Gosto da vida assim, sem uma ordem aparente; vida imprevista, que acaricia e açoita, que não se deixa domar jamais. Já fui tão metódico que planejava meu dia com inútil antecedência, sofrendo quando meus planos não davam certo. Mas não existem vésperas para armazenar os nossos desejos. Tombos e delicadas piruetas nos esperam logo ali, à revelia de nossa vontade. Não sei o que me espera e aposto tudo no imprevisível, na surpresa. Continuo gostando da rotina, mas em doses miúdas. Interesso-me em descabelar o que vejo à minha frente, tirando das prateleiras o que foi separado por cor, tamanho, textura. Que meu coração não seja tão compassado, acalmando-se ou acelerando na medida em que o nutro de novas emoções. Quero versos soltos, amigos que me abracem, partam e voltem. A inconstância é a própria condição humana, nutrindo-se das perdas para formar um novo húmus. Que importa saber se já vivi mais da metade da minha existência? Meus últimos dez, ou vinte, ou trinta anos poderão ser mais densos e poéticos que os demais.
Opinião
Gilmar Marcílio: descabelada
A liberdade consiste em apenas aceitar, fugindo da tentação fácil dos julgamentos
Gilmar Marcílio
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