O Palácio Piratini atribui à intransigência da oposição a lentidão das votações na Assembleia, mas enfrenta deserções crescentes na sua própria base. Para dirimir resistências, o próprio governador José Ivo Sartori tem se empenhado na tentativa de convencer os aliados a votar projetos polêmicos.
Na semana passada, Sartori reuniu-se com deputados estaduais e federais, presidentes de partidos e coordenadores de bancadas no Palácio Piratini. Explicou o teor de parte do acordo com a União, reforçou a gravidade da crise fiscal e mais uma vez exortou a base a aprovar os temas em tramitação na Assembleia. De alguns, ouviu pedidos, como obras, liberação de recursos e nomeações no Executivo.
– Cargos, não tem mais – desabafa um interlocutor do governador.
No dia seguinte à reunião, terça-feira passada, mais uma vez não houve quórum para votar texto que reduz o número de servidores cedidos a sindicatos. Cinco aliados faltaram. Três deles estavam viajando. Os outros dois – Gilberto Capoani (PMDB) e Missionário Volnei (PR) – estavam em plenário mas preferiram não registrar presença, em provocação direta ao governo.
– Estamos em constante articulação política. O governo precisa ter relação consistente com a base, o que vem sendo feito pela Casa Civil – diz o líder do governo, Gabriel Souza (PMDB).
Nos bastidores, aliados reclamam que Sartori mantém na máquina estatal muitos indicados políticos do PDT, partido que saiu do governo e se declarou independente. Assessores graduados já sugeriram a demissão dos apadrinhados, mas, como o núcleo duro do Piratini, conta com os votos de pelo menos três pedetistas – Eduardo Loureiro, Gilmar Sossella e Gerson Burmann –, evita criar ressentimentos.
Há ainda um temor disseminado em votar propostas que prejudiquem o funcionalismo. Entre os assuntos com deliberação atrasada, há vários projetos que afetam os servidores, como o que retira a data-limite para pagamento dos salários e do 13ª e o de alteração da carga-horária dos funcionários da Susepe. Sob pressão inclemente das categorias, até mesmo deputados da base titubeiam, com medo da repercussão nas eleições do ano que vem.
– O governo reclama da oposição, mas somos minoria. Temos em média 15, 16 deputados.
O governador é que não consegue convencer seus próprios aliados e, a cada dia que passa, tem mais dificuldades porque o projeto político é de desmonte do Estado – afirma a líder do PT, Stela Farias.
O que prevê o pré-acordo com a União
1) Freio no custeio da máquina
-Salários dos servidores públicos estaduais receberão apenas reposição inflacionária até 2020, sem ganho real (com exceção dos reajustes da segurança pública, assegurados até 2018).
-Não serão criados cargos ou funções nem haverá alteração de planos de carreira que resultem em aumento de despesa nesse período.
-Contratações serão congeladas, exceto para a reposição de aposentadorias em áreas essenciais, como saúde, segurança e educação.
2) Prorrogação do aumento de ICMS
-Em 2015, foi aprovado na Assembleia o aumento de alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) com vigência até 2018.
-Segundo o governo, se as alíquotas voltarem ao patamar de 2015, a arrecadação cairá R$ 2 bilhões por ano e não será possível reequilibrar as contas.
-Por isso, o plano prevê a prorrogação, que terá de ser aprovada na Assembleia.
3) Maior rigor sobre pensões
-Os critérios de concessão de pensões serão adequados à lei federal nº 13.135, de 2015. Isso se dará via projeto a ser enviado à Assembleia.
-Uma das mudanças é o fim das pensões vitalícias para cônjuges com idade inferior a 44 anos. Outra é a necessidade de comprovação, pelos pensionistas, de pelo menos dois anos de união estável para ter o benefício em caso de morte do titular.
4) Compensações da Lei Kandir
-O plano prevê o ingresso de recursos da União no caixa do RS como compensação por perdas da Lei Kandir, que isenta de impostos todas as exportações.
-No caso do Rio Grande do Sul, estima-se que essas perdas cheguem a R$ 4 bilhões por ano, mas os valores pagos não chegam nem perto disso (em 2016, foram R$ 367 milhões, sendo que nos últimos cinco anos a média de ressarcimento foi de 10% das perdas, quando nos primeiros anos da Lei Kandir era de 50%). Esse ponto não conta com a concordância da União e depende de regulamentação. O Rio tentou inserir o item no plano de recuperação, mas não conseguiu.
5) Adeus aos depósitos judiciais
-Usados pelo Estado como uma espécie de “empréstimo” para cobrir déficits desde 2004, os depósitos judiciais não poderão mais ser utilizados. Esses recursos pertencem a pessoas e empresas em litígio na Justiça. Hoje, o Estado deve cerca de R$ 10,7 bilhões a essa conta.
6) Ativos oferecidos para a obtenção de novo empréstimo
-Privatização ou federalização de seis estatais
-Com plebiscito: Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), Companhia Riograndense de Mineração (CRM) e Sulgás.
-Sem plebiscito: Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR), Badesul e a parte do Estado no Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE).
-Dividendos do Banrisul
-O Rio Grande do Sul ofereceu à União os dividendos que recebe anualmente pelo controle acionário do Banrisul, no valor de cerca de R$ 150 milhões .