Quanto vale um Fiat Uno 1987? Para o ferroviário Vladimir Vieira da Silva, 55 anos, muito mais do que os cerca de R$ 3 mil estimados pela tabela Fipe, métrica de avaliação dos automóveis usados no Brasil. Com luzes e vagões, o carro foi adaptado para funcionar como um trem do Papai Noel - versão estendida e motorizada do famoso trenó de renas.
A iniciativa é chamada de “Projeto Bianca”, homenagem à neta do ferroviário. A menina, de 8 anos de idade, ficou triste pelo impacto da pandemia nas famílias mais pobres.
– Com essa pandemia, muita criança não vai receber nada, porque os pais não estão trabalhando - disse a garota ao avô.
A adaptação durou três meses. O primeiro passeio ocorreu na noite desta terça-feira (22), na Vila dos Ferroviários, bairro Humaitá, zona norte de Porto Alegre. E teve o bom velhinho a bordo de uma das carruagens.
– As pessoas choravam de emoção vendo o trem passar - relembra Silva.
Atualmente, o avô de Bianca é empresário, mas entre as décadas de 1980 e 1990 trabalhou na manutenção de trilhos. Para atender ao desejo da menina, e relembrar da época em que convivia com os trens, comprou o veículo de passeio e pediu ajuda a parceiros da empresa Sicla Equipamentos. A indústria, com experiência em corte e solda de metais, ofereceu mão de obra gratuita para a transformação do automóvel, segundo o dono do empreendimento, Elton Dias.
Para o soldador Alessandro Evangelista Fagundes, 38 anos, foi a primeira mudança desse tipo em um automóvel.
– Estou acostumado a soldar e adaptar veículos, mas assim é especial. Vai levar muita felicidade para as crianças. Um pequeno gesto, que se torna algo valioso neste momento de pandemia - afirma o funcionário.
Sobre o chassi foi montada a locomotiva, com chaminé e um sino ativado de dentro da cabine. A fumaça é simulada pela mistura de água com sabão de glicerina.
O painel analógico do Fiat Uno, com hodômetro e velocímetro foi recortado e afixado a estrutura dianteira, de aço. Setas, botões de pisca-alerta, os pedais de freio, embreagem e acelerador também foram soldados à nova base para movimentar o motor de 1.300 cilindradas. O farol redondo, extraído de uma moto, foi grudado ao “nariz” do trem, sobre o limpa-trilhos.
Uma corneta de navio, sobre o teto de madeira, atrai a atenção com um estrondo. Caixas de som ecoam canções tradicionais desta época do ano.
A primeira viagem contou com Bianca, que percorreu o trajeto com um sorriso constante, de acordo com o avô. Não havia, contudo, presentes a serem distribuídos: o grupo investiu na montagem do trem e ficou sem doações a serem entregues.
Na manhã desta quarta-feira (23), após ter a história contada na Rádio Gaúcha, a realidade começou a mudar.
– Eu estava levando um passageiro e ouvi no programa do Macedo. Como eu tinha brinquedos do meu filho no porta-malas, resolvi trazer. Meu filho sabe que, a cada brinquedo que ele ganha, tem que doar dois - contou o motorista de aplicativos Carlos Aguirre, 34 anos, ao entregar carrinhos e outros brinquedos.
Por telefone, o voluntário de uma associação beneficente de Canoas ofereceu 500 brinquedos, reunidos para doação.
Silva ainda precisa de brinquedos e doces para distribuir nas ruas da Região Metropolitana. Quem quiser ajudar, pode combinar com ele pelo WhatsApp (51) 9-9972-3658.