
Bento Gonçalves inaugurou nesta semana um abrigo para acolhimento de mulheres que sofreram violência no período entre o registro da ocorrência na delegacia e o deferimento da medida protetiva. O espaço, que tem endereço sigiloso, foi entregue pela prefeitura após o registro de dois feminicídios em um intervalo de 20 dias — o último caso, na sexta-feira passada (18), vitimou Jane Cristina Montiel Gobatto, 54 anos.
O serviço é acionado pela rede de atenção à mulher. O refúgio possui cinco quartos, banheiro, cozinha e sala de estar.

— Viemos trabalhando há três meses na reforma e ambientação do espaço. É o suporte que a prefeitura oferece para a rede de enfrentamento à violência contra a mulher — diz o secretário de Esportes e Desenvolvimento Social (Sedes), Eduardo Veríssimo.
O equipamento funciona em ação conjunta da Sedes com a Coordenadoria da Mulher e o Centro Revivi. O município também disponibiliza a Sala Lilás, que oferece atendimento médico para esse contexto na UPA 24h.
Abrigos na região
Além de Bento, outras duas cidades da Serra têm casas para abrigo: Caxias do Sul e Vacaria. No maior município da região funciona a Casa de Apoio Viva Rachel, exclusiva para mulheres em situação de violência, mas que acolhe também filhos das vítimas com idade até 17 anos e 11 meses.
A capacidade máxima é de 15 vagas. A titular da Coordenadoria da Mulher, Jeane Schulz, informa que atualmente estão em acolhimento sete mulheres e quatro crianças. De janeiro até agora, o abrigo recebeu 42 vítimas.
Psicólogas e assistentes sociais do Centro de Referência da Mulher (CRM) realizam, via telefone ou presencialmente, em média 300 atendimentos mensais de ocorrências registradas na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam). Também são acolhidas no CRM demandas espontâneas e encaminhamentos da Rede de Proteção da Mulher de Caxias, que inclui diversos órgãos.
Caxias do Sul foi selecionada, junto com Porto Alegre, para receber do governo federal uma Casa da Mulher Brasileira (CMB), estrutura que atua no atendimento multidisciplinar e humanizado às mulheres em situação de violência.
Em Vacaria, a coordenadora da Mulher, Tassia Trintino, afirma que foram feitos 11 abrigamentos neste ano, sendo que uma mulher está no local. O atendimento dura no máximo 15 dias.
— O que temos observado é que a maioria das mulheres que são acolhidas na casa chega com os companheiros para a safra da maçã, permanecem no município e aí acabam ocorrendo a violência doméstica. Acolhemos elas, tentamos reinseri-las no mercado de trabalho e, caso seja melhor, a encaminhamos para a cidade de origem — relata Tassia.

Medidas protetivas de urgência pela internet
A Polícia Civil lançou quinta-feira (24) uma ferramenta que permitirá a vítimas de violência pedir medidas protetivas de urgência pela internet. O lançamento do recurso, com potencial de facilitar o acesso ao principal mecanismo legal para interromper o ciclo de agressões, foi agilizado após o registro de seis feminicídios somente na última sexta-feira (18) no Estado.
Nenhuma das mulheres mortas naquele dia no RS possuía medida protetiva.
— Tudo indica que as mulheres têm tanto medo que não conseguem nem ir à delegacia denunciar. Com esse sistema que permite que o companheiro violento não tome conhecimento, esperamos atender um número maior de mulheres e, consequentemente, diminuir os feminicídios — disse o chefe de Polícia, delegado Fernando Sodré.
Com a novidade, a informação da violência chegará às autoridades policiais em um curto período. A solicitação terá prioridade, para que chegue ao Poder Judiciário o quanto antes. Portanto, o tempo até a obtenção da medida deve diminuir.
O processo tradicional leva até quatro dias. Com o registro online, embora o prazo permaneça o mesmo, a solicitação deve ser encaminhada mais rapidamente ao Poder Judiciário, sustenta o delegado Christian Nedel, diretor do Departamento de Proteção a Grupos Vulneráveis.
A polícia está em tratativas com os magistrados em relação à necessidade de prontas providências judiciais.
Acesse a Delegacia Online da Mulher RS neste link.
Como funciona
A solicitação online seguirá exatamente o mesmo formato que já existe presencialmente. No site, uma cartilha indica o passo a passo para o registro de ocorrência, que deve ser realizado para solicitar a medida protetiva de urgência. Além do preenchimento de um formulário de avaliação de risco já existente, foi incluído um formulário de solicitação de medida protetiva.
Passo a passo
- A vítima deve acessar o site da Delegacia de Polícia Online da Mulher, registrar a ocorrência pela internet e preencher um formulário de avaliação de risco;
- A mulher pode solicitar medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha – como afastamento do agressor da residência, proibição de aproximação, restrição de porte de arma, entre outras;
- Um filtro de urgência será aplicado ao caso, que será direcionado aos plantões policiais do Estado;
- A ocorrência e o pedido de medidas protetivas são encaminhados em até 48 horas ao Poder Judiciário, que deve decidir em até outras 48 horas;
- A vítima receberá confirmação do protocolo, explicação do fluxo e orientação para procurar um local seguro enquanto aguarda a decisão;
- No caso de concessão da medida, um oficial de Justiça intima o agressor;
- A Polícia Civil e a Brigada Militar são informadas e passam a fazer monitoramento a distância, aguardando informações do Poder Judiciário ou da própria vítima e familiares em relação ao descumprimento da medida. Também há o monitoramento eletrônico com tornozeleiras – hoje há cerca de 300 agressores monitorados no RS;
- Se o agressor desobedecer a medida (por exemplo, se aproximar da vítima), pode vir a ser preso em flagrante.

Quatro feminicídios na Serra em 2025
Entre as seis vítimas de feminicídio da Sexta-Feira Santa está Jane Cristina Montiel Gobatto, 54 anos — único caso da Serra naquele dia. Ela foi morta com golpes de faca na região do pescoço no bairro Santa Rita, em Bento Gonçalves.
O suspeito é o companheiro, de 64 anos, capturado em flagrante minutos após o crime e que segue preso.
Foi o segundo feminicídio registrado em Bento neste ano. Vinte dias antes, Erica Garcês de Oliveira, 31, foi morta a tiros no bairro Juventude. A Polícia Civil indica que a mulher foi baleada dentro de casa pelo companheiro, de 30 anos, e morreu em atendimento, na manhã do sábado (29). O suspeito está preso.
Até agora, em 2025, não houve mês sem registro de assassinatos dessa natureza na região. Em fevereiro, no dia 7, o corpo de Ritielly de Almeida Prado, 20, foi encontrado com um fio enrolado no pescoço, em casa, no bairro São João, em Vacaria.
Nesse caso, o companheiro, que é o principal suspeito, não foi preso. Ele rompeu a tornozeleira eletrônica no dia 5 e, de acordo com o delegado regional Carlos Alberto Defaveri, não foi localizado até o momento.
O primeiro feminicídio do ano foi em Caxias do Sul, no bairro Charqueadas. A investigação aponta que na noite do dia 5 de janeiro, Kelly Rodrigues da Rosa, 29, foi atingida por tiros.
Quem teria efetuado os disparos seria o companheiro dela, um homem de 41 anos, que tirou a própria vida após o assassinato. Os dois corpos foram encontrados por um familiar na manhã seguinte.
Em 2024, foram 72 feminicídios consumados em todo o Estado: três deles ocorreram em Caxias, conforme os Indicadores da Violência Contra a Mulher da Secretaria Estadual de Segurança Pública.
Como pedir ajuda
Brigada Militar | 190
- Se a violência estiver acontecendo, a vítima ou qualquer outra pessoa deve ligar imediatamente para o 190. O atendimento é 24 horas em todo o Estado.
Polícia Civil
- Se a violência já aconteceu, a vítima deverá ir, preferencialmente, à Delegacia da Mulher, onde houver, ou a qualquer Delegacia de Polícia para fazer o boletim de ocorrência e solicitar as medidas protetivas.
- As ocorrências também podem ser registradas em outras delegacias. Há DPs especializadas no Estado. Confira a lista.
Delegacia Online
- É possível registrar o fato pela Delegacia Online, sem ter que ir até a delegacia, o que também facilita a solicitação de medidas protetivas de urgência.
Central de Atendimento à Mulher 24 Horas | Disque 180
- Recebe denúncias ou relatos de violência contra a mulher, reclamações sobre os serviços de rede, orienta sobre direitos e acerca dos locais onde a vítima pode receber atendimento. A denúncia será investigada e a vítima receberá atendimento necessário, inclusive medidas protetivas, se for o caso. A denúncia pode ser anônima. A central funciona diariamente, 24 horas, e pode ser acionada de qualquer lugar do Brasil.
Ministério Público
- O Ministério Público do Rio Grande do Sul atende em qualquer uma de suas Promotorias de Justiça pelo Interior, com telefones que podem ser encontrados no site da instituição.
- Neste espaço, é possível acessar o atendimento virtual, fazer denúncias e outros tantos procedimentos de atendimento à vítima. Acesse o site.
Centro de Referência da Mulher em Caxias
- Contato: (54) 3218-6112 e, pelo WhatsApp, (54) 98403-4144.