Poucos economistas entendem o orçamento da União como Felipe Salto, que passou mais de cinco anos debruçado sobre as contas nacionais como diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI, que liderou de novembro de 2016 a abril de 2022).
É com esse crédito que Salto, atualmente sócio e economista-chefe da Warren Rena - uma corretora da fintech gaúcha - afirma que há "equívocos em série" nas críticas ao marco fiscal.
Um dos pontos que destaca é a interpretação de que a projeção de crescimento real do gasto em 2024 seria sinal de falta de austeridade da proposta e risco de descontrole da dívida:
— A taxa real de 2,3%, estimada por nós, se confirmada, não representará risco fiscal adicional ou coisa que o valha. Claro que uma elevação artificial da receita para turbinar a taxa real de crescimento do gasto seria um péssimo caminho. Isso, no entanto, não está até agora no radar.
Os "equívocos" apontados por Salto
1. A Lei de Responsabilidade Fiscal não será flexibilizada. Ainda haverá metas anuais e plurianuais, agora com uma sanção em caso de descumprimento: limitar a alta do gasto no ano seguinte.
2. Os 13 itens que são excepcionados equivalem à lista de exclusões do antigo teto de gastos, de modo que os mesmos riscos do modelo anterior são os atuais. O volume calculado pela Warren Rena representa pouco mais de 22% em relação aos gastos totais.
3. A sanção prevista para o caso de rompimento da regra de obtenção de resultado primário terá de ser aplicada via contingenciamento ou bloqueio de gastos. Não está solta ou desancorada.
4. A regra de correção da receita corrente líquida, ao considerar o IPCA acumulado até junho, em 12 meses, e não média contra média, erra, porque o correto matematica e economicamente, é média ante média. Mas era assim teto de gastos. A questão não representa, necessariamente, espaço adicional para gastos. Isso só ocorreria na presença simultânea de dois fatore: aceleração da inflação do primeiro para o segundo semestre e elevação atípica de receitas no primeiro semestre.
5. O "enforcement" (poder de obrigar o cumprimento) da regra de gastos é exatamente o mesmo do teto de gastos, agora com mais flexibilidade. A proposta orçamentária não poderá ser enviada sem respeitá-la e a execução nunca poderá romper o limite, porque haveria contingenciamento para controle, se necessário.
6. A trajetória da dívida não está desligada do novo arcabouço, como ocorria com o teto de gastos. O projeto obriga a apresentação dos efeitos das novas regras, em cada projeto anual de lei de diretrizes orçamentárias, sobre a trajetória da dívida/PIB.
7. O investimento não crescerá livremente. Só o "excesso" em relação ao limite superior da meta de primário poderá ser gasto, e com teto previsto.
Salto esclarece que, em sua avaliação, "a regra está longe de ser perfeita" e de fato precisa, para entregar resultados, de novas receita. Mas considera "boa" a regra de gastos que, na sua avaliação, melhora a trajetória do indicador dívida sobre o PIB.