Conheci um peão de verdade em meados da década de 1970, quando eu rondava os dez anos de idade, na fazenda que meu pai e meus dois avós compraram em sociedade no interior de São Borja. Como todos os três proprietários moravam na cidade, contrataram como capataz um genuíno habitante daquelas campinas missioneiras, nascido ali mesmo e desmamado cedo em meio a mato, vaca, chimarrão, mangueira, tabatinga, bugio, churrasco, mandioca, carroça, pinga, torresmo, boi-tatá e jogo do osso. Chamava-se Donato, o semblante sempre entrevisto sob a sombra do chapéu nunca arriado do topo da cabeça, a pele esfumaçada pelo excesso de sol, lenço no pescoço, a bombacha cinzenta presa pela guaiaca na qual reluzia o facão de mil e uma utilidades (do descascar da laranja ao recado aos desafetos).
Opinião
Marcos Kirst: como engolir uma dor
Se não pudermos chorar nossas dores, o que haverá de nos consolar?
Marcos Kirst
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