Alguns anos atrás, inspirada pela minha filha, por Peter Singer e pela preocupação com o futuro do planeta e do meu colesterol, decidi parar de comer carne. Minha razão e meu coração estavam alinhados no mesmo propósito, o que me parecia suficiente para levar adiante a mudança. Não era. A nova dieta exigia não apenas força de vontade, mas planejamento, grana, tempo e um certo estoicismo em relação aos prazeres da mesa. Humilhada pela sensação de derrota moral, voltei a comer carne alguns meses mais tarde. Mas não exatamente da mesma maneira. Virei uma “flexitariana”, rótulo que dá alguma dignidade à decisão de reduzir o consumo de carne sem abandoná-lo completamente. Uma espécie de acordo entre o desejável e o possível.
Na semana passada, voltei a colocar minha força de vontade à prova quando decidi sair do Facebook e do Instagram. Mais uma vez, coração e mente estavam a postos para apertar o botão de “fui!”, mas o teste da realidade é mais demorado e exigente. Vou conseguir viver sem postar textos e ler comentários gentis, sem acompanhar o dia a dia dos amigos que moram longe, sem ficar por dentro da última treta, sem desabafar e ler os desabafos alheios, sem fazer o footing na Rua da Praia do mundo? Não tenho certeza, mas vou tentar.
O mal-estar crônico com relação às big techs, também conhecido como “techlash” (“tech” + “backlash”, retaliação em inglês), é evidente. A combinação de monopólio econômico com a onipresença na vida cotidiana ajudou a criar a sensação de que estamos todos presos em uma gaiola invisível da qual não conseguimos escapar — seja porque dependemos dela para ganhar a vida, seja porque já nos parece impossível viver em sociedade abrindo mão das redes.
O apoio dos empresários que iam mudar o futuro à nostalgia fascista de Donald Trump foi apenas o empurrãozinho que faltava para que eu decidisse aderir ao “flexitarianismo” digital, abandonando o que dá para abandonar (Facebook, Instagram, Xuíter) e permanecendo apenas no que é essencial. Mesmo antes, já me incomodavam a sensação de perda de tempo, os humores insondáveis do algoritmo, o fluxo excessivo de anúncios e fake news e a dependência cada vez mais aguda da aprovação e do olhar alheio.
Saio sem muita certeza de que vai dar certo, torcendo para que neste exato instante, em alguma garagem do planeta, um gênio desconhecido esteja matutando como criar uma rede social um pouco mais parecida com aquilo tudo que um dia elas prometeram ser. Fui.