Como sugere o regime democrático, abrimos espaço na Rádio Gaúcha para ouvir uma das ministras mais queridas pelos apoiadores do presidente Jair Bolsonaro: a titular da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, nesta terça-feira (23). Pastora e ativista na defesa de crianças e jovens - em especial quanto ao combate à exploração sexual -, Damares comentou o dolorido caso da menina que fora estuprada pelo tio desde os seis anos de idade e acabou engravidando a partir dos sucessivos abusos. Como se sabe, a menina teve a gravidez interrompida, a partir de autorização da Justiça. A ministra, conforme contou à Rádio Gaúcha, foi contra o procedimento e insistiu que a criança deveria ter mantido a gravidez fruto do estupro.
Discussões sobre aborto à parte (recomendo ouvir a entrevista), faltou algo muito importante na fala de Damares sobre o episódio. Falo sobre a ausência de uma reprimenda forte e enfática ao comportamento da ativista Sara Giromini, uma das responsáveis por vazar o nome da menina violentada. Sara é apoiadora ferrenha do governo Bolsonaro, se posiciona contrária ao aborto (mesmo em casos autorizados pela legislação) e trabalhou com Damares no Ministério da Família. Disse a ministra à Rádio Gaúcha que Sara, de fato, errou ao gravar vídeos com o nome da criança. Mas culpou grupos de WhatsApp que, segundo ela, já continham a informação da identidade da vítima.
Insistimos na pergunta sobre a responsabilização de Giromini. Isso porque a conduta de Sara - que divulgou nas redes sociais não somente o nome da menina, mas também o hospital em que ela faria o procedimento - pode ser considerada crime com base em artigos do Código Penal e do Estatuto da Criança e do Adolescente. Diversos especialistas na área jurídica concordaram quanto ao enquadramento. Indagada por duas vezes, a ministra se limitou a dizer que Sara errou, mas que o nome já estava circulando pelos aplicativos de mensagem, sugerindo, portanto, que a culpa não foi dela.
E mais: buscou responsabilizar a mídia, mais uma vez se eximindo de uma reprimenda dura sobre a ex-funcionária.
Pelo histórico de defesa das crianças, seria de absoluto bom tom que a ministra condenasse, de maneira enfática, o comportamento da jovem Giromini, que expôs uma criança vítima de abuso sexual e que precisou entrar no hospital escondida no porta malas de um carro, para escapar do grito de manifestantes contra o aborto na porta da instituição. Como influenciadora digital, Sara ampliou o alcance de dados absolutamente sigilosos, que (por força de lei e respeito a uma criança) deveriam permanecer distantes do conhecimento da população.
A atitude de Sara é criminosa e merecia ser repreendida pela ministra. Aliás, não somente por ela. Mas por toda a sociedade que preza pelas suas crianças.