
Peço licença para contar uma história familiar. Minha tia Isabel e meu tio Jorge foram pela primeira vez à Europa em 2019, quando ela completou 60 anos. Aquele dois de outubro caía numa quarta-feira, dia em que o Papa desce para encontrar os fiéis na Praça de São Pedro. Ele anda em meio às pessoas e as abençoa. Meus tios são super católicos. Essa viagem era mais do que um sonho para eles, ainda mais em uma data comemorativa.
Meus pais, que já conheciam a Itália, foram os cicerones. Meu pai fez jus ao ditado de quem tem boca vai a Roma. Deu um jeito de ficar bem posicionado, perto dos gradis, como se estivesse na primeira fila de um show. Contou-me que foi pura sorte e paciência. Mas teve estratégia. Eles ficaram na cerca, bem à esquerda, porque sabiam que era onde o Papa Móvel sempre passa por aquele local do Vaticano. O “passeio” seguiu e nada de Francisco parar por ali. Até que ele foi até o local onde estavam e meu pai gritou, apontando para a minha tia, que “La signora fa il compleanno oggi”. Pois ele parou e andou em direção a eles.
Dias antes da viagem, meu tio, que produz terços em casa, nos contou que havia feito um para entregar ao Papa. Era branco, vermelho e azul, as cores do time de Francisco, o San Lorenzo, da Argentina. Mostrou aquelas contas coloridas com uma alegria e uma ingenuidade que eu não tive coragem de desapontá-lo e dizer que não conseguiria entregar, ou que seria muito difícil. Pensei, mas não disse nada, só encorajei a levar e elogiei o tercinho, que era mesmo bem bonito.
As semanas passaram e no dia dois chega a foto no grupo de whatsapp da família com o Papa bem pertinho deles. Mais do que isso, a ligação em vídeo horas depois foi linda demais. Minha tia, no dia do aniversário, ganhou um terço das mãos do Papa. Ela foi surpreendida pelo gesto do Santo Padre, que colocou a mão no bolso e tirou um rosário perolado, numa caixinha. O meu tio não só conseguiu levar como entregou ao próprio Papa, em mãos, o terço que havia feito em Novo Hamburgo, na sala de casa.
Francisco é assim. Um Papa próximo, humano, carismático e fraterno. Transparece isso. Derrubou muros de uma igreja distante e fechada, se aproximando do seu povo. Beija os pés de presidiários e dos pobres na quinta-feira Santa, como fez Jesus na Última Ceia. Recebe fiéis, abraça as pessoas, sem distinção.
Quando a nossa fé eventualmente esmorece, ter um Papa como ele traz renovação, inspiração e exemplo. Um dos dias mais emocionantes da minha vida foi um domingo de agosto de 2017, quando vi, de longe, o Papa Francisco pela janela no Vaticano. A simples presença dele me encheu os olhos d'água. Ele deu vida nova e esperança de um mundo melhor aos católicos, mas me atrevo a dizer que ao mundo, a pessoas de todas as crenças.