A Lagoa da Conceição, em Florianópolis, está contaminada com cocaína em concentrações que estão entre as mais altas já registradas no mundo, de acordo com uma pesquisa desenvolvida e divulgada pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) nesta quinta-feira (13). O nível da substância afeta diretamente a fauna e a flora locais. As informações são do portal g1.
Além da droga, o estudo identificou a presença de cafeína, diversos tipos de antibióticos e analgésicos. No total, foram detectados 35 "contaminantes emergentes", termo utilizado para substâncias de uso cotidiano, como cosméticos e produtos de higiene pessoal, que acabam sendo despejados na água.
Silvani Verruck, professora do departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos da UFSC, explica que os índices de cocaína e de benzoilecgonina (principal metabólito da droga) encontrados na lagoa são "surpreendentes, mas esperados", pois essas substâncias são liberadas pelo organismo humano por meio da urina e fezes.
Pesquisas anteriores já haviam detectado esses compostos, como em um estudo que identificou a presença de drogas ilícitas em tubarões da Bacia de Santos. A pesquisa realizada em Santa Catarina utilizou metodologia semelhante.
Ação humana
Embora o estudo não tenha focado em determinar as vias pelas quais essas substâncias chegaram à lagoa, a pesquisadora aponta algumas possibilidades, como esgoto não tratado, descarte ilegal direto na água e até mesmo o despejo de resíduos por embarcações.
Em resposta, a Secretaria do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Florianópolis declarou que os "resultados refletem os impactos das atividades humanas sobre o meio ambiente" e que adotará medidas, incluindo o diálogo com os órgãos responsáveis pelo saneamento e preservação da área.
Os pesquisadores ainda não divulgaram os dados quantitativos específicos sobre a droga e seus derivados, pois estão organizando outro artigo para publicação. A expectativa é que o estudo seja publicado ainda este ano.
O estudo também identificou a cafeína como a substância de maior concentração, seguida pela ciprofloxacina, um antibiótico utilizado para tratar infecções bacterianas. Além disso, foram detectados a clindamicina, outro antibiótico, e o diclofenaco, um anti-inflamatório. Para a professora, a presença desses compostos é preocupante.
Balneabilidade
Em relação à balneabilidade, Silvani esclarece que os contaminantes emergentes identificados na lagoa "não são considerados para o estabelecimento da qualidade de banho nos locais". O Instituto do Meio Ambiente (IMA) avalia semanalmente nove pontos da lagoa com base na concentração de coliformes fecais.
Na última análise, realizada na sexta-feira (7), dois dos nove pontos estavam impróprios para banho. Quanto ao consumo de pescado da região, o estudo não apontou riscos.
O professor e ambientalista Paulo Horta, da UFSC, destaca que, na prática, a pesquisa indica que o sistema de saneamento é ineficiente.
A reportagem entrou em contato com a Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan), responsável pelo tratamento de água na região. Em nota, a empresa afirmou que os resultados apresentados pela UFSC não têm relação com o efluente tratado pela Casan e que a água tem sido monitorada desde o rompimento da lagoa artificial, ocorrido há quatro anos (confira nota abaixo).
O Instituto do Meio Ambiente (IMA) também foi procurado, mas até a última atualização do texto não havia se manifestado.
O que diz a prefeitura de Florianópolis
"A Secretaria do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável informa que tomou conhecimento do estudo realizado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) sobre a presença de contaminantes emergentes na Lagoa da Conceição e irá analisar os dados apresentados. A partir dessa avaliação, serão adotadas as providências cabíveis dentro da competência da Secretaria, em diálogo com os órgãos responsáveis pelo saneamento e pela preservação ambiental.
Os resultados refletem os impactos das atividades humanas sobre o meio ambiente. Reafirmamos nosso compromisso com a qualidade da água e a proteção do ecossistema local, além da importância do monitoramento contínuo e da busca por soluções para minimizar esses efeitos e promover um desenvolvimento mais sustentável."
O que diz a Casan
"A CASAN informa que o efluente tratado na Estação de Tratamento de Esgoto da Lagoa da Conceição é destinado à Lagoa de Evapoinfiltração (LEI), não sendo lançado na Lagoa da Conceição. Os resultados apresentados pela UFSC não têm relação com o efluente tratado pela CASAN.
A Companhia destaca ainda, que neste ano divulgou o resultado do monitoramento feito ao longo de quatro anos. O acompanhamento foi iniciado após o acidente na encosta de dunas da LEI em janeiro de 2021, quando foram registrados 422,3 milímetros de chuva, enquanto o esperado era de 138,6 milímetros. Foram analisadas características físicas, químicas e microbiológicas de amostras de água salobra, de sedimento, da biota aquática (plâncton e bentos), além de toxicidade da água e sedimentos da Lagoa da Conceição.
Os resultados indicam que a qualidade da água varia entre as diferentes regiões da lagoa, e o acidente não deve ser considerado responsável por essas alterações, uma vez que a água da lagoa já se renovou pelo menos quatro vezes nesse período. As condições observadas são influenciadas, principalmente, por fatores como o crescimento populacional e o descarte inadequado de esgoto."