É fato inconteste que vivemos uma era de narcisismo absoluto. Mas isso não é totalmente negativo. Se, por um lado, desaprendemos de conjugar qualquer pronome além da primeira pessoa do singular, isto também pode significar uma reapropriação da vontade, do gosto. A história da humanidade está marcada muito mais por épocas em que uma moralidade estreita dominou os costumes do que pela expansão do desejo individual. Talvez o que vemos hoje seja simplesmente o resultado da impossibilidade que a maioria tinha de compartilhar, antes do surgimento das redes sociais. O paradoxo, e é importante ressaltar isso, é que quanto mais nos exibimos, tornando manifesto o que, por sua natureza, é reservado, mais nos sentimos solitários. O motivo disso? Possivelmente um deles seja a nossa incapacidade de estabelecer um diálogo com o outro. Existe uma fratura entre o que queremos comunicar e a forma como isso chega ao destinatário. Funciona mais ou menos assim: eu preciso espalhar para o mundo o que faço, o quanto estou feliz, em que posição privilegiada me encontro. Porém, isso é direcionado para todos e para ninguém.
Opinião
Gilmar Marcílio: desejo
Gilmar Marcílio
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