Dentre as eventuais qualidades que possuo está a renovada tendência de ser atencioso e educado com as pessoas. Tenho verdadeiro horror a altercações, brigas e desentendimentos. Prefiro me calar e dar razão à pessoa com quem estou conversando, mesmo tendo a convicção dela estar agindo ou falando algo do qual discordo. É um traço de personalidade e também o resultado de treinamento feito ao longo da vida. Não tenho a pretensão de desejar um mundo regido por opiniões parecidas com as minhas. Seguidamente precisei fazer enorme esforço mental para me manter em silêncio, mas sempre valeu a pena. Mantive a amizade e o coleguismo em alta, e isso conta muito mais. Evito o máximo entrar na seara da política: é um campo minado, onde prevalece a paixão e o discernimento raramente dá as caras. E mesmo em assuntos bem prosaicos, é de bom tom ouvir cuidadosamente, posicionar-se, se for o caso, e manter a elegância na maneira de agir. Tenho certa inclinação a gostar dos seres humanos, vendo antes suas qualidades do que os defeitos. E ficaria feliz se os demais me acolhessem assim. Exercitar a tolerância é um ato religioso, pois desperta a compaixão e a empatia, essenciais para a convivência pacífica e harmônica.
Pondero sobre isso ao lembrar um fato acontecido há alguns meses. Dois amigos próximos iniciaram uma acalorada discussão a partir de um tema polêmico. Cada um com seus argumentos, persistindo em convencer o outro. Passaram-se quinze minutos e cada qual permanecia irredutível em sua fala. Um deles, num rompante de arrogância, disse: “Você é muito ignorante mesmo”. Pronto, o estrago já tinha sido feito. O que se sentiu humilhado começou a chorar, tremer, tomado por um sentimento de desrespeito. Depois de consolá-lo, dizendo não ser correto dar tanto espaço dentro dele a uma criatura tão impulsiva, reafirmei a certeza: o trato afável e amoroso é a maneira ideal de conduzirmos as relações. Claro, há momentos em que é difícil a contenção, principalmente em questões de maior envergadura. Porém, quase tudo não passa de simples opinião. Precisamos nos entregar a esse esforço de ouvir sem tentar impor as nossas crenças. Continuar sensível às justificativas dos pensamentos alheios. É pretencioso nos crermos donos de qualquer tipo de verdade. Melhor é se abastecer de simpatia e, quando for o caso, mudar de assunto. Pouco se ganha em reivindicar o monopólio do que nos parece inquestionável. Devemos nos submeter ao crivo da dúvida para podermos relativizar, fugindo das conclusões apressadas.
O obscurantismo habita as mentes fechadas, confiantes de estarem doutrinando para o bem os que ainda não foram ungidos pela lucidez. Pobres de nós, tão orgulhosos, encastelados num altar, sem saber que a gentileza é um manto de púrpura, bordado em ouro.