Minha amiga Marília, mulher de rara sensibilidade e delicadeza, me diz do seu encantamento com a leitura da obra de Karl Knausgard, considerado o Proust escandinavo. Através de milhares de páginas ele descreve as miudezas do dia a dia. Sua relação não é com o excepcional: ele se interessa pelo que vai se construindo entre as dobras do cotidiano - ações e acontecimentos prosaicos, geralmente ignorados por nós. Essa habilidade de refletir sobre o supostamente banal é, inequivocamente, um ato com viés filosófico. Afinal, ali cabe a vida inteira. O deslumbre discreto do infinitamente pequeno, revelado pela possibilidade de se apaixonar por tudo o que faz parte da realidade mais imediata, sem esperar ser rasgada pelo excepcional. Mas na esfera do pensamento costumamos, com certo descaso, chamar isso de rotina. É nela, no entanto, que acomodamos todas as expectativas, dores e alegrias. Sonhar com o distante, nutrindo um imaginário de realizações inalcançáveis, é um projeto destinado ao fracasso.
Sensibilidade
Opinião
Infinitamente pequeno
Amplio minha gratidão por reverberar em mim a capacidade de simplesmente sentir
Gilmar Marcílio
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