Fortemente atingido pela cheia de maio de 2024, o Mercado Público de Porto Alegre se recuperou puxado por aqueles que fazem parte dele: clientes, funcionários e os mercadeiros, como são chamados os donos das bancas. Mesmo com o prédio quase um mês debaixo d'água, gerando perdas de estoque e de equipamentos, nenhum comerciante deixou o local. Pelo contrário. Pontos que estavam desocupados há mais de uma década no segundo piso, devido a um incêndio em 2013, estão recebendo novas operações de gastronomia.
Em um movimento que vem de anos, algumas bancas cresceram e expandiram suas operações para fora do Mercado Público e até tornaram-se indústrias. Porém, o centro comercial vive um novo momento. Agora, são as marcas de fora que querem estar nele.
No último leilão pela permissão de uso das lojas do Mercado, o Grupo Press, com restaurantes e cafeterias espalhados pela Capital, venceu a licitação para ocupar a maior loja do prédio histórico. São quatro portas no andar de baixo e mais quatro no andar de cima. Acompanhadas da marca, outras empresas mostraram interesse em estar no centro comercial, como a confeitaria Pradiê Bakery e o Woking Thai Food, de comida tailandesa — ambas já estão em obras.
O Di Toni, de massas, investiu R$ 300 mil em um espaço de 90 metros quadrados no segundo piso. O movimento representa a volta do negócio ao Centro Histórico. Já o Olga, especializado em comida caseira, abrirá em um ponto onde já funcionou uma cafeteria do Café do Mercado. O investimento é de R$ 180 mil em um espaço de 70 metros quadrados. A inauguração acontecerá na próxima semana. Entre os pratos servidos, terá carreteiro de charque, churrasco e vaca atolada.
No segundo piso

Jader Hack Gomes é sócio do Naval, restaurante de frutos do mar no Mercado Público e o segundo mais antigo de Porto Alegre. Conhecedor do local, o empresário é um dos que mais aposta nele. Recentemente, abriu dois restaurantes no segundo piso: um especializado em carnes e outro de culinária italiana. O investimento, somando as duas operações, passou de R$ 2 milhões.
O Rincón 74, de carnes feitas na parrilla, estava planejado para abrir em 2013, mas o incêndio que atingiu o segundo piso do Mercado adiou em 10 anos a sua reinauguração. Ele fica no lugar de um restaurante fundado em 1976, o antigo Restaurante Trensurb. Na época, o fogo consumiu um investimento de R$ 400 mil já feito na reforma. No período seguinte, a área ficou interditada pela prefeitura. Foi liberada em julho de 2022, permitindo a retomada da obra.
Pratos elaborados
Já o Osteria Del Mercato, também do empresário, nasceu através de uma parceria com Juliano Milan, que também é dono do Armazém da Redenção, no Mercado Bom Fim. Inaugurado recentemente, o restaurante tem foco na culinária italiana e já atrai um bom público, dizem os sócios. Servidores públicos, políticos e empresários não se importam de pagar mais para comer pratos mais elaborados. No cardápio, estão massas, risotos, carnes, pinsas romanas (pizzas quadradas com massa de fermentação natural) e sanduíches com focaccia.
— Muitos não sabem, mas o Centro tem um público com bom poder aquisitivo. A parrilla está indo muito bem, ultrapassou a nossa expectativa. O Osteria ainda é um restaurante novo, mas até julho acreditamos já ter alcançado o que foi projetado — diz Gomes.
Já os primeiros meses do Bistrô do Mercado, inaugurado em janeiro, foram difíceis. Carnaval, férias de verão e a onda de calor no Estado foram os fatores para um baixo movimento, avalia a sócia Débora Viera dos Santos. Agora, em março, a empresária sente alívio com a chegada de novos clientes.
— Foi um período para treinar funcionários, conhecer melhor o público. Depois do carnaval, deu uma boa melhorada. O Mercado estava vazio, as pessoas não vinham no Centro por causa do calor — conta.
O restaurante fica em um espaço de frente para o Terminal Parobé. São 100 metros quadrados, com capacidade para 50 pessoas na parte interna e outras 12 na parte externa. O investimento foi de R$ 300 mil. No local, são servidos cafés, almoços e lanches, com 13 opções de pratos no cardápio. Os destaques são o risoto de charque com moranga caramelada e a carne de panela com polenta mole e pétalas de cebola.

"Não é uma bolha"
Criado há 13 anos, o Baden, de cafés, também é um inquilino recente do Mercado Público. Chegou a poucos dias da enchente de maio, mas, por estar no segundo piso, teve um prejuízo menor do que o de quem estava no térreo. Mesmo fazendo parte da tragédia, o sócio Guert Schinke não se arrepende de estar no local. Ele dobrou a aposta quando arrematou a loja ao lado para expandir sua operação.
— Estar aqui é ótimo para a nossa marca. Sempre achei o Mercado muito legal, pessoalmente falando. Tem de tudo, todo o tipo de gente. Não é uma bolha. Esse primeiro ano foi bom, pessoas novas passaram a conhecer o nosso trabalho — diz Schinke, que toca o negócio com a esposa, Caroline Borges.
Com a ampliação do espaço no Mercado Público, Schinke pretende aumentar a equipe de funcionários e o número de lugares para atender clientes.
— Tem muita gente que vem para o Mercado e não olha para cima, pois tem muita informação lá embaixo. Pessoas vêm aqui e falam que não sabiam da existência do segundo andar. Agora, estão vindo mais marcas. Acho ótimo, nos dá mais visibilidade. As pessoas vêm aqui, depois vão lá. Um dia vai em um, em outro dia vai em outro. Tá tudo certo — completa Schinke.

Também pouco antes da enchente, chegou ao Mercado Público a Giallo Sanduicheria. No local, são servidos sanduíches com pão ciabata de fermentação natural. Os insumos que vão dentro são vendidos nas bancas do Mercado Público, como embutidos e queijos. O espaço é pequeno, comporta até 10 pessoas e opera com dois funcionários.
— É um privilegio estar aqui, o Mercado Público mais antigo do Brasil. Recebemos muitos turistas, mas o porto-alegrense frequenta bastante. Depois da enchente, o pessoal começou a vir para nos apoiar e acabou conhecendo. O pós-enchente (em questão de movimento) foi melhor do que antes para nós — diz o dono do negócio, Rafael Corte.
Mais novidades
Nos próximos meses, mais operações chegam ao segundo piso do Mercado Público. Elas preencherão outros espaços que estavam vazios desde o incêndio de 2013. Tem de pizzaria a culinária tailandesa. Procurados, nem todos os negócios quiseram detalhar sobre como ficarão as lojas.
Uma das operações mais aguardadas é a da cervejaria Mina Beer, de Ametista do Sul, no norte do Estado. A inauguração será no segundo semestre, em uma grande sala com vista para o Largo Glênio Peres. O investimento previsto é de R$ 1,5 milhão no projeto, que será temático. A ideia é que o cliente se sinta dentro de uma mina (veja nas imagens abaixo).
A marca surgiu em 2019, inspirada em uma mina na República Tcheca, e, desde então, já atraiu 500 mil visitantes ao subsolo de Ametista do Sul.
Sem querer dar detalhes, o Bar Chopp 26, que está desde 2010 no Mercado Público, terá mais uma operação no segundo piso. Será focada em "comida de boteco". Em frente ao estabelecimento, a Secretaria de Administração e Patrimônio de Porto Alegre prevê instalar novas mesas e cadeiras para atendimento dos clientes. A licitação para contratar a empresa será publicada nos próximos dias e também prevê divisórias e floreiras no segundo piso.
— Com este aumento no número de restaurantes, o espaço da praça de alimentação começou a lotar e encher de mesas e cadeiras. Os clientes acabam confundindo as áreas de cada restaurante. Hoje, cada um tem um tipo de mesa, além de outros equipamentos. Queremos eliminar isso para deixar padronizado. Ficará mais bonito e agradável para o frequentador — promete o diretor-geral de Gestão do Patrimônio de Porto Alegre, Tomás Holmer.
Já a sala da Associação do Comércio do Mercado Público Central (Ascomepc), que também fica no segundo piso, será transferida para outro ponto com menos fluxo de clientes. A ideia é desocupá-la para que, no futuro, o espaço entre em um novo leilão de concessão de uso.
— Quase um ano depois da enchente, vemos um mercado mais organizado, mais limpo, mais cheiroso e com mais portas abertas. Acreditamos que as velas do barco estão cada vez mais para cima. Agora, é esperar o vento bater a favor — diz o presidente da associação, Rafael Sartori, que também é sócio da Casa de Carnes Santo Ângelo.
Lojas abertas no segundo piso do Mercado Público:
- Armazém do Confeiteiro (sala de cursos)
- Associação de Artesãos Porto Alegre Solidária (artesanato)
- Ascomepc (sala da associação dos mercadeiros)
- Baden (café)
- Bar Chopp 26 (pratos feitos e petiscos)
- Bistrô do Mercado (comida caseira)
- Beijo Frio (sorveteria e cafeteria)
- Di Toni (massas)
- Giallo (sanduíches)
- Mamma Julia (ala minuta e peixes)
- Rincón 74 (carnes)
- Sayuri (sushi)
- Taberna 32 (pratos feitos e petiscos)
- Osteria Del Mercato (culinária italiana)
Operações que ainda serão abertas:
- Restaurante do Grupo Press (ainda em fase de projeto)
- Mina Beer (cervejaria)
- Woking Thai Food (culinária tailandesa)
- Olga (restaurante no primeiro piso)
- Pradiê Bakery (confeitaria no primeiro piso)