Eu fiquei feliz quando WhatsApp, Facebook e Instagram não funcionaram direito na última quarta. Não por apreciar o caos ou torcer para que tudo dê errado e assim me sentir em igualdade de condições com os outros (todos ferrados). Mas porque ninguém conseguia mandar áudio ou imagens ou emojis. Havia a obrigação de escrever!
Voltamos por um dia ao tempo das cartas e dos e-mails. Meus filhos eram condicionados a digitar o que desejavam, minha esposa era condicionada a detalhar o que queria. A família inteira não podia me tapear — recebi dedicação exclusiva da linguagem.
Talvez tenha sido a data em que foram usados mais caracteres nos últimos tempos.
Nada da pressa de gravar áudios fazendo mil coisas simultaneamente, nada da preguiça de resolver uma situação com uma imagem simpática de braço levantado ou coração, as pessoas tinham que parar para enfrentar novamente o alfabeto, a concordância, a legibilidade das frases. Precisavam lidar outra vez com os seus erros de português, resolver se ansioso era com s ou c, se aterrissar tinha dois s também, se por que era junto ou separado na resposta ou na pergunta. Voltaram às dúvidas banais de dicionário, de elegância, da ordem sintática dos afetos.
Não poderiam recorrer à preguiça de memes, persistia o ultimato de descrever uma cena e explicar o estado emocional do momento.
Alguns em pânico escolheram ligar. Nunca recebi tantos telefonemas na vida. De gente que eu não me recordava mais dos trejeitos do timbre e das manias orais. Retornamos à saudosa época de aquecer as orelhas por excesso de ouvir. Mudou-se a natureza abreviada de recados para voltar a exercitar a conversa fiada, os risos, as histórias gratuitas, as lembranças secundárias, os questionamentos aleatórios. Deixou-se de lado a funcionalidade, o pragmatismo e a objetividade egoísta para descobrir como os nossos amigos realmente se encontram, casados ou separados, satisfeitos ou rebeldes.
Os aplicativos deveriam oferecer um day off de desintoxicação. A intimidade agradece.