A conversa entre o prefeito da Capital, José Fortunati, e o diretor do Uber no Brasil, Daniel Mangabeira, começou tensa nesta sexta-feira. Por telefone, o prefeito demonstrou estar chateado com a postura da empresa de começar a operar em Porto Alegre sem avisá-lo e deixou claro que nenhuma proposta de regulamentação avança "se não for sério".
Por outro lado, o empresário ficou preocupado com a agressão sofrida na última quinta-feira por um de seus motoristas, que foi espancado por taxistas no estacionamento do Carrefour no bairro Partenon, e procurou o Executivo para voltar às negociações, interrompidas desde que os carros começaram a circular no dia 19 de novembro. Ambos desligaram o telefone mais calmos e dispostos a buscar um consenso.
Fortunati disse, em entrevista nesta sexta-feira a Zero Hora, que ainda não há uma proposta de regulamentação por parte da prefeitura. Segundo ele, é a hora de ouvir as ideias do Uber antes de tomar qualquer atitude. Ele afirmou, porém, que o serviço não será autorizado "sem que minimamente tenha contribuição para a cidade". Fortunati falou ainda que não está preocupado com o projeto de proibição do Uber, aprovado pela Câmara de Vereadores na quarta-feira, e que seu foco é fazer com que qualquer empresa - seja de tecnologia ou não - respeite regras que beneficiem os moradores de Porto Alegre. Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista.
O senhor foi surpreendido com a atitude do Uber de começar a operar sem comunicá-lo?
No início de setembro, tivemos um grande seminário sobre mobilidade urbana no Rio de Janeiro e dialogamos diretamente com o Mangabeira. Falamos que iríamos discutir (a chegada do Uber). Mas, para a surpresa de todo mundo, houve o rompimento por parte deles. Tínhamos uma pré-disposição de que nos fosse apresentada uma proposta de regulamentação. Se é para voltarmos a sentar, vamos buscar algo que seja sólido e regulamente o setor.
O senhor ficou chateado com a postura da empresa?
Sim. Havia uma expectativa muito grande da minha parte. Todo mundo ficou chateado, porque através do diálogo poderíamos construir uma solução. Me pegou de surpresa. O que precisamos, a partir de segunda, é estabelecer: a negociação será para valer? Vamos fazer um trabalho conjunto ou não? Não vou avançar nada se não for sério. Ele (Mangabeira) me garantiu por telefone que existe a disposição (de negociar). Vamos voltar a sentar com a Câmara de Vereadores, universidades, WRI (ONG que trabalha no desenvolvimento de cidades) e universidades para que no curto prazo de tempo possamos ter uma proposta.
O que precisa para que o Uber funcione tranquilamente em Porto Alegre?
O Uber, obviamente, é a força mais expressiva hoje (no ramo), mas estou preocupado em normatizar o transporte individual em Porto Alegre. Não quero colocar amarras, apenas seguir as regras que dão segurança para os cidadãos e à cidade como um todo. Eu disse ao Mangabeira que é inadmissível retirar recursos de Porto Alegre sem que minimamente tenha contribuição para a cidade. Sou obrigado a fazer manutenção das vias, conservar sinaleiras e fazer todo o serviço para que eles tenham mobilidade. Ele me disse que tem experiência em várias cidades. Vamos sentar e buscar formas possíveis.
A agressão ocorrida na quinta-feira acelerou o processo?
Mais dia, menos dia, teríamos que sentar para conversar. O incidente acabou precipitando porque ele tomou a iniciativa de me ligar. Apressou aquilo que era uma necessidade.
O senhor pretende sancionar a lei aprovada pela Câmara de proibição do Uber?
Já temos uma legislação que não permite que esse tipo de transporte funcione em Porto Alegre. O que a Câmara aprovou é redundante. Não estou preocupado com o projeto, e sim em buscar uma solução antes de tomar qualquer atitude.
O senhor disse que "o Uber achou que Porto Alegre era terra de ninguém" e foi criticado. Se arrepende da declaração?
Porto Alegre é uma terra que cumpre as leis, é um Estado democrático de Direito. O pessoal interpretou de outra forma. Temos um respeito muito forte ao Estado democrático de Direito, isso tem de ficar claro. Incidentes como o de ontem acontece em qualquer país do mundo, a violência foge às regras, e o Estado está aí para punir. O Uber não pode imaginar que essa terra é uma terra de ninguém. Vamos tentar, dentro do possível, fazer com que as regras sejam cumpridas. O pessoal tentou distorcer o que eu disse. Há leis, e para o Uber funcionar em Porto Alegre terá de seguir as leis.
Pontapés, socos e ameaças
No final da tarde de quinta-feira, o motorista do Uber Bráulio Pelegrini Escobar, 40 anos, levou socos e pontapés por cerca de dez minutos até ser socorrido por testemunhas (veja o vídeo abaixo). Ele foi levado ao Hospital Cristo Redentor, onde fez exames e recebeu alta por volta das 23h.
Dois taxistas foram presos em flagrante e encaminhados para a 2ª Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA) de Porto Alegre. Cauê Cavalheiro Varella e Alexandro dos Santos Scheffer prestaram depoimento e foram reconhecidos pela vítima no Palácio da Polícia.
Já na madrugada desta sexta-feira, os dois foram encaminhados ao Presídio Central. De acordo com a delegada plantonista, Cristiane Ramos, eles vão responder por tentativa de homicídio e dano qualificado. O inquérito deve ser encaminhado à 1ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).
Pouco antes da meia-noite, o motorista agredido, chegou ao Palácio da Polícia para prestar depoimento. Ele disse ter sido vítima de uma emboscada. O motorista contou que ficou quase uma hora circulando com os agressores pela cidade.
- Ele (um dos agressores) se passou por passageiro, me fez circular por várias partes da cidade até me levar ao supermercado, onde houve a agressão. Tentaram me parar em blitz para meu carro ser apreendido. Tentaram me levar para o Campo da Tuca, mas desistiram porque eu comecei a não obedecer mais - relatou.
- Foram em torno de dez pessoas contra mim. Fiquei preso dentro do carro, não conseguia me mover. Sofri agressão de todos os lados. Foi uma emboscada, com certeza - acrescentou Escobar.
* Zero Hora