Integrantes do Congresso Nacional se movimentam para questionar o governo Jair Bolsonaro sobre o envio de agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) à Conferência do Clima das Nações Unidas (COP-25) em dezembro do ano passado, revelado pelo Estadão.
Deputados criticam o Executivo por ter monitorado organizações não governamentais (ONGs), integrantes da comitiva brasileira e representantes de delegações estrangeiras, conforme trouxe a reportagem. O assunto deve ser discutido pela Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência, formada por deputados e senadores.
O colegiado foi o mesmo que recentemente ouviu o ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, sobre um relatório de inteligência produzido pela pasta envolvendo 579 servidores públicos que integram grupos "antifascistas". Desta vez, o governo poderá ser cobrado pela comissão para enviar documentos relativos à atuação dos agentes da Abin no evento climático, realizado em Madri, na Espanha.
— Já convivi com vários governos, nunca vi algo parecido. É uma ameaça às instituições e à democracia — disse o deputado José Guimarães (PT-CE), integrante da Comissão de Inteligência do Congresso.
O parlamentar vai pedir ao presidente do colegiado, senador Nelsinho Trad (PSD-MS), que acione os parlamentares para discutir o assunto.
Conforme mostrou a reportagem, a presença da agência no evento é incomum e evidencia a postura conflituosa do governo Bolsonaro com organismos internacionais ligados ao meio ambiente. O jornal consultou as listas oficiais das edições da COP de 2013 a 2018. Em nenhuma delas aparece o nome de representantes do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) ou da Abin. Além disso, fontes acostumadas a participar do evento disseram ser a primeira vez.
A comissão do Congresso pode solicitar, por exemplo, relatórios produzidos pela Abin no evento e questionar o governo sobre a motivação para o monitoramento.
— Você pode divergir, mas não pode sair bisbilhotando. Com que objetivo fazer esse tipo de ação completamente ilegal do ponto de vista das regras democráticas? — questionou Guimarães.
Nas redes sociais, outros integrantes do Congresso também criticaram a atuação do governo na COP-25. "O governo brasileiro não só comete e estimula crimes contra o meio ambiente, como busca meios de sabotar o ambientalismo internacional", escreveu o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) no Twitter.
Ex-ministro do Meio Ambiente, o geógrafo e professor Carlos Minc classificou o envio dos agentes como "arapongagem no clima" em mensagem na mesma rede social. "Para BolsoNero mudança do clima é conspiração! Queimadas são churrasco e boi é bombeiro!", afirmou Minc, comparando o presidente Bolsonaro a Nero, imperador romano que assistiu ao incêndio de Roma sem fazer nada.
O Estadão tenta desde quarta-feira (7) ouvir a Abin e o GSI sobre o que motivou a presença de quatro agentes secretos no evento, quais as atividades que eles desenvolveram, os relatórios que produziram e qual o cargo deles no governo, mas ainda não obteve resposta. A ONU também não se manifestou.