Não sei onde li que, num único dia, consumimos mais informação do que um homem medieval consumiria em toda a vida. Na verdade, já nem lembro se a proporção era de um dia ou de uma hora dos tempos de agora em relação a toda existência de uma pessoa do passado. Eu poderia conferir a exata comparação, fruto de algum estudo, mas para isso teria que pesquisar na internet e ser bombardeado por mais e mais páginas de dados. E o problema sobre o qual quero refletir aqui é exatamente o excesso de informação que nos rodeia — ou melhor, nos atormenta. De algum modo, estamos todos meio adoentados pelo efeito do turbilhão de imagens e mensagens que nos atinge incessantemente. Não tem cabeça que aguente.
Ansiedade, insônia, dispersão e esquecimento, por exemplo, são males que já me alcançam. O pensador italiano Umberto Eco, morto em 2016, alertava que o excesso de informação provoca amnésia. E nem seria preciso evocar um intelectual como Eco para referendar o que todo mundo já sabe: que carecemos de limites na lida com esse universo comunicacional tão necessário quanto perigoso. Se precisamos estar abertos ao voraz fluxo de informações que move as modernas relações e transações, também convém considerar o efeito disso em nosso sensível equilíbrio mental.
Por sinal, a deficiência cognitiva tem sido um sintoma preocupante de um mundo que a tudo relativiza. Estudiosos das mais diferentes áreas reconhecem a associação entre os comuns tormentos mentais e a dissolução dos limites do que antes definia o real. O virtual se instalou, a velocidade das informações criou inéditos anseios, gerando insegurança e desesperança. Nesse contexto de tensão emocional, a mentira virou ferramenta de manipulação econômica e política. Como não emergir daí hordas alucinadas em busca de salvadores e de alguma reacionária ordem autoritária que faça frente ao caos?
Tudo isso já é tão óbvio quanto a constatação de que ainda não temos solução para esse problema global. Nunca estivemos tão doentes, nem tão medicados, como prova a proliferação de farmácias. Na mesma era em que mais circula o conhecimento, a estupidez também se agiganta. O quadro é de calamidade na saúde psíquica. E sem soluções coletivas à vista, só resta a quem ainda tenta manter a lucidez uma reação individual. E esta envolve filtrar o caudal perverso de dados que nos envolve.
Mas como, se passamos horas de nosso dia com os olhos grudados em telas e telinhas? Como refrear a curiosidade sobre inutilidades e futilidades criadas para render cliques? O quanto estamos já viciados em conferir o celular a todo instante? Chega a ser deprimente ver, em todo canto, grupos alheios ao entorno e hipnotizados por seus pequenos aparelhos. Ninguém está mais aqui, no agora. Corpo e mente se desconectaram sem aviso prévio. Nessa dissociação, perdemos a consciência do ser total. Perdemos a noção de humano e de humanidade — basta reparar no ódio que viceja nas redes e mentes.
Quando me percebo imerso nesse estado de coisas, tenho ganas de imitar o antigo visionário americano Henry David Thoreau e fugir para alguma floresta, onde pudesse viver em estreito laço com a natureza. É uma fantasia radical, eu sei. Mas ela aponta o bom caminho de resgatar o agora, seja na natureza, no corpo, na calma de viver uma coisa por vez, na paz que pode nos curar desde dentro. Quem diria que ler um livro, regar uma planta, caminhar num parque (sem celular) e encontrar amigos para conversar seriam ações de resistência e salvação?