A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista do 8 de Janeiro aprovou, nesta quarta-feira (18), o relatório que propõe o indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outras 60 pessoas pelos atentados antidemocráticos que danificaram as sedes dos três poderes em Brasília (veja lista abaixo). Foram 20 votos favoráveis e 11 contrários.
Após cinco meses de trabalhos, o relatório final foi apresentado pela senadora Eliziane Gama (PSD-MA) na sessão da terça-feira (17). O documento, segundo Eliziane, é baseado nos depoimentos e nas centenas de documentos que chegaram à CPI. Com isso, chega ao fim a CPI.
Na sessão, governistas endossaram o documento elaborado pela relatora e a oposição criticou as propostas de indiciamento, desacreditando a possibilidade de as acusações serem investigadas de forma mais profunda.
O indiciamento proposto pela CPI é simbólico, porque funciona na prática como uma sugestão para que o Ministério Público e a Polícia Federal, municiadas dos documentos obtidos pelo colegiado, deem continuidade às investigações e proponham, se convencidas de que houve crime, ações penais perante a Justiça.
O relatório sugere indiciamentos por 26 tipos de delitos. Além de Bolsonaro, estão entre os pedidos de indiciamento os ex-ministros general Augusto Heleno, general Walter Braga Netto e Anderson Torres.
Para Bolsonaro, estão elencados quatro crimes, cujas penas máximas, somadas, chegam a 29 anos de prisão. O relatório o acusa de associação criminosa, violência política, abolição violenta do Estado democrático de direito e golpe de Estado.
No relatório, o ex-presidente é apontado como "mentor intelectual" dos ataques. A relatora Eliziane Gama afirma que os atos golpistas foram um "ataque desesperado" depois de um "golpe ensaiado" por Bolsonaro. Depois de ser derrotado nas urnas, ele teria se reunido com comandantes da Marinha, da Aeronáutica e do Exército munido de uma minuta, para avaliar a possibilidade de um golpe de Estado, mas não obteve apoio.
"O 8 de janeiro é obra do que chamamos de bolsonarismo. Não foi um movimento espontâneo ou desorganizado. Foi uma mobilização idealizada, planejada e preparada com antecedência. Os executores foram insuflados e arregimentados por instigadores que definiram de forma coordenada datas, percurso e estratégia de enfrentamento e ocupação dos espaços", afirmou Eliziane Gama.
A oposição gritou, ao final da sessão: "Vergonha, vergonha". Entre as críticas apresentadas, está o fato de não ter sido pedido o indiciamento, por omissão, do ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), do general Gonçalves Dias, do ministro da Justiça, Flávio Dino, do ex-diretor adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Saulo Moura, e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Bolsonaro disse, em nota, que a proposta de indiciamento é “parcial, tendenciosa e totalmente pavimentada por viés político e não jurídico”.
Confira o relatório final na íntegra:
Parlamentares divergiram sobre o relatório
Durante a discussão do relatório de Eliziane, parlamentares governistas e da oposição divergiram sobre os pedido de indiciamento feitos pela relatora. Governista, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) parabenizou a senadora por propor que Bolsonaro continue sendo investigado pelos órgãos competentes.
— O seu relatório não é um complemento das investigações, ele é protagonista de muitos dados e de muitas investigações não só nas milícias digitais, nos golpistas e no indiciamento principal que é do principal mentor da tese golpista no Brasil, que é o senhor Jair Bolsonaro — afirmou Feghali.
Já os oposicionistas dedicaram os seus discursos para descreditar o texto de Eliziane. A sessão foi interrompida por dois minutos após o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) afirmar que a relatora produziu um parecer parcial para agradar ao presidente da República:
— É um fantoche a serviço do Lula. Então, esse relatório não passa de água de salsicha, porque não serve para porcaria nenhuma.
Eliziane diz que está sendo ameaçada de morte
Em um último discurso antes da votação, Eliziane afirmou que está recebendo ameaças de morte em seu telefone pessoal. A relatora disse que irá encaminhar as mensagens recebidas para a Polícia Federal, e pedirá um reforço de segurança para ela e os seus familiares ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
— Quando eles (parlamentares da oposição) fazem o discurso de ódio, na rede social, são as informações mais absurdas possíveis Agressão, ameaça de morte à minha família, dizendo que estão me esperando em aeroportos, de que eu não posso mais sair na rua porque vão me atacar — afirmou.
Zambelli cita frase pornográfica e é repreendida
Outro nome na lista de pedidos de indiciamento é o da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), que é acusada de ter feito postagens questionando a confiabilidade do sistema eleitoral brasileiro e intermediado uma reunião entre Bolsonaro e o hacker Walter Delgatti Neto. O encontro seria para demonstrar supostas "fraudes" das urnas eletrônicas. Mesmo não sendo integrante do colegiado, Zambelli se defendeu durante a sessão.
Após ser citada no discurso do deputado Pastor Henrique Vieira (PSOL), que listou as acusações contra Zambelli, o presidente da CPI, Arthur Maia (União-BA), concedeu direito de resposta à parlamentar. Zambelli citou um comentário que teria recebido em suas redes sociais após ser citada no relatório final, com teor pornográfico: "Tchau, pistoleira. Vai para a cadeia m... a r... do teu presidente genocida".
O presidente da CPI pediu que a frase fosse retirada das notas taquigráficas da sessão:
— Isso aqui não é lugar de se falar pornografia. A senhora, por favor, contenha a sua fala e respeite esse ambiente. Eu quero dizer que todos nós que somos pessoas públicas e que temos redes sociais estamos sujeitos a sermos ofendidos. Isso não nos dá o direito de vir para cá, para um ambiente de uma CPI transmitida em rede nacional de televisão, e falar palavras de baixo calão.
Zambelli também afirmou que o pedido de indiciamento feito por Eliziane seria para ela uma premiação:
— (O parecer) não anexou uma prova contra mim, apenas palavras contra mim, isso é uma medalha no meu peito. Vindo de vocês, é só mais uma medalha que eu vou carregar, de honestidade — disse.
Veja a lista de pedidos de indiciamentos
- Jair Messias Bolsonaro, ex-presidente da República
- Walter Souza Braga Netto, general da reserva do Exército, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil e vice na chapa de Jair Bolsonaro nas eleições de 2022
- Augusto Heleno Ribeiro Pereira, general da reserva do Exército e ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI)
- Mauro Cesar Barbosa Cid, tenente-coronel do Exército e ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro
- Anderson Gustavo Torres, ex-ministro da Justiça e Segurança Pública
- Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF)
- Carla Zambelli Salgado de Oliveira, deputada federal (PL-SP)
- Marcelo Câmara, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro
- Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira, general do Exército e ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República
- Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, general do Exército e ex-ministro da Defesa
- Almir Garnier Santos, almirante e ex-comandante da Marinha
- Marco Antônio Freire Gomes, general e ex-comandante do Exército
- Luís Marcos dos Reis, sargento do Exército e ex-assessor de Bolsonaro
- Filipe Garcia Martins Pereira, ex-assessor especial da Presidência da República
- George Washington de Oliveira Sousa, bolsonarista preso pela tentativa de atentado à bomba no Aeroporto de Brasília
- Alan Diego dos Santos Rodrigues, bolsonarista preso pela tentativa de atentado à bomba no Aeroporto de Brasília
- Wellington Macedo de Souza, bolsonarista preso pela tentativa de atentado à bomba no Aeroporto de Brasília
- Ailton Gonçalves Moraes Barros, capitão reformado do Exército
- Antônio Elcio Franco Filho, coronel do Exército e ex-secretário executivo do Ministério da Saúde
- Jean Lawand Júnior, coronel do Exército
- Marília Ferreira de Alencar, subsecretária de inteligência da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal
- Carlos José Russo Assumpção Penteado, general do Exército e ex-secretário-executivo do GSI
- Carlos Feitosa Rodrigues, general de Exército e ex-chefe da Secretaria de Coordenação e Segurança Presidencial do GSI
- Wanderli Baptista da Silva Junior, coronel do Exército e ex-diretor-adjunto do Departamento de Segurança Presidencial do GSI
- André Luiz Furtado Garcia, coronel do Exército e ex-coordenador-geral de Segurança de Instalações do GSI
- Alex Marcos Barbosa Santos, tenente-coronel do Exército e ex-coordenador-adjunto da Coordenação Geral de Segurança de Instalações;
- José Eduardo Natale de Paula Pereira, major do Exército e ex-integrante da Coordenaria de Segurança de Instalações do GSI
- Laércio da Costa Júnior, sargento do Exército e então encarregado de segurança de instalações do GSI
- Alexandre Santos de Amorim, coronel do Exército e ex-coordenador-geral de Análise de Risco do GSI
- Jader Silva Santos, tenente-coronel da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) e ex-subchefe da Coordenadoria de Análise de Risco do GSI.
- Fábio Augusto Vieira, ex-comandante-geral da PMDF
- Klepter Rosa Gonçalves, ex-comandante-geral da PMDF
- Jorge Eduardo Barreto Naime, ex-chefe do Departamento Operacional da PMDF
- Paulo José Ferreira de Sousa Bezerra, integrante do Departamento Operacional da PMF
- Marcelo Casimiro Vasconcelos Rodrigues, ex-comandante do 1º Comando de Policiamento Regional da PMDF
- Flávio Silvestre de Alencar, major da PMDF
- Rafael Pereira Martins, major da PMDF
- Tércio Arnaud Tomaz, ex-assessor de Bolsonaro
- Fernando Nascimento Pessoa, ex-assessor de Bolsonaro
- José Matheus Sales Gomes, ex-assessor de Bolsonaro
- Alexandre Carlos de Souza e Silva, policial rodoviário federal
- Marcelo de Ávila, policial rodoviário federal
- Maurício Junot, sócio de empresas que teriam ligações contratuais com a PRF
- Ridauto Lúcio Fernandes, general da reserva do Exército
- Meyer Nigri, empresário
- Adauto Lúcio de Mesquita, empresário
- Joveci Xavier de Andrade, empresário
- Mauriro Soares de Jesus, sócio da USA Brasil
- Ricardo Pereira Cunha, sócio da USA Brasil
- Enric Juvenal da Costa Laureano, consultor da Associação Nacional do Ouro (ANORO)
- Antônio Galvan, empresário
- Jeferson da Rocha, empresário
- Vitor Geraldo Gaiardo, empresário
- Humberto Falcão, empresário
- Luciano Jayme Guimarães, empresário
- José Alípio Fernandes da Silveira, empresário
- Valdir Edemar Fries, empresário
- Júlio Augusto Gomes Nunes, empresário
- Joel Ragagnin, empresário
- Lucas Costa Beber, empresário
- Alan Julian, empresário