Eu sei que é roubada comprar rosas no pico do verão, mas, quando percebo, já é tarde. Hábitos falam mais forte quando cultivados com zelo e isso vale para tudo: amizades, relacionamentos, restaurantes, bons e maus comportamentos, formas de pensar, maneira de escovar os dentes, leituras, churrasco de domingo, aquisição periódica de rosas e mais tudo aquilo que a amiga leitora e o estimado leitor quiserem acrescentar por conta de suas vivências. Quando vi, estava com o buquê deitado no banco do caroneiro, mais uma vez, como faço às sextas-feiras.
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Flores trazem vida, cor e clorofila à casa, especialmente quando não se tem habitando nela nenhum gato, cachorro ou peixe de aquário. Às sextas-feiras, em uma esquina do bairro próxima daqui de casa, paro o carro ao lado da van do florista ambulante cujas portas escancaradas ofertam aos transeuntes diversos buquês de rosas com cores variadas. Tem de tudo que a imaginação e a palheta de cores possa criar: rosas vermelhas, rosas brancas, rosas cor-de-rosa, rosas lilás, rosas azuis, rosas verdes, rosas bicolores, rosas bege, rosas salmão, rosas amarelas. Gosto de variar e me divirto com as cores mais esdrúxulas, ciente de que são tingidas artificialmente, mas tudo bem, o que vale é o efeito.
Às vezes, adquiro dois buquês para mesclar as cores nos diversos vasos que depois a esposa espalha pelas peças da casa. Até os banheiros são brindados com a presença floral, porque, afinal de contas, aqui em casa, banheiro também é gente, se me permitem a metáfora pobrinha. E faço isso de caso pensado. Sei que a expectativa de vida das florezinhas não ultrapassa uma semana, período em que esperamos delas apenas que os botões se abram e preencham os ambientes com o perfume, as cores e a alegria de serem rosas. Depois, cumprem o seu destino: murcham, morrem, vão fora e
dão espaço para os buquês da semana que vem. Assim é a vida das rosas, sobre as quais já aprendemos singelamente com o poeta que são rosas, são rosas, são rosas...
Mas no duro do verão a coisa é diferente. As rosas compradas sexta-feira passada não duraram sequer três dias e já estão flácidas nos vasos, murchas, tristes e acabadas. A rosinha amarela infiltrada no meio do buquê carmesim ainda que tenta manter a imponência, rainha em meio ao mar de murchismo protagonizado pelas demais. Efeito do calor, claro. Mas não desisto. É uma questão de honra não abandonar esse hábito. Afinal, se uma rosa é uma rosa, a poesia também será sempre poesia, apesar do calor abrasante. Contem comigo na sexta que vem!