Os papéis fixos no casamento atrofiam o amadurecimento pessoal.
Porque você acredita que o outro tem mais talento do que você numa tarefa e deixa de exercê-la.
Se você é casado com um chef, não cozinhará mais. Ficará constrangido de mexer nas panelas, envergonhado de seu miojo, encabulado de terminar a noite com o famigerado mexidão. Até gostava de preparar sua comidinha, mas, dividindo o espaço com uma autoridade, passa a negar o fogão. Para não receber sermão. Para não fazer feio. Para não ser criticado pelo arroz sem sal ou pela refeição insossa.
Você não deve sofrer com a necessidade de alcançar a mesma excelência ou reproduzir a alta performance do seu cônjuge.
Se você é casado com personal trainer, não poderá assistir a nenhum tutorial de atividade física, para evitar conflitos de vaidade dentro de casa.
Se você é casado com decorador, jamais poderá colocar aquelas almofadas rosa no sofá branco ou palpitar na cor das paredes.
Se você é casado com médico, ai se não seguir a medicação dada por ele, ai se recorrer a tratamentos alternativos ou espirituais.
Sou poeta, e tento incentivar a minha esposa advogada a redigir suas declarações festivas a amigos e familiares. Pois ela inventou que, diante de qualquer aniversário ou homenagem, eu é que tenho o dom da palavra. Passou a me delegar a exclusividade literária da residência quando ela, na verdade, escreve bem e do seu jeito.
Além do exercício das profissões, a anulação de identidade também tem chance de ocorrer pela crença limitante de que o nosso parceiro tem mais domínio numa determinada área. Quem dirige melhor fica responsável por sempre dirigir. Quem entende mais de finanças fica responsável por realizar todas as contas domésticas. Quem fala melhor inglês fica responsável por ser o porta-voz do casal em viagens ao exterior.
Isso cria uma dependência ao invés de uma salutar complementação de personalidades. Existirá o cultivo de uma superioridade moral por um dos lados, rompendo a ideia da igualdade de atribuições.
Pois aquele que não dirige tão bem abdicará de praticar, aquele que foge de matemática perderá o controle dos gastos, aquele que não tem um segundo idioma jamais poderá se expressar sozinho.
Assim ninguém desenvolve novas habilidades. Assim um dos dois não sairá do seu lugar de aprendizado. Assim a relação mergulhará no comodismo das funções preestabelecidas.
Fazer o que a nossa companhia tem imensa facilidade não significa menosprezar o conhecimento adquirido da parte dela ou sabotar a sua formação acadêmica, mas corresponde a evoluir paralelamente em nossa visão de mundo, não parar de experimentar o próprio poder e de desenvolver diferentes aptidões ao longo da vida.
Você não deve sofrer com a necessidade de alcançar a mesma excelência ou reproduzir a alta performance do seu cônjuge.
Onde o seu par tira sustento, há a possibilidade de se descobrir um delicioso passatempo.