Tanto pela indefinição sobre a vitória quanto pela intervenção destemperada do presidente Donald Trump, a eleição presidencial de 2020 nos Estados Unidos tem até agora o pior resultado possível para a economia.
A incerteza que já havia se instalado no mundo antes do coronavírus foi acentuada pela pandemia. A falta de previsibilidade sobre a contagem dos votos e a postura de quebra de regras do "maior líder da democracia ocidental" se combinam para criar mais turbulência.
Durante a madrugada, os gráficos dos mercados financeiros viraram montanha-russa. Investidores e especuladores, claramente, não têm candidato. Havia leve preferência por Trump, mas nos últimos dias prevaleceu a tese de que Joe Biden poderia representar a aprovação mais rápida do pacote de estímulos em análise no Congresso. Além disso, como os democratas pressionam para um valor acima de US$ 2 trilhões (equivalente a todo o PIB brasileiro), a eleição de Biden poderia representar ganhos para as bolsas, que se tornaram dependentes da liberação desse tipo de ajuda.
Mas a instabilidade vai muito além do mercado financeiro. Apesar da visão favorável sobre Biden, a eventual reeleição de Trump está longe de contrariar o establishment econômico. Em oposição ao temor de que Biden eleve impostos das empresas em geral, e em especial das gigantes de tecnologia, o republicano representa a manutenção de condições favoráveis ao universo corporativo. O que se teme, com uma recondução de Trump, é a manutenção do ambiente de conflitos que marcou seus quatro primeiros anos.
Do ponto de vista econômico, um resultado limpo de vitória de Trump ou Biden seria igualmente bem aceito. O que provoca desconforto é a incerteza – neste momento, não se sabe "quando" e "se" o resultado será proclamado – e a instabilidade, com a hipótese de mais quatro anos de presidente que aponta fraude sem apresentar provas e ameça levar o processo eleitoral à Suprema Corte. Não há investidor que não se pergunte se pode ser o próximo alvo do comportamento errático de Trump.
Do ponto de vista do Brasil, há um risco extra: está claro que um dos grandes motivadores do voto a Trump foi a economia, inclusive das populações menos privilegiadas. Lida precipitadamente, essa mensagem pode estimular os defensores de gastos públicos até 2022, para criar ambiente favorável à reeleição também no Brasil. O desejo de bem-estar, neste caso, precisa ser interpretado como melhora sustentável, para que não se repitam nos próximos anos os mesmos cometidos antes da reeleição de Dilma Rousseff. A situação fiscal brasileira é perigosa, e o excesso de foco no curto prazo pode comprometer seriamente as condições para o futuro próximo.