Tudo é questão de ponto de vista. Para o padeiro, a vida é sovar o pão de cada dia. Assim como meter a bola nas redes é a sina do jogador de futebol. Para o escritor, viver é imortalizar personagens no imaginário coletivo. Mas e o que sobra para o jornalista?
— As pessoas acham que o jornal é muito efêmero. É publicada uma notícia hoje e no dia seguinte não vale mais nada. Mas não é bem assim. O jornal conta a história de uma sociedade, de uma cidade, como Caxias. Os livros de história não fazem isso, porque preocupam-se com uma visão mais panorâmica — defende Márcio Miranda Alves, jornalista, doutor em literatura e professor da UCS.
Alves lança nesta sexta-feira, dia 19 de julho, às 19h, no Zarabatana Café, em Caxias, o livro Erico Verissimo e o jornalismo - fontes para a criação literária, escrito a partir da tese de doutorado, defendida na USP, em 2013, e que apresenta um recorte bastante original da obra do autor nascido em Cruz Alta, em 1905, e morto em Porto Alegre, em 1975.
A ideia de O tempo e o vento, maior obra de Erico e principal abordagem de Alves, é gestada em 1930, mas começou a ser escrita em 1947, tendo a primeira parte lançada em 1949, com o título de O Continente. Mas esse novo olhar sobre a vida gaúcha tinha um propósito, defende Alves.
— O que O Erico fez em O tempo e o vento, foi desmistificar a história e trazer novos pontos de vista sobre a formação do Rio Grande do Sul. Uma história menos idealizada e mais próxima da realidade.
Desmistificar a história do gaúcho, também serviu para que Erico se distanciasse da chamada literatura regionalista. Erico fugia dessa sina, porque entendia que sua obra não poderia ser reduzida desse modo. Ao mesmo tempo, conforme pontua Alves, Erico dá voz à diferentes pontos de vista por meio dos personagens distribuídos pelo romance, em eventos importantes da história política como a Era Vargas.
— Principalmente na última parte, O Arquipélago, existem páginas de discussão dos personagens em relação ao regime de Vargas. Erico trata da opressão do Estado Novo, o cerceamento que houve naquele momento.
Erico exercita seu olhar sobre a política, seja sob a égide de Getúlio Vargas, ou ainda, do senador Pinheiro Machado, assassinado em 1915, e que havia coordenado um projeto político republicano ao lado de Júlio de Castilhos e Borges de Medeiros.
— A narrativa dessa morte de Pinheiro Machado é uma das mais emocionantes. Erico mostra como os personagens vão reagindo de maneiras diferentes. Enquanto Rodrigo Cambará chora, Roque Bandeira, é mais crítico e sádico.
O estudo de Alves acaba por responder à provocação inicial. O professor não apenas traz de volta à cena a obra de Erico, mas reverencia o jornalismo como um "registro histórico diário" e nesse sentido, entende, vai muito além do que fazem os livros de história.
— Acho que o grande mérito do Erico foi ter construído essa galeria de personagens, e apresentar a imprensa como mediadora desse fundo histórico.
E assim, depura-se, que exercer o jornalismo é tecer um olhar perspicaz, tenaz, detalhista e diário, sobre os acontecimentos de uma cidade. E nas mãos de um romancista, tudo isso, que aparentemente é efêmero, torna-se imortal.
PROGRAME-SE
O quê: Lançamento do livro "Erico Verissimo e o jornalismo: fontes para a criação literária", de Marcio Miranda Alves
Quando: sexta-feira, dia 19, às 19h
Onde: Zarabatana Café Bar (Centro de Cultura Ordovás - rua Luiz Antunes, 312)
Quanto: O livro custa R$ 40
Leia também
Espetáculo que homenageia Freddie Mercury terá temporada de seis noites em Caxias
Natalia Borges Polesso lança o primeiro romance da carreira, nesta sexta, em Caxias
Confira como era ser jovem em Caxias no período retratado pela série "Stranger Things"
O "pai" de todos gringos: como Radicci ajudou a valorizar as raízes identitárias italianas