
Pivô da corrosão da base de apoio ao prefeito José Fortunati (PDT) na Câmara de Vereadores, o secretário municipal da Saúde, Carlos Casartelli (PTB), esperava ficar 30 minutos na Casa na quarta-feira, o suficiente para assumir a vaga deixada pelo colega de partido Cássio Trogildo (PTB), cassado pela Justiça Eleitoral, e retornar à pasta.
Mas meia hora virou uma tarde inteira de baixaria e bate-boca com os vereadores que pedem sua cabeça ao prefeito.
Apesar das recorrentes reclamações dos vereadores, Casartelli não será demitido por Fortunati. A resistência do prefeito em exonerá-lo tem causado revolta na sua base na Câmara. O principal rival de Casartelli é o presidente do Legislativo, Thiago Duarte (PDT). Na gênese da briga entre os dois está a indicação para o secretariado em 2010, quando Fortunati optou pelo petebista. Depois, o conflito descambou para ataques pessoais.
A controvérsia mais recente envolve o vereador Valter Nagelstein (PMDB). Casartelli e ele discutiram pelo Twitter, e o peemedebista agora ameaça romper com o governo se não receber uma retratação. Ambos alegam terem sido alvo de acusações injustas.
- Queria dizer bem-vindo, mas, enquanto não ouvir uma retratação desta acusação - que é um crime -, não me sinto mais em condições de apoiar as políticas que são encaminhadas por este governo - disse Nagelstein.
Nesta quarta-feira, Casartelli não se retratou. O secretário afirma que o regimento da Câmara foi alterado para obrigá-lo a acompanhar toda a sessão e ouvir as críticas dos vereadores.
- Às vezes, fujo um pouco da casinha e respondo o que quero. Primeiro, porque as pessoas passam do limite. E também tenho o meu. Reconheço que, às vezes, passo dele. Hoje (quarta-feira) mesmo, perdi o controle no fim da sessão, mas o que ele (Dr. Thiago) fez foi inadmissível. Só um psicopata não sairia do sério - afirma Casartelli.
E completou:
- Não tenho nenhuma dúvida (de que o nível caiu na Câmara). Hoje (quarta-feira), tenho vergonha do presidente.
Em resposta, Dr. Thiago afirmou não fazer críticas pessoais contra o secretário, mas sim à sua gestão:
- O secretário é provocativo. Foi lá para tumultuar. Esse tipo de ataque tenta desmoralizar, depreciar e desqualificar a crítica à gestão.
Entrevista - Carlos Casartelli, pediatra e secretário de Saúde de Porto Alegre
"Me obrigaram a ficar apenas para poder falar de mim"
Carlos Casartelli tem 56 anos, se formou em medicina na UFRGS, fez residência em pediatria e é especialista em terapia intensiva pediátrica. Secretário desde 2010, assumiu o mandato de vereador nesta quarta-feira só para evitar a perda da cadeira.
Zero Hora - O senhor sofre contestações de vários vereadores, e as mais fortes são da base. Por que os vereadores o odeiam tanto?
Carlos Casartelli - Não são todos. Tem um vereador que me odeia, que é o Dr. Thiago. Em 2010, quando fui indicado para ser secretário, ele buscou essa indicação. O prefeito optou pelo meu nome. De lá para cá, não conseguiu absorver isso. Ele tem uma questão pessoal contra mim e tem aliados.
ZH - Mas não é só ele. Valter Nagelstein disse que vai deixar a base do governo por sua causa.
Casartelli - Nagelstein saiu me acusando de cometer um ilícito.
ZH - O senhor cometeu?
Casartelli - Sou um servidor público com 24 anos de carreira. Tenho um apartamento e um carro, e nada está no meu nome, porque não tenho filhos. E te digo a razão: simplesmente porque tenho uma relação homoafetiva, as filhas são do meu parceiro, os netos também e não tenho interesse em colocar nada no meu nome.
ZH - O senhor acredita que é vítima de homofobia por parte de algum vereador?
Casartelli - Não, acho que não. Fui ameaçado pelo Twitter e pelo Facebook, porque o Dr. Thiago manipula as pessoas que estão em uma situação difícil, como o pessoal do Instituto de Cardiologia, e estimula essas pessoas a fazer coisas. Infelizmente, fui obrigado a abrir uma ação contra essa pessoa. Ela agiu com homofobia e me ameaçava de morte. Fui à delegacia, e meu advogado está processando.
ZH - Mesmo com toda essa pressão, o prefeito não admite demiti-lo. O que ele fala para o senhor sobre isso?
Casartelli - Ele tem consciência de que o trabalho que fazemos é reconhecido nacionalmente. Só não sou reconhecido em Porto Alegre. Temos várias ações que são exemplo, como a questão do AVC, que reduziu em 20% os óbitos, porque passamos de 15% das equipes de Saúde da Família para 50%. Porto Alegre, depois de muito tempo, passou a ser a quarta capital em índice de desenvolvimento do SUS.
ZH - Alguns vereadores reclamam que o senhor é intransigente e autoritário.
Casartelli - Não é verdade. Com a bancada anterior, nunca tivemos problema. Mas, com esta bancada, temos tido problemas, por vários motivos que não posso falar.
ZH - Mas que tipo de motivos?
Casartelli - Algumas coisas não posso tratar.
ZH - Nesta quinta-feira, o senhor volta para a secretaria?
Casartelli - Volto. Liguei para o prefeito ontem (terça-feira) e disse que estava assumindo a vaga. Ele nem me deixou falar. Disse para ficar 30 minutos e voltar. Mudaram o regimento da Casa e me obrigaram a ficar aqui apenas para poder falar de mim. Isso foi uma armação.