre o líder da Igreja Católica. A discussão é se isso aumentou o número e o engajamento de fiéis em um mundo dominado por outro sistema de crenças e ídolos – dos de ouro aos de barro.
O conforto espiritual que Francisco ofereceu nos dias mais tenebrosos da humanidade, os de pandemia e guerra, também vai pesar na decisão. A volta ao pontificado de um dos "doutores da Igreja Católica", como Bento XVI, parece pouco provável.
Segundo um ditado citado no filme Dois Papas, de Fernando Meirelles, "Deus sempre corrige um papa presenteando outro papa ao mundo". Como todo o filme, trata-se de uma licença poética coerente com seu universo ficcional. Assim como o mundo sequestrado pela polarização, os cardeais podem se dividir entre conservadores e progressistas. Ou focar na sobrevivência de uma das instituições mais longevas da humanidade.