
Deflagrada pela Polícia Federal (PF) e pela Controladoria-Geral da União (CGU) na última semana, a operação Sem Desconto revelou um esquema fraudulento no Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) que descontou cerca de R$ 7,99 bilhões em benefícios de aposentados e pensionistas entre 2019 e 2024. A fraude envolveu funcionários, diretores e ao menos 11 entidades associativas.
O inquérito aponta que ex-diretores do INSS e pessoas próximas a eles receberam mais de R$ 17 milhões em transferências oriundas de suspeitos de intermediar o contato com as associações, apurou o jornal O Globo.
Um dos beneficiados pelo esquema seria Virgílio Oliveira Filho, procurador do INSS, que teria recebido R$ 11.997.602,70. O ex-diretor, afastado do cargo pela Justiça no dia da operação, recebeu um carro de luxo avaliado em R$ 500 mil, que foi transferido à esposa dele.
Outro membro do instituto envolvido no esquema é André Paulo Félix, ex-diretor de Benefícios e Relacionamento com o Cidadão, que teria recebido R$ 5,1 milhões por meio de empresas em seu nome ou de pessoas próximas. André Guimarães, ex-diretor de Governança, Planejamento e Inovação do INSS, é suspeito de receber R$ 313 mil em suas contas pessoais e empresas.
Careca do INSS
Conhecido como "Careca do INSS", Antonio Carlos Camilo Antunes seria o responsável pela operação das empresas intermediárias. A investigação da PF aponta que ele movimento R$ 53,5 milhões oriundos de entidades sindicadas e empresas ligadas às entidades associativas.
Conforme o jornal O Globo, R$ 48,1 milhões seriam do caixa das associações e R$ 5,4 milhões das intermediárias. Antunes declarou renda mensal de R$ 24.458,23, mas as suas contas apresentam movimentações "muitos superiores à sua hipotética renda", segundo a PF.
"Antônio Carlos realizava repasses no mesmo dia do recebimento, mantendo saldo pouco significativo disponível em conta, indicando possível urgência em dificultar o rastreamento dos valores", explica trecho do documento da PF.
Como funcionava o esquema
Segurados podiam ter descontada uma mensalidade por entidades que representam aposentados e pensionistas conveniados com o INSS em troca de benefícios como auxílios funerários, odontológicos e psicológicos, colônias de férias, academia e consultoria jurídica. Isso ocorria de forma regular, desde que o beneficiário estivesse de acordo e a conveniada agisse conforme a lei.
No entanto, alguns aposentados e pensionistas do INSS tinham descontos mensais indevidos. O valor seria cobrado como se eles fossem membros regulares de associações de aposentados e estivessem cientes dessas retiradas de valores. No entanto, eles não haviam se associado nem autorizado esses descontos.
O esquema era amplo e envolvia corretores, associações de aposentados e o vazamento de informações pessoais de segurados. A prática fraudulenta foi detalhada em série de reportagens do Grupo de Investigação da RBS (GDI).
Polêmicas com Lupi

O ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, já havia sido alertado em 2023 sobre o aumento de descontos não autorizados em aposentadorias, mas levou quase um ano para tomar providências. É o que mostram atas de reuniões obtidas pelo Jornal Nacional e divulgadas no sábado (26).
Em entrevista ao Estadão no domingo (27), Lupi afirmou que determinou uma apuração:
— Não me omiti, procurei agir.
A recente fraude no INSS não é a primeira polêmica em que Lupi se envolve. Ele esteve no centro de outros escândalos durante o governo Dilma Rousseff.
Então ministro do Trabalho, Lupi renunciou ao cargo no final de 2011 após ter o nome ligado a denúncias de corrupção. Os indícios apontavam que assessores dele cobravam propina para atender demandas apresentadas por algumas ONGs.
Conforme O Globo, apenas em Sergipe haviam 20 inquéritos sobre desvios em convênios firmados com ONGs, que foram contempladas com R$ 11 milhões em parcerias com o Ministério do Trabalho.
— Estou no vespeiro. Vou na luta até o fim. Descarto totalmente a renúncia. Morro, mas não jogo a toalha. Alguns nascem para se acovardar. Outros, para lutar. É o meu caso — disse antes de decidir renunciar.
Antes, em 2009, Lupi viajou em jato particular que foi custeado por uma empresa que obteve contratos com o Ministério do Trabalho posteriormente. Na época, o então ministro da pasta também ocupava o cargo de de assessor do PDT na Câmara dos Deputados, em Brasília, de maneira ilegal, conforme a revista IstoÉ.
Apesar de negar todas as acusações na época, Lupi renunciou ao cargo e declarou perseguição política:
— Tendo em vista a perseguição política e pessoal da mídia que venho sofrendo há dois meses, levando em conta a divulgação do parecer da Comissão de Ética, (…) decidi pedir demissão do cargo, em caráter irrevogável.