Na sexta-feira (18), seis feminicídios aconteceram em menos de 24 horas no Rio Grande do Sul. Seis mortes brutais em seis cidades: Viamão, Santa Cruz do Sul, Bento Gonçalves, Parobé, Feliz e São Gabriel.
O Estado mostra-se profundamente adoecido de machismo e misoginia. Da madrugada à tarde, das balas às facas, os crimes se espalharam como uma epidemia de ódio pelas principais regiões: Metropolitana, Serra, Vale do Rio Pardo, Vale do Paranhana, Vale do Caí e Fronteira Oeste.
Todos os envolvidos e suspeitos são maridos ou ex-namorados. Ou não aceitavam o fim da relação, ou não admitiam divergências ou sofriam de ciúme.
A vida das mulheres gaúchas está em perigo, parece que vale nada. É isto que é dito, na ameaça que se transforma em execução a sangue-frio:
— Você não vale nada.
A possessividade vem dizimando famílias e abreviando futuros. É isto que é dito:
— Se você não é minha, não será de mais ninguém.
Nenhum mandamento sagrado da existência é respeitado. Caroline Machado Dorneles, 25 anos, encontrava-se grávida de três meses. Ela e seu filhinho, dormindo esperançoso em seu corpo, foram assassinados a facadas pelo ex-companheiro em Parobé.
Sequer a gestação inibiu a truculência, numa crueldade sem limites, numa completa profanação da vulnerabilidade. Acredito que Caroline não chegou a se defender, tentou em vão proteger seu ventre do ataque. Era mãe também de uma criança de cinco anos.
O que falar, então, de Juliana Proença, 47 anos, em São Gabriel? Golpeada furiosamente na frente da filha de seis anos pelo ex-namorado, que não teve piedade da pequena testemunha olhando tudo.
Em Feliz, Raíssa Müller, 21 anos, e o seu namorado Eric Turato, 24, terminaram subjugados numa emboscada pelo ex-namorado dela, que descobriu fotos do casal nas redes sociais. Em Viamão, Patrícia Viviane de Azevedo, 50 anos, sucumbiu baleada pelo ex-marido no bairro Santa Isabel. Em Bento Gonçalves, Jane Cristina Montiel Gobatto, 54 anos, viu-se encurralada e apunhalada até a morte pelo companheiro, preso em flagrante. Em Santa Cruz do Sul, Simone Andrea Meinhardt, 49 anos, amargou igual sina: morta a facadas pelo companheiro, usuário de cocaína.
Seis feminicídios em um único dia é a média de um mês inteiro em 2024. Um pico alarmante, que escancara a cultura de extermínio de um gênero.
É necessário repensar as leis brandas e redobrar o cumprimento das medidas protetivas. Já são 21 feminicídios no ano que mal iniciou, cada qual numa cidade diferente.
Nem quando os ex vão embora, as mulheres recuperam a sua paz. Aliás, é na ruptura que irrompe o inferno da perseguição. Alguns homens só não matam porque passaram a se relacionar com novas presas.
Diante da carnificina em andamento, não é possível alegar que é exceção ou se acomodar na omissão e na impunidade. Mães, filhas, amigas, colegas, quantos lutos cobrindo de escura tempestade os céus do feriado?
Um dado preocupante: das seis vítimas, duas tinham pouco mais de 20 anos e quatro se situavam na faixa dos 50. Ou seja, bem nos momentos em que começavam ou recomeçavam a vida amorosa — com uma imensa dificuldade, devido à violência doméstica, para abandonar um namoro ou um casamento.
Numa data santa, numa Sexta-Feira da Paixão, por absoluta maldade, seis mulheres não estão mais com as suas famílias para a Páscoa. Nunca mais estarão. Não haverá domingo de ressurreição para elas.