
O ex-deputado federal constituinte e ex-presidente do Cpers Hermes Zaneti, 74 anos, pretende resgatar o tema do endividamento público do país com o lançamento do livro O Complô: como o sistema financeiro e seus agentes políticos sequestraram a economia brasileira, na Feira do Livro de Porto Alegre. A sessão de autógrafo será no dia 19 de novembro, às 17h, na Praça da Autógrafos da Feira.
Leia também
"Sou político com muito orgulho", diz ex-deputado Francisco Appio
"Michel Temer não representa o PMDB", diz Joanira Kayser, liderança do partido em Caxias do Sul
"Não foi por acaso que chegamos à essa descrença na política", afirma Beto Albuquerque
"Chegou o momento do PTB", afirma pré-candidato ao governo do Estado
Zaneti destaca dois projetos que deram projeção a seu trabalho na Câmara dos Deputados: o voto facultativo aos 16 anos e a emenda que permitiu fazer um exame pericial no endividamento externo brasileiro.
O professor e advogado diz que é preciso tirar do comando políticos e partidos que estão no poder para emergir um processo que atenda à democracia. Confira os principais trechos da entrevista concedida na sexta-feira, por telefone.
Pioneiro: Como vê a valorização do professor pela sociedade e pelos governos. O que fazer para valorizá-los?
Hermes Zaneti: É muito discurso e pouca atitude. Lembro que, em uma das nossas greves, acabamos por conseguir um acordo com o governador Jair Soares de dois e meio salários mínimos com o piso salarial. O governo cumpriu alguns meses e depois não teve mais condições. Com alguma frequência o pessoal diz que valoriza a educação como se alguém fosse contra a educação, a saúde. O (ex-presidente) Lula fez o piso nacional para os professores, só que os Estados e municípios não têm nenhuma condição de cumprir. Hoje está pendente uma ação no Supremo Tribunal Federal ganha pelo Cpers que põe o Rio Grande do Sul numa dívida de R$ 12 bilhões com o magistério por conta do não cumprimento do piso. Não apreendemos com as nações que priorizaram a educação e deram saltos imensos de desenvolvimento do seu povo.
Quais seus principais momentos como deputado constituinte?
Eu e outros companheiros tivemos nota 10 como deputado constituinte. O professor Luiz Ferraiolli, um dos luminários do Direito mundial e estudioso das constituições do mundo, classifica a do Brasil como a melhor da terceira geração. Não me arrependo das lutas que fizemos. Teve dois momentos profundamente gratificantes para mim. Sou autor do direito de voto aos 16 anos com o apoio da juventude brasileira. O segundo ponto é fundamental e diz respeito ao artigo 26 do ato das disposições constitucionais transitórias, que manda fazer um exame pericial do endividamento externo brasileiro, que na época era um grande problema e hoje está, junto com a dívida pública interna, chegando a R$ 7 trilhões e põe o Brasil de joelhos diante do sistema financeiro.
Em 2010, o senhor se filiou ao PSB. Atualmente, qual sua relação com a política?
Me filiei ao PSB para ajudar o Eduardo Campos a se eleger presidente, mas infelizmente vocês sabem o que ocorreu (Campos morreu em 13 de agosto de 2015, vítima de um acidente de avião). Minha relação com a política é o lançamento do meu livro, porque é eminentemente político no sentido de dissecar todo o processo que nos conduziu a transformar uma sociedade produtiva que desenhamos na Constituinte em uma sociedade rentista, invertendo o processo, fazendo com que o sistema produtivo do país trabalhe para o sistema financeiro, quando a lógica seria o contrário. E, na política partidária, continuo filiado ao PSB, mas sem militância.
Está descrente com o cenário político atual?
Não estou descrente, mas de alguma forma estamos vivendo o mesmo desafio de quando vencemos o processo de ditadura e transformação em processo democrático. As lideranças que conduzem a política nacional traíram o que desenhamos para a democracia no Brasil e de alguma forma o povo brasileiro está desafiado a fazer a mesma coisa que fez em 1985 que derrubou a ditadura. Hoje, precisamos derrubar quem está no comando do processo político, independentemente de partidos, para emergir um processo que atenda à democracia. É preciso que o povo esteja muito atento e passe uma vassoura varrendo o comando político do país e a oportunidade é no próximo ano. A política é o caminho para resolver isso.
Qual é a sua alternativa para a eleição presidencial do ano que vem?
O meu candidato é o Papa Francisco (risos). Essa é uma maneira de te dizer que, na minha visão, não emergiu ninguém que possa liderar um processo de limpeza nacional.
Leia mais
Vereadores pressionam por atendimento do governo Daniel Guerra a líderes comunitários Ferramentas da Câmara e do Senado permitem participação da sociedade Morador de Caxias do Sul sugere perdão da dívida dos Estados Morre Darcy Pozza, ex-prefeito de Bento Gonçalves
O senhor assinaria o plano de recuperação fiscal do Rio Grande do Sul com o governo federal?
Não. Absolutamente, não. Há um equívoco. As vendas das ações do Banrisul é a solução errada para o problema errado. As lideranças políticas têm de levantar o povo do Rio Grande, sem isso não tem respaldo suficiente para obrigar o governo federal a fazer justiça. De 1994 a 1998, por medidas do governo federal, o Rio Grande do Sul dobrou a dívida por culpa da União. Depois, a União assumiu os R$ 9,7 bilhões como crédito. A partir disso, impôs condições draconianas. Depois, retira o ICMS do Rio Grande do Sul sobre produtos exportados. Até hoje, foram espoliados R$ 50 bilhões. No meu livro, vai constar uma capa de Zero Hora onde o governador (Antônio) Britto e o ministro da Fazendo (Pedro) Malan, os dois sorrindo e dizendo que tinham liquidado a dívida do Rio Grande do Sul. Hoje, o Rio Grande do Sul já pagou R$ 26 bilhões e deve R$ 57 bilhões. Naquela época, foi dada uma série de empresas do Estado e, apesar, disso estamos nessa condição. Agora, o Rio Grande do Sul vai ficar sem as empresas e com a dívida. Essas duas questões estão obrigando o Estado a se pôr de joelhos diante da União e não vai resolver.
Como foi atuar na recuperação da Vinícola Aurora?
Tive uma ajuda grande do advogado de Caxias Zulmar Neves e chegamos à conclusão de que não dava para brigar com os bancos, e a estratégia foi negociar. Quando assumi na Aurora, ela devia R$ 130 milhões e faturava R$ 40 milhões. Felizmente, tive o respaldo dos associados e eles souberam suportar todos os sacrifícios para sair do atoleiro. Pagamos a todos com negociação. Quando saí de lá a Aurora faturava R$ 200 milhões e hoje fatura R$ 450 milhões.
O que o setor vitivinícola deve perseguir para se manter no mercado competitivo?
O setor vitivinícola gaúcho desenvolveu muito, e a gente pode ver pelas premiações. Ainda sofre um pouco de preconceito, mas deve persistir. Deve cuidar com muita dedicação a qualidade dos produtos. Um vinho e um espumante são, basicamente, um conceito. As entidades têm muita consciência disso. A qualidade é que vai garantir a perpetuação do setor.