
A cada quatro casos de violência sofridos por mulheres de 16 anos ou mais no último ano no Brasil, ao menos um foi cometido diante do filho da própria vítima. É o que revela a pesquisa divulgada nesta segunda-feira (10) pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em parceria com o Instituto Datafolha.
Entre outros achados, a pesquisa apontou que ao menos 21,4 milhões de mulheres brasileiras, ou 37,5% da população feminina com 16 anos ou mais, foram vítimas de algum tipo de violência no último ano. Entre as formas mais frequentes, estão humilhações verbais e agressões físicas, como batidas, chutes ou empurrões.
Os dados estão presentes na quinta edição da pesquisa Visível e Invisível: Vitimização de Meninas e Mulheres, que é realizada de dois em dois anos. O principal objetivo é entender a violência contra mulher para além dos registros policiais.
Foram realizadas entrevistas em 126 municípios, entre 10 e 14 de fevereiro de 2025. Ao todo, 793 mulheres com 16 anos ou mais responderam a um questionário, de forma presencial, sobre formas de violência que possam ter experimentado ou presenciado ao longo dos 12 meses anteriores à coleta de dados – ou seja, entre fevereiro de 2024 e fevereiro de 2025.
Conivência de terceiros
O estudo aponta ainda que, entre as mulheres que responderam ter sofrido violência no último ano, a grande maioria (91,8%) disse ter sofrido violência na presença de terceiros. Entre eles, amigos e filhos.
Em 47,3% dos casos, quem presenciou foram amigos ou conhecidos; em 27%, os filhos; e em 12,4%, outros parentes. Apenas em 7,7% as violências foram testemunhadas por pessoas desconhecidas.
A pergunta sobre a presença de terceiros foi incluída pela primeira vez. "Este dado chama atenção não apenas por indicar que a esmagadora maioria dos casos contou com testemunhas, mas principalmente porque 86,7% das mulheres afirmaram ter sofrido violência na presença de um conhecido", diz o estudo.
Para Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o dado mostra uma "certa conivência" em relação à violência contra mulher, que em grande parte dos casos ocorre dentro da casa da vítima e tem companheiros ou ex-companheiros como os agressores.
— As pessoas no entorno sabem que essa mulher está sofrendo violência. Muitas vezes, enquanto sociedade, ainda somos coniventes com muitas formas de violência, é o famoso em briga de marido e mulher não se mete a colher — afirma.
A pesquisadora aponta que, em parte dos casos, essa conivência se dá porque muita gente não entende a gravidade dessas práticas de violência quando elas não são tão explícitas.
— Você sabe que aquela mulher tem uma relação abusiva, está vendo que ela é abusiva, mas não vê o homem bater nela explicitamente, então não faz nada — exemplifica.
O ponto, segundo ela, é que, além de essas formas de agressão já serem danosas às vítimas, as formas mais graves de violência contra mulher costumam se dar justamente pela escalada de tipos de agressão considerados mais brandos.
— Muitas vezes, o tempo entre um caso de agressão até um feminicídio é muito rápido — afirma. — Não tem como prever em quanto tempo isso vai escalar.
Perfil da vítimas
A pesquisa divulgada nesta segunda ainda destaca que estudos mostram que a exposição à violência doméstica na infância está relacionada a "diversos impactos negativos, como baixa autoestima, retraimento social, depressão e ansiedade, além de outros desfechos psicossociais e comportamentais adversos".
— O quanto isso, de algum modo, alimenta essa máquina que se reproduz? Como a gente muda essa cultura se tem filhos nesses ambientes que estão assistindo a esses comportamentos e que muitas vezes os naturalizam? — questiona Samira.
A análise do perfil das vítimas de violência no último ano indica que mulheres de 25 a 34 anos (43,6%), de 35 a 44 anos (39,5%) e de 45 a 59 anos (38,2%) são os grupos etários mais afetados pelas diferentes formas de violência apuradas na pesquisa. Ainda assim, há elevada prevalência da violência em todas as faixas etárias, especialmente entre mulheres com idades entre 16 e 59 anos.