É da fotógrafa Márcia Foletto a imagem do ano, no Brasil, até aqui. Um retrato dilacerante que expõe, num mesmo frame, a tentativa de proteger nossas crianças diante da barbárie praticada por grupos criminosos e o enfrentamento que precisa ser feito pelo Estado. O Rio de Janeiro talvez seja o exemplo mais explícito dessa realidade: o combate ao crime versus pessoas inocentes, que vivem na linha de tiro.
Por que uma criança dessa idade não pode simplesmente ir à escola em um ambiente saudável e recheado de afeto?
Na foto, uma menina de mais ou menos seis anos está encostada na parede com mochila e uniforme da escola. Pelo horário, estava indo estudar. A educação, aliás, é justamente ferramenta importante de transformação social. Em frase atribuída a Nelson Mandela, diz-se que é a “arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo”.
No Rio, contudo, a arma foi outra. E não julgo a ação policial porque, repito, o enfrentamento do crime precisa ser feito e não podemos permitir que os tentáculos de facções continuem a se espalhar de forma célere.
Vejamos o caso do excelente trabalho da Polícia Civil gaúcha na semana passada. Os alvos eram criminosos que extorquiam comerciantes do Vale do Sinos, exigindo valores “em troca de proteção”. Conforme o delegado Ayrton Figueiredo, as extorsões ocorriam em larga escala mediante ameaças, agressões e até mesmo estabelecimentos depredados ou incendiados. Absurdo completo.
Mas, voltando ao caso do RJ, não há como se eximir de uma reflexão profunda sobre a foto e a criança. Na imagem, a irmã a protege de ver um corpo embalado em um saco. Um bandido morto na operação. Como salvar meninos e meninas dessa violência? Por que uma criança dessa idade não pode simplesmente ir à escola em um ambiente saudável e recheado de afeto? Doeu na alma.
Mas, para contrapor a cena dilacerante a que me referi, quero encerrar esse texto com esperança. Na última sexta-feira, ouvimos, na Rádio Gaúcha, um médico brasileiro premiado na Itália que veste seus pequeninos pacientes de super-heróis antes de levá-los ao bloco cirúrgico. Leandro Guimarães nos contou emocionado sobre a felicidade das crianças que “voam”, nos braços do médico, até a sala de cirurgia. O choro transformado em memória feliz. O amor na forma de pequenos Batmans e Super-Homens.
Quando lhe perguntei, afinal, por que ele fazia desta forma, ele respondeu:
– Eu não saberia fazer de outro jeito.
É isso. A foto da menina nos entristece, mas grita: precisamos fazer de outro jeito.