Porto Alegre já foi mais alegre. Mas um evento segue com a luz que sempre teve: a Feira do Livro. Para quem vai passear e fazer o estoque de leitura para as férias seguem dicas.
Imperdível
Tribunal da Quinta-Feira, de Michel Laub, Ed. Companhia das Letras. Um homem de meia idade tem sua reputação arrebentada na internet por vingança amorosa. Algo sutil, apenas uma montagem maliciosa de seus e-mails vazados e lidos fora do contexto. Revela o perigo das redes sociais e como elas funcionam com a mesma psicologia da multidão: reage em bloco, age sem pensar, julga sem ouvir, crucifica "culpados", não conhece a clemência. Enfim, ama sangue e move-se pelos extremos. Esclarece a nova Inquisição e como facilmente podemos aderir a ela. Amanhã pode ser você o supliciado e não por um erro, mas por algo teu apenas parecer um.
Surpreendente
A Vida Secreta das Árvores, de Peter Wohlleben, Ed. Sextante. Um engenheiro florestal alemão revoluciona a ideia que temos das árvores. Elas são mais inteligentes, solidárias entre si e reagem de maneiras que nem em fantasia suspeitaríamos. Debaixo das florestas, as malhas de raízes trocam informações e nutrientes, o "cérebro" delas está ali. É um daqueles livros de botânica que encanta leigos sem ser superficial. Quanto à botânica sou amador, cultivo cactos e suculentas. Uma prática mínima, mas suficiente para valorizar o que ele nos ensina sobre raízes e solos e o reino vegetal. Saímos do livro melhores jardineiros.
Consolador
Os Largados, de Michele Serra, Ed. Alfaguara. O autor italiano (sim, caro leitor, é um homem) escreve sobre a adolescência de seu filho. Eu ando as voltas com esse tema e creio que essa é a melhor descrição literária do desconcerto de um pai atual com a geração seguinte. Livro despretensioso, leve, mas nos deixa menos sozinhos na angústia que é suportar as diferenças no modo de ser e encarar o mundo. Narrado com um bom humor ácido, algo rabugento, os pais vão se sentir traduzidos e vingados.
Perturbador
Uma Herança Incômoda, de Nicholas Wade, Ed. Três Estrelas. O livro começa com uma excelente síntese da história do racismo científico apoiado na genética e como esse movimento desembocou nas ideias de eugenia. A questão do autor é explicar como esse primeiro mau passo tingiu ideologicamente qualquer posterior discussão sobre herança genética. É um terreno pantanoso, incerto, de qual seria o alcance do que herdamos e como isso se revelaria. O autor é corajoso e hábil em mexer no vespeiro daquilo que não queremos pensar: a loteria genética. O começo é de alcance geral, depois requer uma familiaridade com termos da biologia.
Heteróclita e bizarra minha lista, eu sei. Mas faça a sua e compartilhe. Os livros encontram seus caminhos na gratidão de seus leitores.