Depois de ser informado no Hospital de Torres que haviam encontrado arsênio no organismo de parentes que passaram mal depois de comer um bolo de Natal feito por sua mãe, Zeli dos Anjos, o administrador de empresas Diego Silva dos Anjos, 40 anos, prestou depoimento à Polícia Civil na condição de testemunha.
O relato ocorreu em 27 de dezembro, quando três pessoas já haviam morrido. Ele falou que sua mulher, Deise Moura dos Anjos, 42 anos, tinha uma relação de altos e baixos com a sogra Zeli, como uma espécie de "eletrocardiograma". Mas negou que a esposa fosse capaz de envenenar familiares.
Oito dias depois, a polícia prendeu Deise pela suspeita de ter colocado arsênio — um elemento químico mortífero e conhecido na forma comercial pelo nome de arsênico — na farinha utilizada por Zeli para fazer o bolo que foi ingerido por familiares em uma café da tarde no dia 23 de dezembro, em Torres, no Litoral Norte. Na ocasião, a polícia, com base em depoimentos de testemunhas, havia pedido a prisão temporária de Deise em 25 de dezembro, mas optou por buscar mais provas e pediu a revogação.
Diego negou que tenha feito pesquisas sobre veneno, mas disse que Deise o fez, no dia 26, depois dele saber da presença do veneno no organismo de parentes. Ele disse que Deise até mostrou um vídeo sobre o assunto para ele. Questionado sobre ameaças que Deise teria feito a Zeli, como dizer que ela veria toda família em um caixão, Diego explicou:
Deise, num rompante, pode ter falado alguma besteira sobre querer ver a família toda morta, mas que seria da boca para fora. Que Deise não teria motivo nem seria capaz de envenenar seus familiares. Que não acredita que Deise faria isso.
Sobre como tomou conhecimento do caso, Diego contou à polícia que viu a história de pessoas mortas em Torres pela TV, no dia 24. Disse que mandou mensagem para a mãe e para uma das tias, Neuza Denize Silva dos Anjos, sem ter resposta. Depois, recebeu ligação de um vizinho de Zeli da casa de Arroio do Sal, questionando como ela estava. Diego disse que até então não sabia que o caso do suposto envenenamento ocorrido em Torres envolvia seus familiares.
Com a ligação do vizinho, ele insistiu por contato com familiares, escrevendo para outra tia, Maida Berenice Flores da Silva. Foi então que recebeu telefonema de uma vizinha de Arroio do Sal relatando que a polícia e peritos estavam na casa de Zeli. Ele fez, então, contato com uma tia paterna para buscar notícias e confirmou que as vítimas eram seus familiares. Diego disse que então acordou a mulher, Deise, para dar a notícia, e foi para Torres.
Ao chegar no hospital, Diego ainda falou com a tia Neuza e depois, encontrou a mãe. Disse que Zeli comentou que todos haviam passado mal depois de comer o bolo de reis. Ao acompanhar um familiar à delegacia para registro de uma das mortes, Diego disse que teve um breve depoimento gravado em vídeo por uma policial. Contou ter estranhado as perguntas, que eram sobre a morte do pai e que ficou parecendo que sua mãe era suspeita de ter envenenado o marido.
O pai de Diego, Paulo Luiz dos Anjos, morreu em 3 de setembro, depois de consumir bananas e leite em pó entregues durante uma visita de Diego e Deise. A morte dele, no entanto, não foi investigada na época, já que a explicação seria intoxicação alimentar, sem envolver suspeitas. Agora, depois do episódio do bolo, o corpo foi exumado e a perícia encontrou arsênio no organismo dele. Deise passou a ser suspeita também desta morte.
Arsênio na farinha
O Instituto-Geral de Perícias (IGP) comprovou que a farinha usada no bolo continha arsênico e uma das vítimas apresentava concentração deste veneno em quantidade 350 vezes maior que a necessária para matar alguém. O bolo foi preparado em 23 de dezembro e quem o ingeriu manifestou crises de vômito, diarreia e sangramentos minutos após. Morreram em menos de 24 horas as irmãs Maida Berenice Flores da Silva, 59 anos, Neuza Denize Silva dos Anjos, 65 anos, e uma filha de Neuza, Tatiana, 47 anos. Ficaram intoxicadas a mulher que preparou o doce, Zeli dos Anjos e um neto de Neuza, com 10 anos de idade. Ambos já tiveram alta hospitalar.
Quem é Deise Moura dos Anjos
Deise é gestora financeira, formada pela Universidade La Salle. Seu último ofício foi como secretária-executiva de um escritório de advocacia, ocupação deixada em 2023, mesmo ano em que concluiu a graduação.
Aos 42 anos, já trabalhou como auxiliar de contabilidade e auxiliar administrativa em Canoas e em Nova Santa Rita, seu domicílio atual. Por conta do serviço de Diego, o casal morou também em Indaiatuba, no interior de São Paulo, e em Catalão (GO), onde viveu entre 2013 e 2017 com a mudança custeada pelos sogros de Deise. Diego é administrador de empresas, atua como gerente de projetos. Ela foi classificada como dissimulada e manipuladora pelos parentes do marido.
Deise está presa no Presídio Estadual Feminino de Torres e responde por suspeita de triplo homicídio duplamente qualificado por motivo fútil e com emprego de veneno e tripla tentativa de homicídio duplamente qualificada. No último dia 6 ela passou por audiência de custódia.