
A ocupação acentuada de leitos clínicos do SUS e de leitos de emergência em Porto Alegre é foco de conflito entre o governo do Estado e a prefeitura da Capital. Instada a atender pacientes provenientes da Região Metropolitana e do Interior, a prefeitura reclama da gestão estadual e cogita cortar serviços à população.
Nesta sexta-feira (14), o prefeito Sebastião Melo falou sobre esta possibilidade, caso o Estado não aumente aportes para a saúde da Capital, e disse que já alertou a secretária estadual da Saúde, Arita Bergmann, sobre a decisão:
— A dor não tem fronteiras, mas eu não tenho mais orçamento para bancar o Interior como estamos bancando hoje. Então nós vamos ter que cortar serviços. Não tem dinheiro, não tem como pagar a conta. Isso vai ter exposição no momento certo, porque ainda estamos em tratativas com o Estado, mas eu já comuniquei à secretária que haverá corte de serviço.
Atualmente, os leitos SUS têm ocupação superior aos 90% na Capital, enquanto as emergências estão com 204% de lotação, de acordo com o painel da Secretaria Municipal da Saúde (SMS).
Questionada sobre o tema, Arita ponderou que a Capital tem gestão plena da saúde e, por isso, é responsável por contratar os serviços prestados. Além disso, apontou que a Capital recebe incentivos do governo do Estado e do governo federal para atuar como referência a outros municípios.
— Quem contrata o serviço são os municípios, e nós não podemos limitar a circulação de pessoas de um território para outro. O SUS é universal — afirma a secretária.
Internamente, a prefeitura avalia que seria preciso ampliar em, no mínimo, R$ 20 milhões por mês o apoio estadual para desafogar os atendimentos.
Na quarta-feira, representantes dos dois entes se reuniram para tratar do tema e anunciaram que em 10 dias anunciarão providências. Até o momento, no entanto, o diálogo entre as partes não avançou.
Fatores múltiplos
As dificuldades no atendimento em Porto Alegre provocadas pela sobrecarga vinham ocorrendo nos últimos anos e se aprofundaram em 2025. A reportagem de GZH apurou que uma série de fatores contribui para esse quadro. Confira os principais abaixo.
Crise do entorno
Hospitais de municípios próximos, como Viamão, Alvorada e Cachoeirinha, sofreram problemas recentes de atendimento ou restrição de procedimentos. Além dessas dificuldades, há uma espécie de "crise de credibilidade", fazendo com que pacientes procurem diretamente hospitais da Capital. Em Canoas, o Hospital de Pronto-Socorro ainda não voltou a operar em sua sede, dificultando o acesso.
Contrarreferência
Técnicos da saúde da Capital apontam problemas no procedimento de contrarreferência, quando há encaminhamento do paciente para o município de origem após o atendimento. Houve 564 solicitações nos últimos seis meses e apenas 135 se efetivaram. SES nega problemas de gestão e diz que pacientes têm opção de permanecer em Porto Alegre.
Programa Assistir
A prefeitura também atribui parte do problema nos hospitais da Capital ao programa Assistir. A iniciativa redistribuiu os incentivos do Estado às instituições de saúde a partir de critérios técnicos, considerando os serviços prestados. Na prática, houve aumento de aporte a hospitais do Interior e redução para alguns da Grande Porto Alegre.
IPE Saúde
Hospitais de Porto Alegre têm recebido pacientes que não conseguiram marcar procedimentos pelo IPE Saúde, mesmo sendo adeptos do plano estadual.
Obras no clínicas
O fechamento da emergência do Hospital de Clínicas para obras, em janeiro e fevereiro, pressionou a demanda em outros hospitais da Capital. Os setores de atendimento a adultos e crianças foram afetados.