No sétimo ano consecutivo de mandato, o deputado Francisco Everardo Oliveira Silva, o Tiririca (PR-SP), está desiludido com a política e propenso a encerrar a carreira parlamentar em 2018. Na quinta-feira (3), um dia após votar pela abertura de investigação contra o presidente Michel Temer (PMDB) por corrupção passiva, ele criticou o Congresso Nacional e diz não ter o "jogo de cintura" exigido para ser político.
– Não vai mudar. O sistema é esse. É toma lá, dá cá – afirmou.
Um dos deputados mais assíduos da Câmara, mas que só usou o microfone três vezes no plenário, Tiririca vê a maioria dos parlamentares trabalhando para atender interesses próprios, em detrimento do povo. Ele avalia que há parlamentares bem intencionados, mas que não conseguem trabalhar porque o "sistema" não deixa.
– A partir do exato momento que você entra, ou entra no esquema ou não faz. É uma mão lava a outra. Tu me faz um favor, que eu te faço um favor. Eu não trabalho dessa forma – desabafou.
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Tiririca conta que, certo dia, uma rapaz o procurou para oferecer um "negócio" de aluguel de carro.
– O cara disse, "bicho, vamos fazer assim, tal, o valor tal". Eu disse: acho que você está conversando com o cara errado. Não uso carro da Câmara, o carro é meu. Ele disse: "não, é porque a maioria faz isso" – relatou o parlamentar, sem dar nomes e mais detalhes sobre o fato. – Fiquei muito decepcionado com muita coisa que vi lá – acrescentou.
Após se eleger duas vezes deputado com mais de um milhão de votos em cada uma das eleições, Tiririca acha que não tem como continuar na política.
– Do fundo do meu coração, estou em dúvida, e mais para não disputar – confessou.
Questionado se a aversão a políticos tradicionais não poderia favorecê-lo, ele respondeu:
– Pode ser que sim ou que não. Mas, para fazer o que? Passar oito anos e aprovar um projeto – disse o deputado, que só conseguiu aprovar uma de suas propostas em sete anos de mandato: a que inclui artes e atividades circenses na Lei Rouanet.
Tiririca confessa que disputou o primeiro mandato, em 2010, apenas para tentar ganhar visibilidade como artista. Mudou de ideia quando foi eleito com 1,3 milhão de votos, o que o tornou o deputado mais votado do país.
– Aí disse: opa, espera aí. Teve voto de protesto, teve. Mas teve voto de pessoas que acreditam em mim. Não posso brincar com isso – afirmou.
À época, o deputado foi eleito ao usar o slogan "Pior do que está não fica" durante sua campanha. Em 2014, decidiu disputar reeleição "para provar que não estava de brincadeira e que fiz a diferença na política". E foi reeleito com 1,016 milhão de votos.
No segundo mandato, Tiririca votou tanto a favor do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e pela abertura de investigação contra Temer, mesmo com a pressão da direção partidária sobre ele.
– Tem um ditado que minha mãe fala sempre: errou, tem que pagar – disse.
Para o deputado, os indícios apresentados contra o presidente "era coisa muito forte".
– Acho que ele tinha que entregar os pontos e pedir para sair. Foi muito feio, muito agressivo para o país essas denúncias – afirmou.
Quando perguntado se o Brasil tem jeito, lembrou uma música "das antigas" de Bezerra da Silva, cujo refrão diz "para tirar meu Brasil dessa baderna, só quando morcego doar sangue e saci cruzar as pernas".
Com toda a desilusão e os planos de deixar a política, Tiririca voltou a fazer shows como palhaço há cinco meses. O espetáculo conta a história de vida dele e é exibido de sexta a domingo, cada fim de semana em um Estado.