Ando impressionada (sim, sou ingênua) em como as pessoas têm usado argumentos de ódio para defender, amorosamente, seus pontos de vista. Até aí, existe pouca novidade.
O interessante é que elas se tornam ridiculamente paradoxais e não percebem que viraram exatamente aquilo que estão combatendo. Seja no textão da mina que, cheia de propriedade, desmascarou um pseudo popstar que pagava de desconstruído – que viralizou, culminou no fim das atividades da banda e com a escritora como porta-voz de relacionamentos abusivos –, seja no sentimento de falta que alguém provoca ao deixar a cadeira vazia. O comportamento é idêntico: não basta compartilhar a solidariedade, parece que odiar "o outro lado" faz parte do pacote.
Leio meninas que viveram um relacionamento abusivo sentirem-se representadas por alguém que fale disso com lucidez e distanciamento, mas vejo as mesmas meninas que se posicionam em favor da causa desejarem a morte do rapaz – ou que ele se ferre de verdade. Como se já não fosse um peso suficiente para o cara ter que suportar ser uma pessoa desprezível, que não sabe se relacionar com as outras, sequer respeitá-las. Ou, ao invés de apenas agradecer ao profissional que prestou um serviço incrível à classe e lamentar sua saída (o que é muito, em tempos que ninguém se importa de verdade com nada), parece ser necessário dizer que nada mais presta no ambiente antigo. Como se para reafirmar que alguém é muito bom seja imprescindível enfatizar que ele só é bom porque há algo muito ruim ao seu lado.
Eis o tribunal desconexo das redes sociais. Para mim, é como se defensores dos direitos humanos propagassem a máxima de que "bandido bom é bandido morto", ou que feministas com lutas importantíssimas bradassem discursos de ódio a la Bolsonaro. Não combina, simples assim.
O pensador francês Edgar Morin já versou sobre a complexidade da responsabilidade sobre o que proferimos – e aí até prefiro ignorar Umberto Eco e a afirmação de que as redes sociais deram vozes aos imbecis. O francês diz que "cada um deve reconhecer-se responsável pelas suas palavras, por seus escritos, por seus atos. De outro, tomando como base a ecologia da ação, ninguém é responsável pelo modo como suas palavras são entendidas, como seus escritos são compreendidos, como seus atos são mal interpretados, distorcidos".
O problema reside em quando nem as próprias pessoas se reconhecem naquilo que escrevem. Parece que o fazem só porque existe um espaço disponível para fazê-lo. Para o bem ou para o mal, sem diferenciá-los.