Em meio a tantas expectativas e planos motivados pela gestação, uma escolha importantíssima deve ocupar posição de prioridade para mães e pais: a busca por um pediatra, que pode começar inclusive antes da confirmação do teste positivo de gravidez.
Atualmente, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), entre outras entidades de referência, recomenda uma consulta pré-natal da gestante com esse médico no terceiro trimestre (a partir da 28ª semana). Como a procura pode tomar tempo, dependendo da agenda dos profissionais e também do nível de satisfação da família com o especialista que acompanhará o bebê, é bom começar a se organizar cedo. Trata-se de um momento para se conhecer, perguntar, saber um pouco da carreira do médico e, claro, refletir sobre essa primeira impressão.
— O pediatra já vai conhecer a mãe, analisar a criança em termos de aporte de vitaminas que está recebendo, como está a microbiota da mãe, que, por tabela, será a da criança. Ele vai analisar todo o contexto da gestação, se está tendo algum estresse tóxico nesse período ou não, que influencia bastante no desenvolvimento do bebê — explica Tadeu Fernando Fernandes, especialista em Pediatria e presidente do Departamento de Pediatria Ambulatorial da SBP.
Também será a hora de falar sobre outras questões essenciais, como o tipo de parto pretendido ou indicado e a amamentação, temas que costumam gerar dúvidas e ansiedade.
— O parto normal é a melhor opção, e a amamentação deve começar na primeira hora de vida — acrescenta Fernandes.
No caso do primogênito, esse momento se torna ainda mais importante, segundo Elsa Giugliani, médica do Serviço de Pediatria do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) e professora titular do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Considerando-se a rotina de múltiplas novidades que se instalará imediatamente após o nascimento, a pauta é imensa: uso de fraldas e lenços umedecidos, banho do bebê, sono.
— Mãe de primeira viagem é cheia de dúvidas — resume a pediatra.
Quanto a tipos de conduta e linhas de tratamento, Fernandes comenta que a pediatria contemporânea é “meio protocolar”, padronizada, baseada em consensos e diretrizes, sem grandes variações de um médico para outro.
— O que muda, realmente, é a atenção, a empatia que vai acontecer entre os familiares e o pediatra — diz o representante da SBP.
O representante da SBP inclui outros fatores, que podem parecer menores, mas que podem afetar diretamente o dia a dia, como a localização do consultório, especialmente para quem mora em grandes cidades e precisa enfrentar trânsito mais intenso. Considere a possibilidade de consultas de urgência: como você levará seu filho até lá? Qual é o tempo de deslocamento em horários de pico, por exemplo?
Pedir indicações de nomes a familiares e amigos pode ser um bom atalho para chegar a um grupo mais seleto de profissionais. Pergunte como são as consultas, a disponibilidade, o encaminhamento das questões mais comuns referentes ao desenvolvimento. Considere os variados perfis de mães e pais que estiverem envolvidos nessas sugestões — uma pessoa tranquila e outra ansiosa, por exemplo. Muito provavelmente, vocês lidarão de formas distintas em determinadas situações, e o médico que satisfaz uma família de um dado perfil pode não se encaixar com outra.
— Qual seria o melhor critério? Alguém que tenha conhecimento e esteja atualizado. Vemos condutas completamente ultrapassadas, coisas que estudei na faculdade há 30 anos... O ideal é considerar a parte técnica. Não adianta ser supersimpático se falha na parte técnica. Nós, profissionais, sabemos, mas para o leigo fica difícil. Ele saberá por meio de pessoas conhecidas: “Meu filho teve uma doença assim, o pediatra conduziu superbem”. Recomendações de médicos da família também são boas: “Minha mãe tem um cardiologista de confiança, vou perguntar se ele conhece algum pediatra”. As pessoas vão se informando e fazendo algum juízo — comenta a pediatra do HCPA.
Fernandes e Elsa chamam a atenção para um aspecto fundamental: redes sociais devem ser utilizadas com muita cautela. Pode-se ter fácil acesso a informações úteis — em um universo muito vulnerável a fake news, frise-se —, mas o número de seguidores de um perfil não é medidor de qualidade de desempenho. O fato de um médico ser influencer no Instagram não pode ser fator crucial para a escolha.
Se a vontade é que o pediatra esteja presente desde o nascimento, este já deve ser um ponto primordial no processo de decisão. Nem todo pediatra que realiza atendimento ambulatorial, de consultório, atua também em sala de parto. Muitos abandonam essa prática no decorrer da carreira, por motivos diversos, como ter mais controle sobre a agenda e preservar momentos de descanso e lazer. O neonatologista é especializado no atendimento ao recém-nascido, dentro do hospital, e capacitado para atender possíveis intercorrências, como paradas cardiorrespiratórias. Elsa chama a atenção para o aspecto da qualidade da assistência prestada nesse instante:
— O atendimento em sala de parto requer muita prática. Em caso de a criança necessitar de reanimação, e até 10% do total pode precisar de algum grau de reanimação, o médico precisa ter prática. Até por uma questão de segurança, os pediatras preferem que esse trabalho seja feito pelos neonatologistas. Com a rápida disseminação das informações, aparecem, dia a dia, novos conhecimentos, e o profissional precisa estar muito atualizado.
Após a alta, o bebê seguirá para o pediatra escolhido, que acompanhará o crescimento, a vacina e os demais cuidados, nas chamadas consultas de puericultura. A consulta inicial se dá na primeira semana de vida, principalmente se o pediatra não acompanhou o parto. Nesse período, podem aparecer muitas dificuldades na amamentação, e a mãe será orientada sobre como proceder. O médico verificará o peso do bebê (todos perdem peso quando nascem, mas há determinado tempo para recuperá-lo) e orientar o cuidado com o coto do umbigo, entre outros.
Considero ideal alguém que ouça, ouça muito. Tem profissional que mais fala do que ouve. Que seja empático, coloque-se no lugar. Saia do foco dele e entre no foco daquela família, daquela situação. Seja sensível. Tem que ter um ambiente agradável para a criança. A família tem que se sentir acolhida, não interessa em qual situação, e não ter medo de ser julgada. Tem mulher que não amamenta, está dando mamadeira, e até sonega essa informação por medo de julgamento.
ELSA GIUGLIANI
Médica pediatra
Depois disso, o ideal é voltar ao consultório no primeiro mês e, na sequência, mensalmente, até o sexto mês de vida. A relação vai se estabelecendo com o passar do tempo e as experiências compartilhadas.
— Considero ideal alguém que ouça, ouça muito. Tem profissional que mais fala do que ouve. Que seja empático, coloque-se no lugar. Saia do foco dele e entre no foco daquela família, daquela situação. Seja sensível. Tem que ter um ambiente agradável para a criança. Tem que querer conquistar aquela criança, que precisa se sentir bem. Às vezes, não tem jeito, temos que examinar, contê-la. A família tem que se sentir acolhida, não interessa em qual situação, e não ter medo de ser julgada. Tem mulher que não amamenta, está dando mamadeira, e até sonega essa informação por medo de julgamento — diz Elsa.
Não se sentir à vontade e desconfiar das orientações são elementos que podem motivar a troca de profissional.
— Se os pais começarem a duvidar e a querer segunda ou terceira opinião para tudo... É bom ter uma segunda opinião em casos mais graves, mas não em tudo. Conheço várias situações de mulheres que queriam muito amamentar e, quando tiveram dificuldades, não encontraram o apoio que desejavam no pediatra. Trocaram. Se não está preenchendo a expectativa, troque. É como um relacionamento qualquer: você entra esperando uma coisa e, ao longo do caminho, vê que as suas expectativas estão sendo frustradas — orienta Elsa.
Disponibilidade
Mãe pode mandar mensagem ou ligar para o pediatra a qualquer hora do dia ou de madrugada? Ele tem que responder imediatamente? Conversar com o profissional sobre a disponibilidade é essencial desde o primeiro contato.
Elsa Giugliani, médica do HCPA e professora da UFRGS, fala que os pai devem fazer uma espécie de acordo, questionando, objetivamente, como será a comunicação entre as duas partes após a chegada do bebê.
Há conversas por telefone ou mensagens de áudio que se estendem por tanto tempo que, na prática, acabam se assemelhando a uma consulta. Pergunte se o médico cobra por esse tipo de serviço e em quais horários dá retorno aos chamados. Se para você é fundamental ter alguém que responda rápido, inclusive após as 21h, incluindo finais de semana e feriados, essa pergunta não pode faltar.
É importante saber a quem ou a qual local recorrer quando o pediatra estiver ausente, em caso de férias ou outro motivo. Muitos profissionais deixam um colega no lugar e orientam que se busque uma unidade de pronto atendimento em determinadas situações.
— Se o bebê estiver com 39,5°, quase 40°C de febre, os pais devem saber a quem recorrer, imediatamente, se o médico estiver indisponível — exemplifica Elsa.
Busque informações em conselhos e sociedades
O Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers) pode informar o número do CRM do profissional (se o médico estiver inscrito neste conselho e, consequentemente, apto a trabalhar no Estado), a especialidade (se houver) e a situação em que se encontra (regular, falecido, cancelado, interditado etc.).
As informações podem ser acessadas no site, no app do Cremers para celular ou pelo telefone (51) 3300-5400, ramal 242.
O conselho também sugere que seja feita uma consulta junto à Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul (SBP-RS) — nem todo profissional integra entidades especializadas de sua área, mas vale verificar.
O Cremers e a SBP-RS recomendam que mães e pais optem por profissionais com Registro de Qualificação de Especialista (RQE) em pediatria. No site do Conselho Federal de Medicina, é possível saber se o médico tem registro em outros Estados, acessando a busca.