Os seis meses do aplicativo Uber em Caxias do Sul, completados nesta sexta, trazem um balanço não muito animador para quem viu no serviço uma chance de ganhar dinheiro extra ou mesmo garantir a renda da família. Ao mesmo tempo em que a concorrência entre os motoristas do aplicativo acirrou a ponto de as corridas renderem alguns trocados, o projeto de regulamentação que será encaminhado pelo Executivo ao Legislativo prevê que os condutores desembolsem dinheiro para trabalhar na cidade.
No início, a mera chegada do serviço, em outubro de 2016, causou polêmica devido a situações registradas em outros municípios, especialmente envolvendo um consolidado desafeto com taxistas.O conflito se replicou na cidade. Em menos de um mês começaram a surgir denúncias de ameaças e agressões por parte dos operadores do aplicativo contra taxistas.
Em contrapartida, taxistas reiteraram repúdio e insatisfação pela atuação da concorrência, a qual acusam de trabalhar sob condições privilegiadas.
– É desleal. Enquanto nós (taxistas) pagamos impostos, mais de R$ 1,4 mil na vistoria obrigatória, entre outros gastos, eles (Uber) não têm encargo nenhum. Nesses últimos meses, a demanda pelo nosso serviço caiu em torno de 80% –comenta o presidente da Associação dos Motoristas Auxiliares de Táxi (Amot), Wagner Vieira Pinto.
A demora do encaminhamento para regulamentação acirrou ainda mais os ânimos. E o desagrado não se limita a taxistas. Para motoristas do Uber, a falta de controle do ingresso de operadores é um problema que dificulta o trabalho de toda a classe.
– A cada dia, de 10 a 15 pessoas se cadastram em Caxias. Se somar aos que aderiram ao aplicativo desde o início devemos alcançar mais de 2 mil. É muita oferta para pouca demanda, e falta critério de qualidade, qualquer um que tenha um carro a partir de 2008, com quatro portas, já está apto a trabalhar – reclama Dorian Freitas, motorista do Uber.
Sobre a possibilidade de haver cobrança por parte do poder público, ele desabafa:
– Aí é que eu largo de vez. A margem de lucro já é quase nada e ainda vou ter que dar para a prefeitura? – questiona Dorian.
Os dados sobre o volume da frota são resguardados pela Uber, porém, estima-se que há pelo menos o triplo do total de táxis, que hoje contabilizam 316 placas, em Caxias.
– Todos somos a favor de haver regras, do jeito que está é inviável. Apenas usuários são beneficiados. As tarifas simples são extremamente baixas e desproporcionais aos custos em comparação a outras cidades com estradas e preços de combustível melhores – admite Eduardo Grudiek, o Carioca, um dos primeiros a trabalhar pelo aplicativo na cidade.
Carioca alega também que há carência de suporte oferecido pela empresa, o que acredita ser mais um motivo para a necessidade de regulamentação. Acrescenta que outras potenciais concorrentes já estão sondando o mercado local, o que possivelmente deve causar a saída massiva do Uber.
– Se continuar como está, tudo indica que muitos devem migrar para outros aplicativos. Outras empresas já entraram em contato conosco e se mostraram bastante receptivas com as sugestões que foram dadas.
– Sobre a relação entre taxistas e motoristas do Uber, os conflitos teria diminuído e que exceções só ocorrem quando há má-intenção pontual de alguma das partes, segundo pessoas ouvidas pela reportagem.
– Quem está interessado em trabalhar não se envolve em confusão, acho até que estamos encontrando uma harmonia, muito em virtude das ações de abordagens que foram realizadas na Estação Férrea – comenta Dorian._
– A boa relação sempre existiu, mas a qualquer momento pode ressurgir alguma maçã podre para gerar desordem – reconhece o presidente da Amot.
Racha interno
Operadores do Uber estariam incomodados com a postura de colegas do aplicativo. Pelo menos dois grupos trocam acusações. De acordo com Dorian Freitas, denominados "treinadores" estariam se apropriando de valores de motoristas iniciantes.
– São realizados jantares com a suposta intenção de integração, nas quais um organizador em específico superfatura em cima dos demais. São cobradas taxas para custear os eventos, mas que arrecadam mais que o dobro dos reais gastos. Infelizmente, muitos caem no golpe, eu mesmo já fui vítima quando comecei – acusa.
Carioca também reconhece a desavença. Porém, segundo ele, os motivos são outros.
– Alguns motoristas discordam da minha política de trabalho. Eu proíbo colegas do meu grupo a coagir passageiros a chamar o serviço "por fora". Alguns são coniventes com esse sistema, justificando o baixo lucro com os valores pagos pela Uber. Além de ser um comportamento considerado inaceitável pela empresa, é irresponsável, não há qualquer garantia de segurança porque dispensa os aparatos garantidos pelo serviço regular – afirma.
Novos concorrentes
Caso se confirme a aprovação de operação de aplicativos de transporte individual de passageiros no Congresso e haja a regulamentação municipal, novas empresas devem surgir no mercado. Pelo menos outras três estariam avaliando a possibilidade de atuar em Caxias: Garupa, Cabify e Yet Go.
A mais garantida seria o Garupa. O aplicativo, que opera somente no Rio Grande do Sul, não deve aguardar a implementação da legislação municipal e pretende iniciar funcionamento já no próximo mês.
– Não é irregular porque o próprio formato do aplicativo parte do conceito de carona. Não é ilegal dar carona, o que a ferramenta faz é ser intermediária neste processo _ justifica o criador do Garupa, João Marcondes Vargas Trindade.
Segundo ele, há mais de 300 motoristas cadastrados em Caxias, sendo que cerca de 220 estariam prontos para atuar. Entre os diferenciais, o Garupa não aceitará pagamento em dinheiro (somente por cartão de crédito) e não terá a chamada tarifa dinâmica. Por meio do sistema do Uber, em períodos com maior demanda, o valor da viagem pode ser multiplicado, podendo alcançar cinco vezes a mais do que é cobrado em situações normais.
– Prometemos um suporte mais próximo dos operadores do nosso aplicativo, são eles que merecem nossa atenção – explica, ressaltando que a contrapartida para a empresa será de 20%, 5% a menos da cobrada pela Uber.