Grupo de moradores do bairro Sarandi bloqueou parcialmente, por cerca de duas horas, o quilômetro 89 da freeway, em Porto Alegre, neste começo de noite de sexta-feira (24). A manifestação, no sentido Litoral Norte, começou por volta das 18h e terminou pouco antes das 20h.
O ato chegou a impactar a freeway em até 10 quilômetros e a BR-116 em 2,5 quilômetros, em Canoas. No entanto, mesmo com a liberação da pista no sentido Litoral, o fluxo ainda iria levar tempo para voltar a fluir. O trecho bloqueado fica situado entre o entroncamento com a BR-116 e a Avenida Assis Brasil.
A manifestação, que fechou uma das quatro faixas neste sentido da rodovia, foi realizada por ao menos 50 moradores que serão afetados pelas obras de readequação do dique que protege o bairro de inundações.
Eles se queixam que o prazo de 60 dias dado pelo programa Compra Assistida, (do governo federal) para que escolham um novo imóvel é curto demais. E para sair provisoriamente, exigem que a moradia tenha as mesmas características daquele que está sendo desapropriado.
— Têm pessoas que moram na Rua Francisco de Medeiros que não tem como (achar casa) até o prazo que deram. Meu pátio é grande. Tenho cavalo, tenho galo. Onde vou largar meus bichos? — indaga Gabriela dos Santos Souza, 29 anos.
Carmen Silva de Góes, 39 anos, moradora da Rua Aderbal Rocha de Fraga, diz que a casa dela será uma das primeiras que serão removidas a partir de 28 fevereiro. Carmen relata que tem dificuldade em encontrar um imóvel e que apartamento não serve para a família:
— Eles querem dar apartamento. Mas eu tenho minha filha cadeirante. Adaptei toda a casa pra ela. Mas quero a casa para que eu possa adaptar pra ela. Meu marido trabalha com construção. Ele tem betoneira, tem carrinho de mão, tem coisas de construção. Onde é que a gente vai guardar o material?
Conforme o líder comunitário Edgar Fernandes, moradores se reuniram com a prefeitura e com o governo federal recentemente para tentar apressar o andamento do Compra Assistida. Agora, eles devem ser reunir também com o Ministério Público Federal (MPF) com o mesmo propósito.
— A gente não aceita sair sem estar com a chave não. Nada de aluguel. Nós vamos lutar até o fim para ter a chave na mão, para ter nossa moradia — ressaltou.
A Polícia Rodoviária Federal (PRF) acompanhou a situação do bloqueio de trânsito causada pela manifestação.
Prefeitura diz que está negociando com moradores
A reportagem de Zero Hora contatou a prefeitura de Porto Alegre para entender como está o processo de garantia de moradia aos afetados pela obra de melhoramento do dique do Sarandi.
Conforme o diretor-geral do Departamento Municipal de Habitação (Demhab), André Machado, equipes da vêm acompanhando e esclarecendo os moradores da região sobre o avanço das obras, assim como da desocupação dos pontos necessários para a ampliação da barreira protetora da cidade.
Entre as ações mais recentes do Demhab nesse sentido estão, conforme Machado, a entrega de uma carta a 57 famílias, na terça-feira (21), oficializando que elas precisam deixar suas residências até 28 de fevereiro.
No dia seguinte à entrega da carta, na quarta-feira, uma reunião foi feita com as lideranças comunitárias, moradores, representantes do Demhab, do governo federal e da Caixa Econômica Federal. Na ocasião, a comunidade pode solicitar mudanças no programa no sentido de agilizar o processo de aquisição de um imóvel.
Também foram pedidas mudanças para contemplar as necessidades dos afetados pela obra, como um aumento no valor nos imóveis que podem ser adquiridos pelo Compra Assistida.
Os pedidos foram detalhados em um ofício, que deve ser remetido pela prefeitura ao governo federal na próxima semana.
— Em Porto Alegre, no total, já mandamos 4,7 mil famílias para o governo federal. Dessas 57 famílias, 31 estão habilitadas para o Compra Assistida. Até terça-feira, nenhuma tinha encaminhado o pedido de compra da sua casa — disse o diretor.
Conforme o representante do departamento de habitação da Capital, além do programa de aquisição de um imóvel, foi ofertado aos moradores do Sarandi o benefício de Estadia Solidária. Esse auxílio oferta R$ 1 mil mensalmente para que os afetados possam residir em outro lugar. Contudo, segundo Machado, não houve adesão da comunidade.
— Ninguém quis que isso acontecesse. Esse movimento foi necessário a partir da tragédia que nós vivemos no mês de maio. Para que não haja uma nova tragédia, as obras precisam ocorrer para proteger toda aquela região — justifica o diretor-geral.
Sobre os moradores da Rua Francisco de Medeiros, Machado afirma que a obra demorará para chegar a esta região. Portanto, segundo o diretor do Demhab, a moradora tem mais tempo para procurar o imóvel certo.
O programa
A demanda pela entrega de novas casas às famílias que perderam suas moradias durante a enchente é uma das mais urgentes atualmente no Estado.
Ainda no final de maio, o governo federal prometeu entregar casas novas a todas as famílias das faixas 1 e 2 do Minha Casa, Minha Vida, com renda de até R$ 4,7 mil, que perderam suas moradias durante a enchente. Uma das ações desenvolvidas para cumprir essa promessa é justamente a compra assistida de residências e o posterior repasse das propriedades a essas famílias. Esta é a primeira vez na história do programa que imóveis já prontos são entregues aos beneficiários.
Nesta modalidade de compra assistida, os imóveis que serão adquiridos e repassados têm um limite de preço de R$ 200 mil e não podem estar localizados em zona alagável. Além das unidades habitacionais já cadastradas no portal Caixa, cerca de 6,4 mil, o beneficiário também poderá optar pela vinculação direta, com negociação de imóveis não cadastrados no portal.
Etapas do processo:
- Emissão de laudos das casas em áreas atingidas pela enchente
- Análise da condição das casas
- Análise da situação das famílias e avaliação dos critérios do programa
- Aprovação e escolha dos imóveis por parte das famílias
- Compra do imóvel
- Envio de documentação e registro do imóvel feito em cartório
- Assinatura do contrato e entrega de chaves
As tarefas de cada um:
- Prefeitura: cadastrar um CPF de cada casa destruída pela enchente e fazer o laudo comprovando que a casa foi destruída pela cheia (etapa 1)
- Governo federal: verificar os cadastros e passar os nomes para a Caixa (etapas 2 e 3)
- Caixa: publicar os nomes dos habilitados e atendê-los para que escolham a casa que querem morar (etapas 4, 5 e 7)