
Temporal, alagamentos e falta de energia elétrica. Este trinômio, infelizmente, foi incorporado ao cotidiano dos moradores de Porto Alegre. Depois da tragédia climática de maio, quando a cidade sucumbiu ao avanço da água, a Capital passou por pelo menos oito eventos de grande impacto. Em todos os eles, os mesmos problemas, mas explicações distintas para cada episódio.
Setembro chuvoso
Em setembro do ano passado, a cidade ainda cicatrizava as feridas da enchente quando foi atingida por uma sequência de temporais. No dia 13, uma sexta-feira, uma chuvarada no final da tarde provocou transtornos no trânsito, sobretudo na área central e Zona Sul.

"Volume excessivo"
O Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae) alegou que os alagamentos registrados durante o temporal da madrugada do dia 13 decorreram de chuva em excesso, e não de falta de limpeza da rede pluvial.
Na semana seguinte, a Capital voltou a ter ruas interrompidas por queda de árvores e vias bloqueadas por acúmulo de água. O feriado de 20 de setembro foi marcado por ruas alagadas e pessoas fora de casa. No dia 26, novo temporal. Desta vez, mais concentrado nas Zona Norte e Leste. Imagens traumáticas da enchente de maio vieram à tona.
O impacto do mau tempo, agravado por limitações no sistema de drenagem da Capital, fez submergirem vias fundamentais como Assis Brasil, Sertório, Voluntários da Pátria e Protásio Alves, e voltou a encher de água bairros afetados pela cheia de maio como Sarandi, Vila Farrapos e 4º Distrito.
"Sistema de drenagem é insuficiente"

O então diretor-adjunto do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae), Darcy Nunes, explicou que os alagamentos ocorreram em virtude do sistema de drenagem.
— O sistema de drenagem da cidade é insuficiente para chuvas maiores como essa. Mesmo com as casas de bombas funcionando, elas não conseguem ter capacidade suficiente para tirar a água da cidade e jogar no Guaíba ou no Rio Gravataí — explica Nunes.
Na avaliação do Dmae, o problema dos alagamentos registrados não passou por entupimentos, obstrução dos bueiros, redes quebradas ou necessidade de jateamento em algum ponto.

— É decorrente da insuficiência do sistema como um todo. E para (resolver) isso, (a cidade) precisa de obras vultosas e com recursos bastante altos. A gente fala que a macrodrenagem da cidade custa R$ 5 bilhões para ela funcionar dentro dos parâmetros. Esta é a realidade — detalha Nunes.
O professor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da UFRGS, Fernando Dornelles, atribuiu, na ocasião, os alagamentos ao entupimento da rede de escoamento da água da chuva.
Ciclone extratropical em outubro

Em outubro do ano passado, as rajadas de vento derrubaram pelo menos 37 árvores nas vias e casas de Porto Alegre durante a passagem de uma frente fria provocada pela formação de um ciclone extratropical entre o Uruguai e o Rio Grande do Sul.
Temporal em dezembro
Dezembro começou com uma série de transtornos. Depois de cerca de uma hora de chuva forte e vento intenso, Porto Alegre apresentava pontos sem energia elétrica e diversos registros de alagamentos. Bueiros jorraram água para fora e casas de bombas não funcionaram a pleno. Situação mais crítica foi registrada em pontos do 4º Distrito, do Centro Histórico e nos bairros Cidade Baixa e Menino Deus. A água invadiu as vias de pelo menos cinco bairros da cidade.

A região da Rodoviária registrou falta de energia e alagamentos. Além de quedas pontuais, houve relatos de falta de luz nos bairros Moinhos de Vento e Rio Branco.
Volume de chuva e falta de luz em casas de bombas
O Dmae atribuiu os alagamentos a dois pontos principais. O primeiro foi o volume de chuva em um curto período de tempo. O então diretor-geral do Dmae, Maurício Loss, informou, que 40 milímetros dos dos 49 milímetros de chuva registrados na passagem da instabilidade foram registrados entre 22h e 23h do dia 1º de dezembro.
O segundo ponto citado pelo gestor foi o problema de falta de luz em algumas casas de bombas. Sem energia via rede elétrica, as Estações de Bombeamento de Águas Pluviais (Ebaps) operam via geradores, o que limita o poder de vazão dos complexos, segundo Loss:

— Tivemos queda de energia, principalmente no 4º Distrito. Todas as estações de bombeamento do 4º Distrito ficaram sem energia, operando apenas por geradores, que operam de forma limitada. Nós não temos como disponibilizar geradores para todos os bombeamentos, então, operaram de maneira limitada, em torno de 50% de sua operação. E pelo grande volume de chuva, acabaram não dando vazão o suficiente — destacou Loss.
Troca no DMAE
O prefeito Sebastião Melo anunciou no dia 3 de dezembro, a troca no comando do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae). Deixou o cargo o atual diretor-geral, Mauricio Loss, que esteve à frente do departamento durante a enchente de maio, e assumiu o cargo o procurador Bruno Vanuzzi.
"Sem obras, vai continuar alagando"
Em entrevista a Zero Hora, no dia 31 de dezembro, o prefeito reeleito, Sebastião Melo, falou que sem obras de macro e microdrenagem, a cidade "vai continuar alagando".

O alerta se confirmou. No dia da posse, marcada para a Usina do Gasômetro, uma tempestade caiu sobre Porto Alegre, deixando ruas intransitáveis, galhos pelas vias, pessoas sem energia elétrica.

A chuva forte, acompanhada de vento e granizo em alguns pontos, que caiu no final da tarde alagou vias, provocou a queda de árvores e causou a interrupção do fornecimento de energia elétrica em vários bairros.
Entre as áreas mais afetadas pelo acúmulo de água em vias estavam Centro Histórico, Cidade Baixa, Bom Fim, Floresta e 4º Distrito.
A chuva foi mais da metade da média de chuva esperada para janeiro em apenas 24 horas. É o que diz o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). De acordo com o órgão, choveu 88 milímetros: a média do mês é de 144 milímetros. Temporal causou desabastecimento de energia em 115 mil imóveis.

Força do vento foi a principal causa da falta de luz
— Isso (chuva) representa quase 70% do que estava previsto para o mês. E veio seguida de vento. Teve pontos da cidade com até mais de 70 km/h de vento. E aí nós tivemos o arremesso de algumas árvores e de galhos sobre a rede elétrica. Foi o que causou a maior quantidade de desligamentos — observa Sergio Valinho, superintendente da Regional Norte da CEEE Equatorial.
CEEE Equatorial: investir na poda
Dois dias depois, em entrevista no Gaúcha Atualidade, Sergio Valinho disse que a empresa havia iniciado um plano para focar na poda dos vegetais. Segundo o superintendente, o projeto conta com 30 equipes, três vezes mais do que o previsto inicialmente, para dar conta da demanda em todo o Estado.
Outro ponto abordado por Valinho durante a entrevista foi o desabastecimento em unidades do Dmae.
O superintendente afirmou que o atendimento ao Dmae é priorizado pela concessionária e que existe um canal específico e direcionado ao departamento, disponível 24 horas por dia. Ele ressaltou que, em alguns casos, o dano na rede elétrica é grande e por isso o tempo de resposta é mais longo.
Cerimônia cancelada
A cerimônia teve que ser cancelada em razão da chuvarada. O prefeito ainda discursava na Câmara de Vereadores quando a chuva chegou.

No entorno da Usina, a pancada de chuva causou alagamento em diversas vias, inclusive na Avenida Presidente João Goulart, por onde se ingressaria para o local da cerimônia. Poucos metros adiante, na Rua dos Andradas, carros estacionados ficaram com água na altura da porta.
Em um salão amplo da Usina do Gasômetro, contíguo ao Teatro Elis Regina, diversas goteiras causaram acúmulo de água no chão.
Com a chuva e os alagamentos, ele foi até o Centro Integrado de Coordenação de Serviços da Cidade (Ceic) para avaliar os danos.
— Temos tido problemas. Ventania e chuva, falta luz em muitos lugares da cidade. E falta luz também para as casas de bombas, que ainda não tem a dupla alimentação (de energia) — afirmou Melo em entrevista à Rádio Gaúcha.
Geradores desligados
Não houve acionamento de geradores em todas as casas de bombas durante o temporal do dia 1º de janeiro. Como os equipamentos ainda não estão automatizados, era preciso fazer isso manualmente, o que não aconteceu em todas as estações de bombeamento.
"Não temos como garantir que não vai alagar"
Chuva intensa e com granizo alagou ruas e derrubou na tarde do dia 16 de janeiro. Estações de Tratamento de Água do Dmae ficaram sem energia. Pedras de gelo foram observadas no Centro Histórico e em bairros como Cidade Baixa, Azenha, Praia de Belas, Farroupilha, Bom Fim e Menino Deus.

No dia seguinte, o diretor interino do Dmae, Darcy Nunes, afirmou que o sistema de proteção contra alagamentos de Porto Alegre é projetado para suportar um determinado volume de chuva.
— Não temos como garantir que não vai alagar, o sistema é direcionado para um volume de chuva. Se a chuva passar desta quantidade, vai alagar — disse Nunes em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha.
O diretor afirmou que o acúmulo de água não foi ocasionado por entupimento dos bueiros, e sim por incapacidade do sistema.
— A gente não entende que esse (entupimento de bueiros) tenha sido o o motivo desses acúmulos de água e alguns alagamentos de ontem (quinta). A gente entende que é a infraestrutura que precisa melhorar como um todo — afirmou, destacando que mais de 400 quilômetros do sistema de esgoto já foram limpos e que trabalho deve ser concluído até o final de fevereiro.
Março termina com tempestade

No final da tarde do dia 31 de março, nuvens o avanço de uma frente fria potente e a atuação de um centro de baixa pressão, somados ao calor e à umidade resultaram numa chuvarada que afetou boa parte da Capital com alagamentos, bloqueio de vias, sinaleiras desligadas, falta de energia elétrica e de água.
O aeroporto Salgado Filho chegou a suspender pousos e decolagens entre as 17h e as 18h.
O temporal destelhou diversos imóveis. Na região das ilhas, até a subprefeitura teve o telhado arrancado.
"Falha pontual"
A água que avançou sobre ruas de bairros da região central de Porto Alegre, após o temporal que atingiu a cidade no fim da tarde de segunda-feira (31), é resultado de uma falha no sistema da casa de bombas 16, em decorrência da falta de energia elétrica, segundo o Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae).
Diretor-geral da autarquia, Bruno Vanuzzi explicou em entrevista à Rádio Gaúcha nesta terça-feira (1º) que o quadro que deveria acionar automaticamente os geradores de energia elétrica apresentou uma "falha pontual". Como consequência, o sistema não operou com 100% de capacidade e houve acúmulo de água em diversos pontos da região.

O que disse a CEEE Equatorial
A rede da CEEE Equatorial demorará de dois a três anos para ter uma condição "adequada". É o que estima o diretor-presidente da distribuidora de energia elétrica, Riberto Barbanera, em entrevista ao programa Timeline, da Rádio Gaúcha, na manhã desta terça-feira (1º). Ele pontuou ainda, que mesmo assim, não há garantia de que não haverá danos.
A justificativa, de acordo com Barbanera, é a falta de investimentos na empresa por mais de 20 anos, segundo ele, enquanto ainda estava sob controle estatal do governo do Rio Grande do Sul.
Pelo menos 117 mil clientes na área de concessão da CEEE Equatorial seguem sem energia elétrica após o temporal que atingiu o Rio Grande do Sul na tarde de segunda-feira (31). Logo após a intensa instabilidade, o Estado contabilizou 360 mil pontos sem energia elétrica – a maioria em Porto Alegre e Canoas.