Uma das três opções do PCdoB para concorrer à Presidência da República, a deputada estadual Manuela D’Ávila, debate com o partido e pessoas próximas os prós e contras de disputar um cargo majoritário. Ela também é cogitada para o governo do Estado.
Manuela diz que a decisão de concorrer a deputada estadual em 2014 e de ficar de fora da disputa à prefeitura de Porto Alegre no pleito de 2016 não a impede de debater uma candidatura ao Planalto ou ao Piratini, apesar de contar que planeja concorrer novamente à Assembleia.
– Não tomei uma decisão para sempre. (...) Não é algo que tenha um caráter eterno.
A entrevista foi concedida quinta-feira, por telefone. Confira os principais trechos.
Pioneiro: Como recebeu a indicação de seu nome para concorrer à Presidência?
Manuela D’Avila: Não é uma indicação, é um debate que o partido tem feito com alguns nomes, o meu, o da deputada Jandira Feghali e o da senadora Vanessa Grazziotin. Qualquer militante se sente muito honrado porque é a primeira vez que o meu partido vai ter candidato a presidente desde a redemocratização do país. Mas fiz uma opção de vida de me dedicar à política do Rio Grande do Sul, de viver em Porto Alegre. Essa discussão que o PCdoB faz comigo, e que estou aberta a fazer, é contrária a isso (opção de vida) e tenho que refletir. Qualquer militante político se sentiria desafiado. Tenho feito uma reflexão com os militantes, amigos e as pessoas próximas a mim.
A decisão de vida será mantida?
Não tomei uma decisão para sempre. Tomei uma decisão de voltar ao Rio Grande do Sul, de não concorrer a prefeita de Porto Alegre, de ter uma mandato de deputada estadual, gosto muito de representar e de pensar o nosso Estado. Não é algo que tenha um caráter eterno.
A senhora defende a candidatura própria do PCdoB para presidente?
Eu defendo. Sempre fomos os maiores defensores da unidade do campo político progressista, de uma frente ampla que pudesse dialogar com o povo brasileiro e com o projeto de desenvolvimento do Brasil que levasse em conta temas importantes, como esse processo de perda industrial que o Brasil vem sofrendo, buscar reduzir as desigualdades sociais. A crise que vivemos desde o golpe que tirou a presidenta Dilma do poder faz com que todos os partidos apresentem as suas alternativas (candidatos). Sempre fomos aliados do Partido dos Trabalhadores porque compreendíamos o que representava essa aliança, agora acho legítimo e oportuno que a gente construa (uma candidatura) e dizer o que o PCdoB propõe.
Qual deve ser estratégia da esquerda para a eleição?
A esquerda deve falar com o povo brasileiro sobre as necessidades de termos um grande pacto nacional. A crise tem dissolvido as instituições, a indústria e a economia brasileira e os direitos do povo que trabalha. Temos que fazer um pacto diferente do proposto pelo (presidente Michel) Temer, que é o de diminuição absoluta de direitos dos trabalhadores.
Concorrer ao governo do Estado seria uma alternativa para permanecer morando no Rio Grande do Sul?
Não fazia parte do meu horizonte essa discussão sobre cargos majoritários agora. O meu plano pessoal era disputar para deputada estadual, mas sempre escuto os desafios que as pessoas me lançam. É um momento de novas lideranças se colocarem, está se esgotando um ciclo geracional no Estado.
O discurso da esquerda precisa se reinventar?
Não sou porta-voz da esquerda. Sou militante de um partido, mas acho que nosso discurso nunca esteve tão atual quanto agora. Que discurso pode ser atual diante da pior crise da história do capitalismo do que uma alternativa diferente de resolver a crise apenas aumentando a desigualdade e tirando uma parte expressiva das pessoas do sistema de inclusão? A crise que vivemos no mundo desde 2008 e que alguns, para golpearem a presidenta Dilma, disseram que era brasileira, é uma crise estrutural e mundial de um sistema. O mundo tem assistido ao crescimento de alternativas da ultradireita conservadora como o (presidente Donald) Trump nos Estados Unidos e o (presidente Emmanuel) Macron na França, que são uma espécie da negação da política e como se fossem o “novo”. Nosso discurso é muito atual, mas, diante da crise, as alternativas que surgem, do outro lado são muito radicalizadas, com o crescimento do meu ex-colega deputado (Jair Bolsonaro) e do prefeito de São Paulo (João Doria), que negam as instituições e a democracia.
E qual o principal desafio do próximo governador?
O próximo governador tem que ter um projeto de desenvolvimento para o Estado. O governador (José Ivo) Sartori não tem um projeto de crescimento, ele tem um projeto de corte. Ele corta mais simbolicamente do que profundamente, não combate a sonegação nem debate o conteúdo das isenções fiscais que poderiam ser dadas para empresas gerarem mais empregos.
O parcelamento de salários é mesmo inevitável?
Desde que estou aqui (na Assembleia), buscamos os dados reais sobre o fluxo de caixa do Estado. Temos tramitando na Assembleia uma CPI sobre o parcelamento dos salários. O governo não trabalha com o caixa da forma correta que poderia pagar os salários em dia, como todos os patrões fazem, já que eles gostam tanto de comparar com a iniciativa privada, mas aumenta a crise porque todos os profissionais do Estado deixam de consumir em seus municípios. Além de ser cruel com os trabalhadores e de prejudicar os serviços fundamentais.
A Lava-Jato faz bem para o país?
A Operação Lava-Jato é parte de um sistema que tem se demonstrado absolutamente parcial. Eu acredito na Justiça baseada em provas, e não intuitiva. Eu acredito nas instituições e nas leis que nosso país produziu, sobretudo a partir da redemocratização. Acho que a Operação Lava-Jato tem falhas. Agora que o combate a corrupção é fundamental para o desenvolvimento do Brasil, não tenho a menor dúvida.
As disputas eleitorais estão alicerçadas em debates raivosos. É estratégia para não debater os problemas estruturais do país?
Não acredito que a violência das redes seja restrita às redes. Já fui vítima da violência das redes se materializando nas ruas. Prejudica muito a política, o Brasil e mundo. Jamais teremos um país desenvolvido e mais justo com pessoas defendendo a absoluta intolerância e práticas terríveis porque são diferentes delas.