Em 16 de abril passado, quando o coronavírus iniciava sua escalada, o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, descreveu-o como um “inimigo feroz” e sintetizou: “É uma guerra, e as Forças Armadas estão nela”. De fato, o ministro fez uma definição precisa do combate à covid, e seguramente, sem o apoio decisivo das três forças militares em todos os cantos do país, a catástrofe teria implicações muito mais dramáticas.
Infelizmente, a visão da Defesa sobre o “inimigo feroz” nunca foi compartilhada pelo único chefe de Nação no planeta que menospreza os riscos da doença, ignora as lições da ciência e prefere culpar a imprensa pela tragédia que vivemos. Ao apregoar tratamentos sem comprovação, estimular aglomerações e zombar de vacinas e de quem se esforçou por obtê-las, Jair Bolsonaro preside com os sentidos da mãe que vê o filho desfilar desconjuntado do resto da tropa e, orgulhosa, exclama: “Só o Joãozinho está no passo certo!”.
Entrincheirado em suas teses peculiares, Bolsonaro fulminou dois ministros da Saúde até encontrar um cuja carreira se assenta em quatro valores: o respeito à hierarquia, a lealdade e os sensos de dever e missão. Mas o general Eduardo Pazuello não sabia em que guerra estava se metendo quando concordou em ser efetivado no ministério. Não há Eisenhower capaz de tomar as praias da Normandia se o comandante-em-chefe desdenha da guerra e ataca quem se preocupa com o inimigo.
Sem jogo de cintura e neófito em saúde, Pazuello vem sendo incinerado em campo aberto pelos fiascos na nossa Normandia quando a responsabilidade deveria ser debitada a um degrau acima. Para o Bolsonaro dos “maricas” e da sabotagem às vacinas, a situação é confortável. Enquanto o general, em sua sina, vira um saco de pancadas, o mentor da estratégia da irresponsabilidade se oculta por detrás do ministro.
Pazuello pode ter memória seletiva, ser um tanto lento e ruim de comunicação, mas ao menos, até onde se sabe, não acha que vivemos uma gripezinha, não rouba e nem deixa roubar. Em se tratando de Brasília e do bilionário Ministério da Saúde na maior crise da história recente, já é um feito e tanto.
A situação já está difícil com Pazuello, mas quem pede a cabeça dele parece não conhecer a de Bolsonaro. Para o lugar do militar, provavelmente iria um destes dois tipos: mais um negacionista amalucado anti-China seguidor de Olavo de Carvalho ou um charlatão indicado por políticos do Centrão eriçados por milionários contratos emergenciais da saúde. Uma substituição deste quilate equivaleria a nutrir o vírus com fortificante.